O governo Lula deu uma péssima mensagem misturando um pacote de corte de gastos com uma iniciativa que reduz receita – a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil. Mas para além dessa confusão, o conjunto de medidas destinado a equilibrar o orçamento e dar sustentação ao arcabouço fiscal foi considerado "insuficiente".
Então, o que economistas focados em contas públicas e o mercado esperavam, exatamente? Há pelo menos três níveis de críticas ao pacote, que podem ser consideradas agora que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sinaliza revisão permanente de gastos, depois que o Congresso desidratou o conjunto.
Parte avalia que seria bom se de fato entregasse uma economia de R$ 71 bilhões em dois anos, o problema é que as contas não fecham. Parte sente falta de medidas mais estruturais e outra parte esperava iniciativas pouco viáveis no atual governo, como privatizações.
Nos últimos dias, em várias conversas com especialistas em contas públicas, economistas ligados a entidades empresariais e mais ligados ao mercado, a coluna tem feito essa pergunta: afinal, o que faltou? Veja alguma das respostas, que poderão ser contempladas em novas etapas de revisão de gastos. Ou não.
1. As duas partes da matemática: em primeiro lugar, especialistas em contas públicas com formação fora do mercado financeiro, como Tiago Sbardelotto e Felipe Salto, avaliam que as estimativas da equipe econômica para prever economia de R$ 70 bilhões em dois anos estão otimistas. Ambos (que não se conhecem) convergem para valor perto de R$ 45 bilhões até 2026. Em segundo, a Instituição Fiscal Independente (IFI), que não tem relação com o mercado, melhorou sua projeção para o rombo neste ano para "apenas" 0,4% do PIB. Ainda ficaria acima da margem de tolerância da meta, que é de 0,25% do PIB. E passou a projetar necessidade de superávit de 2,4% do PIB – hoje, seria "sobra" no orçamento anual de cerca de R$ 250 bilhões para estabilizar a dívida nos próximos anos.
2. Medidas estruturais: as duas mais citadas chegaram a compor o pacote de Haddad, mas foram descartadas na série de reuniões ministeriais feitas antes da apresentação. A desvinculação dos benefícios da previdência do aumento real do salário mínimo manteria a promessas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e deixaria de pressionar as despesas previdenciárias a ponto de despertar debate sobre necessidade de nova reforma. Aposentadoria e outros benefícios manteriam a correção pela inflação, mas não o aumento real concedidos aos trabalhadores da ativa para compartilhar ganhos de produtividade. A desvinculação dos gastos em saúde e educação do aumento de receita manteria a destinação já elevada a esses dois segmentos socialmente relevantes sem risco de desperdício de recursos.
3. Ambição improvável: a coluna já ouviu, de respeitáveis analistas de mercado, que uma das expectativas é de que o pacote incluísse privatizações. Mesmo que Lula tenha perdido o preconceito com concessões, o cardápio de possibilidades anterior a essa quebra de tabu é tão variado que nem especialistas em contas públicas contam com essa hipótese. É só um registro.