A redução nos financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é vista com preocupação por Luiz Carlos Mendonça de Barros, presidente da instituição nos anos 1990. Segundo o economista, a medida afetará empréstimos de longo prazo na área de infraestrutura, com impactos no programa de privatizações do governo Jair Bolsonaro.
O governo federal pretende diminuir a atuação do BNDES. Qual sua avaliação?
É um erro terrível, apesar da utilização errada do banco em boa parte do período do PT. O BNDES tem quase 70 anos de história. Tem grande espaço na oferta de crédito de longo prazo. Colocar uma camisa de força no banco é erro histórico. Isso vai custar ao próprio governo.
Por quê?
Na hora em que o programa de privatizações em infraestrutura for implementado, não vai ter banco com capacidade de atender à demanda de empréstimos de prazo mais longo. Quando se fala em infraestrutura, o período é de cinco a 10 anos. Não existe banco privado para ocupar esse espaço, muito menos o que o presidente do BNDES (Gustavo Montezano) chama de butique financeira da Faria Lima (avenida de São Paulo que reúne instituições financeiras). Trabalhei 30 anos lá na Faria Lima e sei o que estou falando. Vai faltar dinheiro de longo prazo. O maior impacto não é agora. Com a crise, não existe demanda por investimento hoje. Mas, se olharmos para frente com otimismo de que haverá recuperação cíclica e projetos ambiciosos de infraestrutura, a falta do BNDES será sentida. Aí o leite já estará derramado. Estão desconstruindo estrutura preparada para essas atividades.
A economia corre risco de entrar em recessão técnica, com dois trimestres seguidos de queda no Produto Interno Bruto (PIB). Como descreve o atual cenário?
Esse negócio de recessão técnica é besteira. É uma norma internacional só para termos uma referência. O que caracteriza hoje a economia brasileira é a escassez de demanda. O desemprego e a queda na renda, com juro elevado, tiram o consumidor do mercado. Do lado do investimento, com a capacidade ociosa na indústria, quem vai aumentar a produção? É uma situação muito difícil, que não ocorre sempre. A crise de hoje é um ponto fora da curva. É preciso criar demanda, mas há dificuldades. Vai ser difícil colocar isso em prática em período rápido. O programa de privatizações criaria dinâmica de investimento e consumo no primeiro momento. Mas isso ocorre só em dois anos para frente.
Há alguma medida que pode dar estímulo no curto prazo à economia brasileira?
Há algumas sendo feitas. A queda no juro é uma delas, desde que o sistema bancário também baixe suas taxas. Sem isso, não vai adiantar nada. Do lado dos investidores, as expectativas melhoraram. O programa de saques do FGTS adiciona um pouco de procura por consumo, mas nada que resolva o problema rapidamente. Vamos precisar de dois ou três anos para sair do que chamo de buraco negro da demanda. Será necessária muita paciência. Colocar o BNDES em uma camisa de força vai no sentido contrário. O banco é tido como problema ideológico pela equipe econômica. Eles são contrários, sempre foram. Estão no poder e usando esse poder para levar adiante o que consideram que tem de ser feito. Acho que isso está errado. Mas quem manda são eles, e vamos ver as consequências.