Laura Carvalho tornou-se, no debate econômico, uma das principais vozes contrárias a políticas de austeridade fiscal adotadas pelo país nos últimos anos. Em entrevista à coluna, a autora do livro "Valsa brasileira: do boom ao caos econômico" critica medidas como o teto de gastos públicos e avalia projetos como a reforma da Previdência. Segundo ela, essa proposta não incentiva o crescimento do país no longo prazo.
Como descreve o atual momento da economia brasileira?
Há uma estagnação. Estamos caminhando para mais uma década perdida em termos de crescimento econômico.
Qual deve ser o impacto da liberação de saques do FGTS?
Estamos em claro quadro de falta de demanda. A economia está operando muito abaixo de sua capacidade. As famílias estão endividadas. Os agentes do setor privado estão cortando gastos, o que colabora para aprofundar a falta de demanda. Em meio a este contexto, o governo seria o único agente capaz de injetar ânimo, por meio de investimentos. O que a liberação de saques do FGTS faz é tentar anular o efeito recessivo que o corte de gastos públicos tem causado. É quase uma compensação para impedir que o quadro se agrave. Mas isso não é suficiente como motor de retomada da economia.
O governo federal aposta no avanço da reforma da Previdência para tentar reequilibrar as contas públicas e atrair investimentos privados ao país. Qual é sua avaliação sobre o projeto aprovado em primeiro turno na Câmara?
Essa medida até pode corrigir a tendência de crescimento nas despesas previdenciárias. Como o teto de gastos está em vigor, impediria corte ainda maior de outros investimentos em áreas como infraestrutura. Agora, a reforma não é capaz de gerar estímulo de longo prazo para o crescimento da economia. Na realidade, reduz o ritmo de corte de outras despesas, mas não libera espaço para mais gastos públicos. Tampouco é capaz de estimular investimentos privados em cenário de estagnação da economia. Hoje, não existe razão para o empresário expandir a capacidade produtiva de sua empresa.
A ampliação da capacidade produtiva depende do quê?
Não há mágica possível. A ideia de que a confiança será retomada com a reforma já era vendida para a aprovação do teto de gastos. A confiança não é dependente de uma ou outra notícia que anime o mercado financeiro. Precisa de realidade concreta de crescimento nas vendas.
A retomada da economia passa por quais medidas?
Com o cenário de desaceleração global, que não contribui para as exportações, e o alto nível de desemprego e endividamento privado, a reação passaria pela retomada do papel do Estado enquanto investidor em infraestrutura física e social.
Como essa mudança seria possível no país?
Duas reformas são urgentes. A primeira é a das regras fiscais vigentes, que colaboram para que o governo aprofunde a recessão, com medidas como o teto de gastos. Essa regra deveria excluir investimentos em infraestrutura e alterar o limite de crescimento das despesas. Além disso, o país precisa discutir uma reforma tributária que vá além da simplificação de impostos, o que é importante, e passe a trabalhar com o caráter regressivo do sistema. Ou seja, uma alteração na distribuição da carga tributária. Isso é necessário para tirar o peso dos impostos sobre os mais pobres e redistribuí-lo aos mais ricos. Seria bem importante.