As três melhores coisas que aconteceram para o PT nos últimos anos foram:
Três contradições. Das duas primeiras já escrevi. Só relembro que, se Dilma ainda estivesse governando, e não Temer, o PT é que seria rechaçado pela população, e não Temer.
Quanto à prisão de Lula, pense que, desde que foi recolhido à carceragem da Polícia Federal do Paraná, ele não precisa mais explicar nada do que cometeu de errado e ilícito durante e depois de seu governo, e foi muito o que ele cometeu de errado e ilícito durante e depois de seu governo.
Mas ninguém no PT, originalmente, queria o impeachment de Dilma e a prisão de Lula. O partido apenas soube lidar com esses reveses, transformando-os em trunfos.
Bolsonaro é obra indireta do PT. É uma consequência lógica das ações do partido.
Agora, quanto a Bolsonaro, não. Bolsonaro é obra indireta do PT. É uma consequência lógica das ações do partido.
No entanto, não foi sempre assim. Nos primeiros tempos, o PT não era um partido populista. Ao contrário, os petistas criticavam acerbamente o populismo de Brizola. Diziam, com deboche, que o PDT tinha dono.
A ideia do PT era arejar a política brasileira com um partido que, pela primeira vez na nossa história, se guiaria por ideias, não por projetos de poder. Eram pessoas honestas, modernas, retas, que não compactuariam com as velhas práticas dos políticos tradicionais.
Mas, depois de perder três eleições consecutivas, o PT chegou à conclusão de que teria de fazer concessões para alcançar o poder. É quase que um teorema:
1. Você tem boas intenções, mas não consegue colocá-las em prática porque não chega ao poder.
2. Para chegar ao poder é preciso se comprometer com quem tem más intenções.
3. Ao se comprometer com quem tem más intenções, você chega ao poder.
4. Chegando ao poder, você não consegue colocar suas boas intenções em prática, porque está comprometido com quem tem más intenções.
5. Você tem o projeto de continuar no poder, mas, para isso, não poderá pôr em prática suas boas intenções, terá que continuar fazendo o que sempre fizeram os que têm más intenções.
6. Logo, você se transformou em alguém com más intenções.
Foi isso que aconteceu ao PT, um processo de aliancismo parecido com o que manteve Getúlio Vargas no mando por 15 anos. Só que, em vez de Vargas, o PT tem Lula, o populista por excelência. Lula, antes, era apenas mais uma liderança do PT. Transformou-se no Único, no Pai Iluminado. Essa é uma figura indispensável ao populismo, vide o próprio Vargas, mais Perón, Mao, Hitler, Mussolini, Franco, Salazar, Tito, Chávez, Fidel etc.
O populismo precisa desse personagem, tipo o centroavante de referência, porque ele simboliza o bem. É pela graça dele que o povo recebe suas pequenas dádivas. Quando o homem do povo consegue algo do governo populista, não é o Estado que está cumprindo sua obrigação, é o líder que está fazendo uma concessão.
Mas, para o governo populista se distinguir, é indispensável haver a comparação com o mal. Como diria Nelson Motta e cantaria Lulu Santos, “não existiria som se não houvesse o silêncio; não haveria luz se não fosse a escuridão”.
Assim, temos aqui outro teorema:
1. O líder populista defende o povo.
2. Quem defende, defende do inimigo.
3. Logo, é preciso haver um inimigo.
Quem é o inimigo do povo? Obviamente, a elite. O não povo. Lula passou toda a sua trajetória falando da elite branca, rica, preconceituosa, pérfida. Você faz alguma crítica ao PT? Você não está errado: você é canalha, faz parte da elite pérfida. Essa postura excludente fez o que faz qualquer postura excludente: excluiu. Parte da sociedade, alijada moralmente pelos petistas ou apenas irritada com tanta arrogância, atirou-se para o outro lado, para o extremo oposto, para quem se mostrava inimigo do PT: Bolsonaro.
Só que Bolsonaro é o inimigo ideal: é grosseiro, preconceituoso, sem nenhuma sofisticação intelectual. Fosse uma direita inteligente, com homens como Roberto Campos, Mario Henrique Simonsen ou Luis Fernando Cirne Lima, o PT estaria em sérias dificuldades. Mas, não. Bolsonaro é grotesco, talhado a facão. É fácil ser contra ele.
Bolsonaro cevou-se do PT e o PT, agora, ceva-se de Bolsonaro. Eles estão no centro da política brasileira. Na periferia, os outros candidatos, impotentes, pálidos, perplexos, sem saber direito o que está acontecendo. E nós, é claro. Assistindo assustados. Experimentando a desagradável sensação de que ainda há muito a sofrer neste combalido Brasil do século 21.