Escreve D. Fulana (representando aqui diferentes mensagens): “Cara Dra. Cris, leio sempre sua coluna; me vacinei, fiz o teste de anticorpo neutralizante e deu positivo? negativo? – isso varia. Isso quer dizer alguma coisa?”. Cara Fulana, nenhum dos testes oferecidos atualmente medem a proteção gerada pela vacina. Não foi determinado ainda o que chamamos “correlato de proteção” para as vacinas contra a covid-19. Isso vai demorar alguns anos para estabelecer com clareza.
Nos EUA, onde as vacinas são da mesma plataforma, vai ser mais simples. Aqui, cada vacina é diferente, e não serão os mesmos correlatos. Cada teste atual mede coisas distintas. Se positivo, não se sabe se é suficiente ou quanto dura.
Parafraseando a consultora Keila Mallman, personagem da genial Ilana Kaplan: “Quer fazer o teste da IgG? Faz... Vai te dizer algo concreto? Não. Não vai te dizer nada”.
Sugestão do meu amigo Martin Bonamino, cientista do Instituto Nacional do Câncer (Inca): se você pode dispor do valor do teste, compre uma cesta básica e doe para alguém que precisa muito – e que provavelmente não está vacinado.
Um segundo caos foi criado dentro do caos que já vivíamos na pandemia. Para as pessoas que têm acesso às poucas vacinas disponíveis no Brasil, a ausência de uma fonte informações seguras – que deveria ser o Ministério da Saúde – serviu não apenas para desinformar sobre medição de anticorpos neutralizantes, mas também criou dúvidas sobre vacinas, culminando na normalização da falta de segunda dose.
Quem hesita em se vacinar por receio de supostos eventos adversos numa proporção de um ou dois casos por 1 milhão de vacinas, por que nunca hesitou com uso de anticoncepcionais, que geram problemas circulatórios em uma a cada 200 mulheres? Ou mesmo heparina, que causa tromboses em um a cada 500 ou 1 mil tratados?
Finalmente, é criminosa a orientação de vacinar ao máximo com a primeira dose sem viabilizar a segunda, que é o que efetivamente concretiza a proteção evidenciada por estudos clínicos. Quem apregoa que está “tudo bem” em atrasar a segunda dose ou está mal informado ou mal intencionado, ou ambos. A eficácia de cada vacina é baseada no intervalo usado no ensaio clínico fase III. Fora disso, é achômetro, aliás muito usado no Brasil para gerenciar a pandemia.
Outra carta: “Dra Cris, o Ministério quer estender para 12 semanas o intervalo entre doses da vacina Pfizer”. Vacina que é 95% eficaz se a segunda dose é dada após três semanas. Quer estender? Estende. Vai funcionar? Não. Não vai funcionar.