Escrevo no dia 5/11. O segundo turno das eleições já finalizou no Brasil. Mais de 1 milhão de americanos já devem ter votado para presidente; hoje é o último dia. Dezenas de milhões de dólares gastos em campanhas, que não conseguiram alterar significativamente as intenções de voto do início ao fim. A firme adesão a um conjunto de ideias, que não muda frente a fatos ou evidência, já não surpreende os cientistas e estudiosos da razão. Como, perguntamos, podem as pessoas se apegar a ideias amplamente desmentidas? Por que somos frequentemente incapazes de raciocinar de forma lógica?
Na política, vêm ganhando aqueles que sabem como vender aquilo no que as pessoas acham que já acreditam
No livro O Enigma da Razão (Harvard), os cientistas europeus Hugo Mercier e Dan Sperber propõem que o raciocínio não evoluiu nos seres humanos para resolver problemas lógicos ou analisar dados complexos, mas para possibilitar a maior vantagem adaptativa da espécie: a habilidade de resolver os problemas que surgem quando precisamos trabalhar em grupo. A razão seria a principal adaptação a tal nicho evolutivo hipersocial. Assim, traços que podem parecer bobos ou ilógicos do ponto de vista de um intelectual podem ser geniais se considerados em uma perspectiva “interacionista”. O famoso viés de confirmação, em que a pessoa aceita novas informações que confirmam, mas não as que contradizem aquilo em que já acredita, é o maior exemplo.
Humanos acreditam se alguém do seu grupo diz que uma nova tecnologia é boa, sem precisar entendê-la. Todos usamos descargas em vasos sanitários sem saber exatamente como funcionam. Explicar como funciona uma privada é mais difícil do que parece.
Na política, vêm ganhando aqueles que sabem como vender aquilo no que as pessoas acham que já acreditam. Na prática, concordamos que privatização é um sistema bom ou ruim, sem entender claramente os impactos de implantá-la na educação ou em serviços.
Talvez provocar as pessoas a entender o que elas acham que sabem, mas na prática ignoram, seja uma maneira melhor do que apenas recitar fatos, e de quebrar as fortes polarizações que hoje trazem tanta insegurança para o mundo.