Utilizar alimentos frescos, adquiridos na feira e preparados com todo o esmero. Compartilhar refeições e desfrutar do alimento sem pressa. Na correria do dia a dia, muitas pessoas esquecem que cozinhar e comer podem ser fontes de prazer. E é justamente esse resgate de nutrição mais natural a base do movimento slow food, criado há mais de duas décadas na Itália.
No Brasil, a corrente ganhou visibilidade há cerca de 10 anos, e vem crescendo pela maior oferta de orgânicos, pela preocupação de estudantes e profissionais da área de gastronomia com a procedência e frescor da matéria-prima de seu trabalho e a partir da abertura de restaurantes que adotam os princípios. Além disso, é considerada questão de saúde.
– O fato de as pessoas adoecerem mais faz com que busquem alimentos mais saudáveis – explica Juliana Noal, coordenadora da Faculdade de Gastronomia do Senac Porto Alegre e entusiasta da proposta que se contrapõe ao fast food.
Doenças têm relação com a nutrição
A afirmação é reforçada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que alerta para a relação entre comida processada e doenças crônicas e obesidade.
Além de a comida ser boa, limpa e justa, a filosofia propõe que as pessoas respeitem a biodversidade, aproveitem integralmente o alimento, priorizem vegetais da safra e locais e comprem, preferencialmente, direto do agricultor. Esse último, além de garantir itens frescos e baratos, garante remuneração mais justa para quem produz. Outra proposta é o resgate cultural, estimulando a disseminação de receitas de família e de grupos populacionais, como quilombolas.
– Temos riqueza cultural, por que comprar pronto? Comida boa é a que a gente faz em casa, é comida de verdade – destaca Maria Rita Cuervo, professora da Pontifícia Universidade Católica (PUCRS) e integrante do Convívio Porto Alegre, grupo local da Associação Internacional de Slow Food.
Como se fosse de casa
O movimento slow food estimula as pessoas a cozinharem em casa. Mas, nem a falta de tempo para preparar o alimento é desculpa para deixar de aderir à proposta. No Estado, há restaurantes que adotam os princípios da filosofia. Em Garibaldi, o Valle Rustico, cultiva parte dos vegetais na propriedade e estabeleceu uma rede com produtores locais, seguindo o conceito da ecogastronomia.
– Os benefícios estão ligados à soberania alimentar, que é conseguir produzir os alimentos por meio das nossas próprias sementes. O slow food cria essa rede que interessa especialmente aos pequenos produtores e beneficia a todos. Existe uma redução da distância entre o produtor e o consumidor, uma relação de confiança sobre a origem e o manejo – afirma o chef Rodrigo Bellora, do Valle Rustico.
Outros exemplos da Serra são o Champenoise Bistrô, de Pinto Bandeira, com influências da cozinha campesina sazonal e certificação orgânica e biodinâmica, e o Osteria Della Colombina, de Garibaldi, liderada por Odete Bettú Lazzari e quatro filhas, oferece refeições típicas do imigrante e visita aos pomares e parreirais.
Em Porto Alegre, o Mandarinier Gastronomia, comandando pelos chefs Leonardo Magni e Liliana Andriola, adota os princípios do slow food na forma de preparo e nos cuidados em privilegiar alimentos sem agrotóxicos. Também na Capital, o Del Barbiere, utiliza produtos regionais, da estação, com destaque para orgânicos.
Princípios da filosofia
Boa
O alimento tem de ser gostoso, dar prazer e saboreado lentamente, prestando atenção ao que come. Partilhar a mesa com pessoas que gosta, conhecer o produto e sua procedência.
Limpa
A comida deve ser saudável, preferencialmente orgânica. Ser nutritiva e respeitar a biodversidade.
Justa
O alimento precisa sustentar financeiramente todo o processo produtivo. Ter valor justo do início ao final da cadeia, onde o consumidor paga um preço apropriado.