Há quatro meses, João Vitor Macedo, 15 anos, foi morto a tiros no bairro Agronomia, na zona leste de Porto Alegre. Um policial civil confessou ter atirado na direção em que estava o adolescente. O caso terá reprodução simulada dos fatos, técnica popularmente conhecida como reconstituição. A perícia está prevista para ser realizada no fim da próxima semana, em 9 de agosto.
O intuito da reprodução é compreender se as versões ouvidas durante a investigação são compatíveis com a realidade. Para isso, cenários são reproduzidos e testados pelos peritos, que verificam se o relato é condizente. Segundo o Instituto-Geral de Perícias (IPG), foi solicitada a intimação de todos os envolvidos no caso. Entre essas pessoas, estão testemunhas que auxiliaram no socorro do adolescente e o próprio policial que admitiu os disparos.
O exame, segundo a perícia, consiste na apresentação, pelos participantes, de suas versões, de forma individual. Isso é realizado por meio de uma espécie de entrevista com cada parte. Essa é a primeira etapa da reprodução. As mesmas versões são reproduzidas no local dos fatos. Depois disso, é elaborado um relatório com as conclusões sobre o caso.
É um tipo de técnica comum quando se tem dúvidas sobre a forma como se deu a dinâmica dos acontecimentos. Outros casos de repercussão também passaram por reprodução simulada, como o assassinato do menino Miguel dos Santos Rodrigues, sete anos, pela mãe e pela madrasta, em Imbé, no Litoral Norte, e a morte do garoto Rafael Mateus Winques, 11 anos, crime pelo qual a mãe foi condenada em Planalto, no norte do Estado.
Em abril deste ano, em coletiva à imprensa, a Corregedoria-Geral da Polícia Civil confirmou que o servidor havia confessado os disparos, mas que as circunstâncias em que isso se deu precisavam ainda ser melhor apuradas. Foi informado ainda que a investigação deveria ser concluída no prazo de 60 a 90 dias. No entanto, esse prazo se encerrou no fim do mês passado.
Chefe da Polícia Civil, o delegado Fernando Sodré afirmou na segunda-feira (29) que a investigação continua em andamento, mas que está na fase final. O agente permanece em licença de saúde, segundo a Polícia Civil.
“Minha vida paralisou”, diz mãe
— Todo dia 28 é muito difícil. Nunca vou esquecer na minha vida. Minha vida paralisou — desabafa a mãe do adolescente, Juliana Lopes Macedo, 34 anos.
João Vitor estava passando algumas semanas na casa da avó paterna, quando foi morto no Beco dos Marianos, próximo da Avenida Bento Gonçalves. Um vídeo registrou o momento em que uma viatura da Polícia Civil ingressa no beco, logo após o adolescente passar correndo naquela direção. Segundo a Corregedoria-Geral da Polícia Civil, um servidor confessou ter atirado na direção dele.
Cadê o prazo de 60 a 90 dias? Já fechou 120 dias. São 120 dias sem meu filho, 120 dias que não tenho uma resposta.
JULIANA LOPES MACEDO
Mãe de João Vitor
O adolescente foi socorrido e levado para atendimento médico até o Hospital de Pronto Socorro. No trajeto, conforme familiares, o próprio garoto disse que tinha sido baleado por um policial civil. No início de abril, após a morte de João Vitor, a família realizou protesto na Avenida Bento Gonçalves, tentando despertar atenção para o caso.
Toda a semana, Juliana visita o Cemitério Jardim da Paz, onde o corpo do filho está sepultado. No último domingo (28), quando o caso completou quatro meses, ela foi à Igreja São Jorge, no bairro Partenon, orar por ele. A mãe segue aguardando por um desfecho do caso.
— Cadê o prazo de 60 a 90 dias? Já fechou 120 dias. São 120 dias sem meu filho, 120 dias que não tenho uma resposta. Parece que foi uma coisa que não tem o que fazer. Eles têm o que fazer. Eles têm como esclarecer — cobra Juliana.
O caso
- Protesto – No dia 2 de abril, a família fez uma manifestação, com pedidos de justiça, e fechou a Avenida Bento Gonçalves. Foi quando a morte de João Vitor se tornou pública. No mesmo dia, o chefe da Polícia Civil confirmou a existência de indícios que apontavam para a possível participação de policiais na morte.
- Falta de socorro – A mãe de João Vitor diz que o filho já havia cumprido medida socioeducativa e acredita que, em razão disso, ele tenha escapado correndo. Um dos pontos questionados pela família, que deve ser esclarecido pela investigação, é por qual motivo o policial não acionou o socorro após atirar na direção do adolescente. O garoto foi levado ao hospital por populares.
- Coletiva – No dia 12 daquele mês, a Corregedoria da Polícia Civil afirmou em coletiva que um agente havia confirmado ter atirado na direção do adolescente. Pelo que se apurou até o momento, o policial teria disparado três vezes. As circunstâncias em que se deram os disparos passaram a ser apuradas. A promessa foi de que a investigação seria concluída em até 90 dias.
- Imagens – Uma câmera de segurança registrou cenas de João Vitor e outro adolescente correndo na Avenida Bento Gonçalves, indo ao Beco dos Marianos, e de uma viatura seguindo na mesma direção, com o giroflex ligado. Algum tempo depois, o outro garoto retorna correndo e o veículo da Polícia Civil deixa o beco. Neste momento, João Vitor já teria sido baleado. O veículo do Departamento de Polícia Metropolitana foi identificado, assim como o policial que estava nele.