O Superior Tribunal de Justiça derrubou a decisão que concedia prisão domiciliar a Marizan de Freitas, apontado como líder de uma facção criminosa do Rio Grande do Sul. O ministro Rogerio Schietti Cruz reconsiderou a própria decisão, tomada em 10 de agosto, após ter acesso à informação de que Marizan havia fugido de prisão domiciliar em julho. Conforme o STJ, o fato de que o preso havia fugido anteriormente foi omitida pela defesa, que impetrou habeas corpus no STJ, e pela 1ª Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre, que não informou a situação ao ministro. A reconsideração atendeu a um recurso do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS).
O líder de facção, condenado a 38 anos de prisão, estava em domiciliar em julho, fugiu e foi recapturado dias depois, no dia 30 de julho, em um condomínio de luxo em São Paulo, dias após fugir da prisão domiciliar. Trazido novamente ao Rio Grande do Sul, foi levado para a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc).
Reviravolta
Em 10 de agosto, o ministro do STJ Rogerio Schietti Cruz atendeu pedido da defesa de Marizan e concedeu, mais uma vez, o direito à prisão domiciliar. Segundo o documento, o benefício foi concedido em razão da comprovação do "quadro debilitado de saúde do sentenciado", que, de acordo com o despacho, apresenta "tuberculose em tratamento, infarto, hipertensão arterial, depressão e ansiedade".
Quando foi recapturado, no dia 30 de julho, Freitas ainda se recuperava de uma cirurgia realizada cinco dias antes, na coxa direita, onde havia um ferimento antigo causado por disparo de arma de fogo. Na decisão do STJ, o ministro Schietti Cruz pontua que "a unidade prisional afirmou não possuir recursos técnicos e adequados para ministrar o tratamento pós-operatório".
Na reconsideração desta quarta-feira, o ministro considerou as informações prestadas pela defesa e pela Vara de Execuções - que basearam a autorização a nova prisão domiciliar – uma “completa distorção da realidade”.
Para o ministro, as circunstâncias da fuga de Marizan da prisão domiciliar em julho, apenas posteriormente apresentadas ao STJ, "são aptas a desconstruir o alicerce da decisão, que se baseou, exclusivamente, nos riscos de agravamento da saúde, supostamente comprovados pelos documentos juntados aos autos".
Na nova decisão, publicada na tarde desta quarta-feira, o ministro também determinou o envio de cópia da decisão para a Comissão de Ética da Ordem dos Advogados do Brasil, do Rio Grande do Sul, para que seja apurada a conduta dos advogados de defesa.
A decisão do STJ mantém Marizan preso na Penitenciária Estadual de Canoas. Em decisão anterior, a Justiça de Parobé já havia atendido pedido do MPRS e suspendido a prisão domiciliar humanitária.
Contraponto
Os advogados de defesa de Marizan de Freitas, Bruna Castelo Branco Ritter e Santo Veríssimo Camacho Rodrigues, contestam os argumentos utilizados pelo STJ para derrubar a prisão domiciliar e consideram a decisão equivocada. Os advogados argumentam que a realização da cirurgia, em 25 de julho, está amplamente documentada e comprovada no pedido de Habeas Corpus. Sobre a fuga de Marizan, a defesa afirma que não há procedimento instaurado para apurar se houve a “falta grave”, ou seja, que não há comprovação oficial de que a fuga aconteceu. A defesa afirma que irá impetrar novo habeas corpus amanhã no Supremo Tribunal de Justiça para garantir a prisão domiciliar de Marizan. Sobre o pedido do ministro para envio de cópia da decisão à Comissão de Ética da OAB-RS, para que seja apurada a conduta dos advogados, a defesa argumenta que todos os fatos relatados no pedido de Habeas Corpus, incluindo a cirurgia de Marizan, estão comprovadas e não houve omissão de informações.
Extensa ficha criminal
Dos 38 anos de condenação, Marizan já cumpriu pelo menos 11. Há condenações por tráfico de drogas, tentativa de homicídio, além de outros processos, inclusive por homicídio e lavagem de dinheiro. Ele é suspeito de ser um dos líderes de facção gaúcha que tem base no Vale do Sinos.
Em 2015, O MP interceptou escutas telefônicas, com autorização da Justiça, que comprovaram a atuação de chefes do tráfico dentro das cadeias do RS. Em uma das gravações, Marizan de Freitas, que estava preso na Pasc à época, acompanhou, ao vivo, pelo telefone celular, a execução a tiros de um rival na disputa por pontos de venda de drogas. Após a execução, ele ainda teria reclamado que a pistola “engasgou”. No mesmo ano, a Justiça determinou que ele fosse encaminhado a uma penitenciária federal de segurança máxima.
Em 2020, Freitas foi um dos 18 líderes de facções que foram transferidos para penitenciárias federais fora do Estado durante a megaoperação Império da Lei. Um ano depois, ele retornou à Pasc, considerada a penitenciária mais segura do Estado.