Além de estelionato, a Polícia Civil identificou outros possíveis delitos envolvendo a loja online Tá di Zuera, suspeita de golpes contra clientes. São crimes de natureza tributária e contra as relações de consumo. Até o momento, cerca de 80 vítimas foram ouvidas na 1ª Delegacia de Polícia de Canoas, mas ao menos 373 ocorrências foram registradas no Estado. Um dos investigados é o humorista Dilson Alves da Silva Neto, o Nego Di. Ele fez propaganda do site nas redes sociais e chegou a afirmar ser proprietário da loja – atualmente nega ser o dono.
Segundo o delegado Rafael Pereira, da 1ª DP de Canoas, a polícia continua ouvindo vítimas e reunindo documentos para comprovar a fraude. Foi assim que os investigadores encontraram evidências de que, além de golpe, o caso possa envolver outros crimes.
— De alguns produtos que foram entregues, da pequena parcela que foi recebida, já que a grande maioria não existiu, parte não havia criação e nem emissão de nota fiscal. Há clara sonegação de impostos. Além do estelionato, o inquérito já amplia para crimes tributários e crimes contra a relação de consumo — afirma o policial.
Desde julho, consumidores que compraram os produtos e não receberam realizam manifestações e pedem a devolução dos valores. A polícia chegou a realizar mutirão para ouvir clientes que relatam ter sido lesados. A maioria fez as compras entre os meses de março e abril de produtos como aparelhos de ar-condicionado, televisores ou smartphones. Após fazer o pagamento por Pix ou boleto bancário, aguardaram pela entrega, que não aconteceu. Acreditando terem sido vítimas de golpe, passaram a se reunir em grupos de WhatsApp para trocar informações e buscaram a polícia.
Foi o caso do porteiro Tailson Antunes, 31 anos, morador de Viamão, na Região Metropolitana. Seguidor de Nego Di nas redes, ele se entusiasmou quando viu os anúncios dos produtos. Pensou que era a chance de equipar a casa com aparelhos de ar-condicionado. Convenceu a mãe a adquirir também e juntos compraram três, dois de 18 mil btus, por R$ 999,00 cada, e um de 9 mil btus, por R$ 599,00.
— Minha mãe até chegou a perguntar “isso não é golpe? Está muito barato”. Aí eu peguei os stories do Di e mostrei para ela. Ele dizia que não tinha como ele aplicar golpe, que era conhecido. Que só queria proporcionar conforto para a gente que é pobre — recorda.
No período em que aguardava o recebimento, o porteiro viu os anúncios dos televisores também com valores atrativos. Foi quando decidiu fazer nova compra, dessa vez para o quarto da filha e a cozinha da mãe. Foram adquiridos dois aparelhos, um de 65 polegadas por R$ 2.190,00 e outro de 70 por R$ 2.490,00. Antunes seguiu aguardando e só descobriu a suspeita de golpe quando o caso repercutiu na internet. Diz que chegou a desenvolver problemas de saúde, em razão do estresse.
— Fiquei atucanado, precisei fazer uma bateria de exames. É complicado. Quando não envolve só o dinheiro da gente, acaba sentindo muito mais pressão. Minha mãe é doméstica e perdeu mais de R$ 3 mil. Para ela conseguir esse valor são meses de trabalho. Fico com isso na cabeça o tempo todo — relata o porteiro.
Indenizações
O ex-BBB publicou vídeos no Instagram alegando que só foi contratado por outro empresário, que indica como o responsável pela loja, para fazer a propaganda para o site – alegou o mesmo em depoimento à polícia. Nas gravações, Nego Di informou que começaria a indenizar os consumidores que adquiriram os itens por acreditarem na imagem dele. Informou ainda que havia vendido o próprio carro e que realizaria eventos para angariar valores. Depois disso, o humorista passou a divulgar nas redes sociais comprovantes de pagamentos feitos às vítimas.
Os clientes reclamam, no entanto, de não terem prazo e nem estimativa de quando receberão. O advogado Hernani Fortini, um dos responsáveis pela defesa do ex-BBB, afirma que até agora foram cerca de 60 consumidores indenizados. A defesa diz que não é possível estimar ainda a quantidade de pessoas atingidas e nem o valor total porque o humorista não tinha acesso a essas informações da empresa. Ele reforça que o cliente fazia somente a propaganda e que não recebeu nenhum pagamento.
— Até o momento, ultrapassam R$ 80 mil (pagos) em indenizações voluntárias. Continuarão sendo realizadas, no entanto, devagar, em razão de que até a presente data a empresa pagar.me não forneceu o acesso ao sistema —informa o advogado.
Em Nova Bréscia, no Vale do Taquari, Maristela Oliveira, 50 anos, é uma das consumidoras que chegou a enviar as informações na expectativa de receber o valor de volta, mas segue aguardando. Na esperança de ter um ar-condicionado em casa, investiu R$ 799,00.
— Trabalho à noite e queria ter um pouco mais de conforto para conseguir dormir. Esse valor estava guardado para dar uma entrada num ar mais para a frente — diz.
A cuidadora de idosos ainda foi responsável por intermediar a compra de dois aparelhos de ar-condicionado, um pelo mesmo valor e outro por R$ 999,00, e uma televisão de 55 polegadas por R$ 1.940,00.
— Os patrões do meu marido acharam barato, quando eu falei que tinha comprado. Aí me pediram se eu podia comprar para eles, que me repassavam o valor. E agora estou tentando ter de volta ao menos o dinheiro deles. Assim como eu confiei, eles também confiaram — conta.
Pelo Instagram, Maristela soube do atraso nas entregas, mas decidiu aguardar a chegada dos produtos. No entanto, quando a suspeita de estelionato passou a ser divulgada, registrou o caso pela Delegacia Online e ingressou com ação na Justiça.
— Enviei e-mail com tudo que pediram. Duas semanas atrás, fez último post sobre os estornos. Não tenho esperança que ele devolva. Ele (Nego Di) alega que também sofreu o golpe. Eu confiava nele, realmente. Mas está bem difícil de continuar acreditando nas pessoas.
Qual a orientação para pedido de reembolso
A orientação repassada pelo humorista e sua defesa para os compradores segue sendo a de enviar e-mail para estornosnegodi@gmail.com, com dados como nome completo, dados bancários, nota ou comprovante de compra. Se houver processo aberto, a solicitação é para que envie o número e também contato de advogado.
Quem foi vítima
A Polícia Civil orienta os consumidores a registrarem o fato por meio de ocorrência. É possível procurar qualquer delegacia, a Delegacia Online ou buscar diretamente a 1ª Delegacia de Polícia de Canoas.