Pouco mais de uma semana após o humorista e ex-BBB Dilson Alves da Silva Neto, o Nego Di, prometer nas redes sociais ressarcimento aos clientes que relatam terem sido lesados pela loja online Tá di Zuera, consumidores reclamam de estarem no aguardo dos valores. O caso é investigado pela Polícia Civil como suspeita de estelionato.
Na família da microempresária Kelly Amaral, 45 anos, três pessoas esperam para receber o pagamento de volta. Em maio, ela adquiriu uma televisão de 70 polegadas pelo valor de R$ 2.490,00. Antes de realizar a compra, chegou a suspeitar do valor abaixo do mercado e foi alertada por outras pessoas de que poderia se tratar de um golpe, mas diz que, ao buscar informações nas redes sociais do humorista, acabou se convencendo.
— Nos stories (no perfil do Instagram) ele falava “a loja é minha, não precisa ter medo de comprar, não é golpe”. Começou a mostrar vídeos de ar-condicionado chegando. Enfim, eu fui lá e comprei — recorda.
Além de adquirir o produto, Kelly ainda convenceu o filho a comprar uma televisão igual e o primo, que optou por uma de 65 polegadas no valor de R$ 2.190,00. Sem receber o produto, Kelly decidiu procurar a Polícia Civil e também ingressou na Justiça.
Na semana passada, Nego Di fez uma manifestação nas redes sociais na qual nega ser o proprietário da loja. Foi o mesmo que ele alegou ao prestar depoimento à polícia – apontou o nome de outra pessoa como sendo o dono da loja e relatou ter sido contratado para fazer a propaganda. Nos mesmos vídeos, ele reconheceu que os consumidores confiaram em sua imagem e se comprometeu a fazer o reembolso dos valores.
Desde então, a microempresária é uma das pessoas que aguarda ter de volta o valor pago.
— Ele faz no máximo quatro ou cinco estornos por dia. Essa semana ele foi no Instagram dizer que só ia estornar semana que vem. Ele não está cumprindo. Cadê o dinheiro do carro (o humorista afirma ter vendido o próprio veículo)? Estamos com as mãos atadas, sem saber mais a quem recorrer. O que mais queremos frisar é que ele não está cumprindo. Mais uma vez, está nos enrolando. Estou muito preocupada com meu filho. Ele ganha 1,2 mil por mês. Isso corta o coração — reclama Kelly.
A mesma situação é vivida pelo funcionário público Rafael de Oliveira Jardim, 38 anos, que adquiriu no início de abril um Iphone por R$ 5,5 mil – o mesmo modelo é vendido na internet por cerca de R$ 7 mil. Sem receber o produto, chegou a trocar mensagens por telefone com o humorista, que afirmou em áudios que a entrega havia atrasado, porque os produtos tinham sido retidos, mas que faria o estorno, o que não aconteceu.
— Sigo o Nego Di nas redes sociais há bastante tempo e o que me levou a comprar foi ele se colocar à frente das propagandas. Depois, demonstrou vídeo entregando os Iphones. Apesar de pagar R$ 5,5 mil à vista, no pix, pensei “o cara não vai fazer isso”. No meu caso, a diferença de valor não era tanta, mas pensei que estava economizando um pouquinho — recorda o morador de Canoas, que até hoje aguarda pelo recebimento do valor.
Dezenas de outras mensagens foram recebidas pela reportagem de outros consumidores que afirmam também aguardarem o ressarcimento e que reclamam de não ter transparência nesse procedimento. A defesa do ex-BBB conseguiu, na semana passada, liminar na Justiça para impedir o funcionamento do site da loja digital – a página está fora de operação atualmente.
A polícia vem tentando ouvir o máximo de vítimas nos últimos dias. Segundo o delegado Rafael Pereira, da 1ª Delegacia de Polícia de Canoas, na próxima segunda-feira (1º) será realizado mutirão para ouvir mais 50 vítimas. Os consumidores estão sendo intimados por telefone para que compareçam e prestem depoimento.
Responsável por representar parcela de clientes lesados, o advogado criminalista Guilherme Moraes enviou nota à reportagem na qual afirma que se reuniu ainda no fim de semana passado com a defesa de Dilson para debater a forma como os ressarcimentos serão realizados. O advogado detalha que ainda aguarda a apresentação organizada da ordem dos pagamentos e estimativa de tempo para as futuras transações. O criminalista diz ainda que segue em contato com a Polícia Civil e que na próxima semana deve se reunir com o delegado do caso para colaborar com os próximos passos da investigação.
“Cumpre esclarecer, ainda, que os valores ressarcidos aos ofendidos - mesmo podendo vir a demostrar um comportamento nobre da parte do investigado Dilson e sua defesa - não impede que todos os envolvidos no delito sejam indiciados e, posteriormente, processados criminalmente", afirma na manifestação.
R$ 30 mil ressarcidos, diz defesa
O advogado Hernani Fortini, um dos responsáveis por representar o humorista no caso, afirma que o cliente não fazia parte da administração e gestão da loja e, por isso, não possui acesso a nenhuma informação que facilite o levantamento. Até o momento, conforme o advogado, foram pagos em indenizações cerca de R$ 30 mil para 30 pessoas.
— Já estamos em contato com o site pagar.me para verificar a possibilidade de fornecer o histórico de pagamento realizados para ajudar a pretensão de indenização voluntária aos consumidores. O pedido encontra-se no jurídico do site, para analisar a possibilidade de fornecer para terceiros a informação. Oportuno mencionar que o referido procedimento é feito de forma manual e sem estrutura alguma, pois não se trata de uma empresa, mas sim da pessoa física do Dilson — afirma o advogado.
Segundo a defesa, é necessário verificar e validar cada documento, antes de realizar o pagamento, já que haveria pessoas fingindo ter adquirido os produtos para receber algo. O advogado diz que no momento não é possível prever quanto tempo levará o reembolso dos consumidores porque não se sabe até agora o valor total das pessoas lesadas e nem mesmo quanto será possível arrecadar para fazer a devolução.
— Frisa-se que não se trata de mero estorno. Ele está tirando dinheiro do seu próprio bolso para isso, pois não recebeu nada da loja. Registra-se que ele poderia aguardar o posicionamento que terá o judiciário para eventualmente se envolver. Tal atitude trata-se de mero ato voluntário em razão de que muitas pessoas compraram pela imagem dele envolvida — ressalta.
Entenda o caso
Consumidores passaram a procurar a Polícia Civil após acreditarem ter sido vítimas de um golpe. Os clientes adquiriram produtos, como televisores, aparelhos de ar-condicionado e smartphones, por meio da loja online Ta di Zuera. No seu perfil no Instagram, o humorista anunciava as promoções e afirmava ser proprietário da loja, assegurando a seriedade das negociações. Os valores dos produtos eram bem abaixo do mercado, chegando à metade do preço. Após os prazos vencerem, sem receber os itens, parte dos clientes buscou a polícia por suspeitar ter sofrido estelionato e apontando Nego Di como o autor.
Até a semana passada, tinham sido registradas 315 ocorrências na Polícia Civil do Rio Grande do Sul, mas há clientes de outros Estados, que estão inclusive em grupos criados no WhatsApp. Os consumidores chegaram a realizar manifestações em Porto Alegre pedindo uma solução para o caso. Nego Di já foi ouvido pela investigação e negou ter cometido estelionato. No depoimento, afirmou não ter recebido nenhum valor e ter feito um acordo no qual seria pago somente para fazer propaganda do negócio.
Qual a orientação para pedido de reembolso
A orientação repassada pelo humorista e sua defesa para os compradores segue sendo a de enviar e-mail para estornosnegodi@gmail.com, com dados como nome completo, dados bancários, nota ou comprovante de compra. Se houver processo aberto, a solicitação é para que envie o número e também contato de advogado.
Quem foi vítima
A Polícia Civil orienta os consumidores a registrarem o fato por meio de ocorrência. É possível procurar qualquer delegacia, a Delegacia Online ou buscar diretamente a 1ª Delegacia de Polícia de Canoas.