Em depoimento nesta sexta-feira (27), o policial militar temporário detido pela morte de um cliente no Carrefour do bairro Passo D’Areia em Porto Alegre, alegou que só queria imobilizar a vítima. Giovane Gaspar da Silva, 24 anos, foi preso em flagrante na noite do dia 19 de novembro, quando aconteceu o crime. João Alberto Silveira Freitas, 40 anos, morreu após ser espancado. Giovane aparece em imagens desferindo uma série de socos no cliente, no rosto e na cabeça.
O policial militar temporário é uma das três pessoas presas durante a investigação. Além dele, está detido desde o dia 19 Magno Braz Borges, e Adriana Alves Dutra, que se apresentou à polícia no início desta semana e foi presa de forma temporária. Em coletiva de imprensa na tarde desta sexta, a delegada Roberta Bertoldo, da 2ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), informou que o depoimento se iniciou durante a manhã e durou cerca de quatro horas.
— Ele informou que a intenção dele era de tão somente imobilizar a vítima — disse a delegada.
Segundo Roberta, o PM destacou inúmeras vezes que não pretendia causar a morte da vítima. Alegou que João Alberto estava alterado. Ele afirmou que foi chamado para uma ajuda no caixa 25 e que, ao chegar lá, encontrou a vítima olhando para uma das fiscais. Ele disse que João Alberto saiu em direção ao estacionamento e que ele decidiu ir atrás. Giovane afirmou que no trajeto não teria sido dito nada.
— E que ao chegar na porta, de forma repentina, a vítima teria lhe desferido um soco — disse a delegada.
Sobre as agressões, o policial disse que aconteceram na intenção de conter a vítima. Giovane afirmou que era o seu primeiro dia trabalhando para a empresa Vector. Ele confirmou que Adriana era a responsável por coordenar os funcionários no momento.
— Mas ele disse que não soube afirmar o que teria sido dito na sua volta — disse Roberta.
Entender o que aconteceu entre o momento no qual João Alberto foi acompanhado pelos funcionários, passou pela esteira e chegou ao estacionamento, onde foi espancado, era um dos principais objetivos desse depoimento.
Segundo a diretora do Departamento de Homicídios, Vanessa Pitrez, todas as informações precisarão ser verificadas.
— O interrogatório por si só não é uma prova cabal para o inquérito — afirmou a delegada Vanessa.
Segundo a diretora do Departamento de Homicídios, foi questionado ao policial se ele teve alguma motivação racial e ele negou.
— Nosso papel enquanto policias não é fazer juízo de valor. É ouvir as pessoas e ver se existem elementos que comprovem a versão. Os vídeos e imagens para nós são bastante claros. Houve um homicídio praticado com uma série de qualificadoras. O que estamos apurando são as motivações. Que houve um homicídio doloso para nós não há dúvida — afirmou Vanessa.
Giovane é mantido preso no Batalhão de Guarda da BM. Ele e Magno foram autuados pela Polícia Civil por homicídio triplamente qualificado: motivo fútil, asfixia e recurso que impossibilitou a defesa da vítima.
Além da investigação da Polícia Civil, Giovane teve a conduta avaliada pela Brigada Militar por meio de um processo administrativo disciplinar (PAD). Até ser preso, Giovane atuava no Departamento de Comando e Controle Integrado (DCCI), no monitoramento de câmeras, junto à sede da Secretaria da Segurança Pública do Estado.
— Ainda temos algumas diligências a fazer. Iremos trabalhar um pouco mais com depoimentos, verificar se será necessária a coleta de novas imagens. Para esclarecer não só por completo as circunstâncias, como a motivação da morte do João Alberto e responsabilização de cada um — disse a diretora do DHPP, delegada Vanessa.
O que diz a defesa
A defesa do policial militar temporário afirma que ele "não tinha a intenção" de matar. David Leal, do escritório Hoffmeister & Leal, diz que seu cliente "foi inexperiente" na ação em que desferiu vários socos na vítima, mas que a morte "foi um acidente".
Sobre a sequência de socos dados pelo PM na cabeça da vítima, o advogado defende que fez parte da "tentativa de contenção". O entendimento do advogado é de que o caso se trata "de uma lesão corporal seguida de morte" ou de um homicídio culposo, mas não de homicídio doloso — o que, para ele, é um excesso.
Já o advogado responsável pela defesa de Magno, Jairo Cutinski, adiantou que ele usará o direito constitucional de permanecer em silêncio e só falar durante o processo. Por isso, ele não foi ouvido pela Polícia Civil.
Segundo o Grupo Vector, que prestava serviços para o setor de “prevenção e perdas” no Carrefour, os dois “tinham a função de fiscal de piso” e as anormalidades deveriam ser reportadas “para a segurança do estabelecimento”. Eles foram desligados da empresa após o caso.
Processo na BM
O Comando da Brigada Militar afirmou que decidiu pela expulsão de Giovane do quadro funcional. Nesta sexta-feira, Giovane foi comunicado formalmente desta decisão. A partir de agora será aberto prazo de três dias úteis (a contar de segunda-feira) para que a defesa dele apresente recurso.
Confira a nota da BM:
"Na última quinta-feira(26), o Comando da Brigada Militar emitiu decisão desfavorável, no Processo Administrativo Disciplinar (PAD), ao Militar Estadual Temporário que, de folga, participou das ações que culminaram com a morte de João Alberto Silveira Freitas no dia 19 de novembro. Hoje, sexta-feira (27), o Militar Estadual foi cientificado formalmente da decisão.
A partir de agora será aberto um prazo de 3 dias úteis (a contar de segunda-feira) para possibilidade de recurso por parte da sua defesa. A Brigada Militar ressalta que esses são passos do processo demissionário, que não podem ser eliminados, para respeitar as exigências legais de ampla defesa."
A investigação
Segundo a Polícia Civil, até o momento, já foram ouvidas 34 pessoas - entre elas, a esposa da vítima e funcionários do Carrefour, como seguranças e caixas, além de clientes e suspeitos. Nessa quinta-feira, a Justiça autorizou a prorrogação da investigação por mais 15 dias.
Além dos depoimentos coletados, já foram analisadas cerca de 10 horas de imagens de câmeras de segurança fornecidas pelo mercado à polícia. O celular da fiscal Adriana Alves Dutra, 51 anos, também é analisado para saber se foram gravadas imagens do momento das agressões.
A análise preliminar da perícia apontou asfixia como causa provável para a morte de João Alberto. Mas ainda são realizados outros exames. A polícia aguarda ainda alguns laudos periciais, como necropsia, laudo de local do crime e de perícias laboratoriais.