Para montar o quebra-cabeça que envolve a morte de Rafael Mateus Winques, 11 anos, em Planalto, no norte do Rio Grande do Sul, a investigação aguarda uma das peças fundamentais: o resultado das perícias. As análises e laudos do Instituto-Geral de Perícias (IGP) devem responder parte das questões em aberto no caso. Embora Alexandra Dougokenski, 32 anos, tenha confessado o crime, e indicado o local onde estava o corpo do filho, os investigadores suspeitam de que o homicídio não tenha acontecido exatamente da forma descrita pela mãe.
Uma das dúvidas que deve ser elucidada é se o menino realmente ingeriu Diazepam. A mãe alega que exagerou na dose do medicamento e que isso provocou a morte da criança de forma acidental. No entanto, a perícia inicial apontou que o menino foi morto por estrangulamento, o que diverge da versão apresentada por Alexandra — segundo a polícia, havia uma corda no pescoço do garoto.
— É a vinda da perícia que vai nos dar novos rumos. Já temos depoimentos, inclusive dela, que foi interrogada no sábado em Porto Alegre. No depoimento, ela manteve a conduta de dizer que medicou o menino. Que ela acredita que acabou causando a morte em função do uso da medicação. A partir de agora, a gente vai continuar aguardando as perícias para definir os próximos passos — afirmou a chefe da Polícia Civil, Nadine Anflor, em coletiva à imprensa realizada no fim da tarde desta terça-feira (2), em Planalto.
A delegada também foi à garagem onde Rafael foi encontrado morto e na casa da família – as residências ficam a poucos metros uma da outra. A mãe relata que arrastou o corpo do filho, enrolado em um lençol, e depositou em uma caixa de papelão. Alexandra diz que o crime aconteceu na madrugada de 15 de maio. O tempo de morte, no entanto, também deverá ser respondido pela perícia.
Segundo a diretora-geral do IGP, Heloísa Helena Kuser, que também esteve no local do crime nesta terça-feira, os laudos estão em elaboração. A previsão inicial do IGP era de que os trabalhos fossem concluídos em duas semanas. No entanto, conforme a diretora, a orientação é de que as equipes trabalhem com calma, para obter as respostas. Os resultados deverão ser divulgados juntos.
— Estamos trabalhando com muita calma. Perícia é ciência e para esta ciência precisamos de tempo e paciência. São várias perícias que se comunicam. Depende da velocidade de uma, que vai para a outra. Dependendo da qualidade do material, tem de fazer uma, duas ou até três vezes para obter o resultado. Não tem uma data precisa porque a ciência tem o seu tempo — disse na coletiva.
Um dos próximos passos para entender como o assassinato aconteceu é a reconstituição do crime, tecnicamente chamada de reprodução simulada dos fatos. É por meio desse procedimento que a polícia pretende elucidar alguns pontos como, por exemplo, se a mãe teria condições de carregar o corpo do filho sozinha, como alega ter feito, e de que forma fez isso. Outras perícias ainda poderão ser solicitadas ao longo do inquérito. A Polícia Civil pretende usar todo o prazo de 30 dias para a investigação e poderá pedir para prorrogar a conclusão.
Defesa espera laudos
Segundo o criminalista Jean Severo, a defesa de Alexandra também pretende aguardar os resultados das pericias para então tomar alguma nova medida. O advogado disse que a cliente está ciente disso. A presa permanece isolada na Penitenciária Estadual Feminina de Guaíba.
— Como ela tem uma prisão temporária, nesse momento não vamos fazer nenhum pedido de liberdade. Vamos aguardar os laudos do IGP e a reconstituição. Já avisei e ela concorda — disse.
A defesa sustenta que o crime aconteceu de forma acidental e que Alexandra escondeu o corpo do menino porque estava apavorada e com vergonha do outro filho, um adolescente de 17 anos.
O crime
Em 15 de maio, Alexandra comunicou à polícia o desaparecimento do filho Rafael. Ela afirmou que o garoto havia sumido durante a madrugada da casa onde vivia com ela e o irmão adolescente. O caso mobilizou a comunidade em buscas pela criança. No dia 25 de maio, a mulher confessou que ela mesma tinha matado o filho e indicou o local onde estava o corpo – em uma garagem vizinha à residência da família. Ela alega, no entanto, que não tinha intenção. A polícia suspeita desta versão pelo fato dela não ter buscado socorro, e apura o motivo do crime e se houve participação de outras pessoas.
As respostas esperadas da perícia:
Tempo do crime
Uma das dúvidas da polícia é se Rafael foi morto na madrugada de 15 de maio, como alega a mãe. Embora o corpo tenha sido localizado 10 dias após o desaparecimento, não exalava odor forte, o que pode ter contribuído para que não fosse localizado antes. O cadáver estava depositado em uma caixa de papelão, enrolado em lençol e coberto por retalhos de roupas.
Para apontar se o tempo de morte é compatível com o relato de Alexandra, além do laudo do legista, a perícia analisa série de características, que incluem o clima.
— Na região não chove a cerca de 70 dias. Um clima muito seco também interfere. É um somatório de elementos, tanto ambientais quanto biológicos, para chegar a uma conclusão — explica a diretora-geral do IGP.
Causa da morte
A perícia inicial apontou que o menino morreu por asfixia mecânica provocada por estrangulamento — esta causa é diferente da esganadura, que, embora também seja uma forma de asfixia, acontece quando o agressor usa as mãos para pressionar o pescoço da vítima. O estrangulamento se dá quando um objeto como um cinto, uma corda ou uma tira, por exemplo, é usado para circular o pescoço e é tracionado pelas mãos ou mesmo quando é aplicado o golpe conhecido como "mata-leão".
O laudo do legista, que está sendo produzido pelo Posto Médico-Legal de Carazinho, irá indicar a causa do óbito. Uma das suspeitas da polícia é de que o menino possa ter sido dopado com uso de medicamento e depois estrangulado. Já a defesa de Alexandra argumenta que o estrangulamento pode ter acontecido durante o transporte do corpo.
Ingestão de medicamento
Alexandra afirma que medicou Rafael com dois comprimidos de Diazepam porque o menino estava agitado e não queria dormir. O tranquilizante, de uso controlado, só pode ser adquirido com receita médica e é indicado, por exemplo, para casos de ansiedade. Alexandra relatou ter pego o remédio que era usado pelo irmão dela, que reside na casa da mãe, em frente à da família.
Para descobrir se o menino realmente ingeriu o medicamento, está sendo realizada uma análise toxicológica pelo Departamento de Perícias Laboratoriais (DPL) em amostra de sangue coletada do corpo do garoto.
Como aconteceu
A reprodução simulada dos fatos, popularmente conhecida como reconstituição, é uma das etapas essenciais para chegar a essas respostas. A previsão é de que seja realizada em cerca de duas semanas. No entanto, ainda não há dia agendado, conforme o IGP. Diversos fatores vão influenciar na escolha desta data, como a temperatura e clima.
O objetivo é tentar reproduzir de forma mais aproximada possível as condições da madrugada em que a mãe afirma ter acontecido o crime. A presa será levada ao local para que demonstre como agiu. Uma das dúvidas da investigação é se a mulher tinha capacidade de carregar o corpo do filho sozinha, como afirma ter feito. Após ser realizada esta etapa no local, ainda será preciso elaborar laudo com as constatações obtidas a partir da reprodução. Essa perícia é realizada pelo Departamento de Criminalística do IGP.
Outras análises são importantes para entender o crime, como a do que foi coletado na casa da família e em um veículo, por meio do uso de luminol — substância que permite localizar sangue. Essas amostras serão comparadas em laboratório com o DNA do menino. O laudo da análise do local do crime, em produção pelo Posto de Criminalística de Passo Fundo, também auxiliará a entender como o homicídio aconteceu.