Enquanto cruza pelo Largo Glênio Peres, junto ao Mercado Público, no Centro Histórico, Karen Machado, 29 anos, leva a mochila em frente ao corpo. Numa das regiões mais movimentadas de Porto Alegre, a atendente entrelaça os braços numa tentativa de proteger os bens que carrega. É a estratégia usada por quem já foi alvo de ladrões. Em média, 60 pedestres são assaltados por dia na Capital — num total de 21.871 casos. Os dados referentes ao ano de 2019 foram obtidos via Lei de Acesso à Informação.
— Procuro me manter atenta e não deixar o celular à mostra. Mas não tem o que fazer. Ando muito e estudo à noite — relata a atendente.
O Centro Histórico onde Karen foi ouvida pela reportagem é o bairro com maior número de assaltos a pedestres. No ano passado, foram 2.605 registros na região. O número, embora expressivo, já foi bem maior. Em 2018, foram 4.162 notificações de roubos desse tipo. A redução de 37% representa na prática, em média, quatro assaltos a menos por dia — de 11 para sete.
O segundo bairro com maior número de casos é o Rubem Berta, na Zona Norte. Nessa região, há cerca de dois anos a atendente foi assaltada logo após sair de casa. Ela pretendia pegar o ônibus, quando foi atacada por dois homens armados. Os ladrões saltaram de um veículo e levaram a mochila que a jovem carregava com todos os pertences — motivo pelo qual agora Karen tem atenção redobrada.
— A gente fica com medo — diz.
Assim como ela, o mecânico aposentado Adão Mendes, 64 anos, também tenta se prevenir como pode. Morador de Gravataí, quando precisa ir ao centro da Capital, opta por vestir calça com bolsos mais fundos, em que possa manter a carteira segura. Também evita deixar objetos de valor visíveis. O administrador Laércio Negreiros Paim recebeu no aniversário de 65 anos a mochila que carrega junto ao peito.
— Qualquer lugar pouco iluminado após as 18h é um perigo. Tem de estar sempre olhando para os lados — descreve.
Estratégias
Em comparação a 2018, no ano passado houve redução de 5,3% no número de assaltos a pedestres na Capital. Em 2019, foram 1.230 casos a menos do que no ano anterior. Mas, com incidência de casos ainda elevada, a aposta para tentar melhorar esse indicador passa por ações integradas, combate à receptação de aparelhos, mapeamento de áreas com mais notificações e troca de informações entre autoridades de segurança.
Desde janeiro de 2019, a Polícia Civil foca no cruzamento de dados dentro da própria corporação. Os casos são registrados de acordo com o perímetro de atendimento de cada delegacia. Para integrar as investigações, as 20 delegacias distritais foram divididas em quatro áreas: Norte, Leste, Centro e Sul. Os policiais de cada uma das regiões passaram a realizar reuniões e compartilhar as apurações. Com isso, o mesmo assaltante passou a ser identificado agindo em diferentes locais.
— Às vezes, ele comete o crime de um lado da rua, vem na outra calçada, assalta de novo e ali já é área de outra delegacia. Por um roubo de celular, é difícil conseguir manter alguém preso. Mas se reunirmos 20, 30 casos é outra coisa. O ladrão de pedestre muitas vezes vive disso. É contumaz. Com esse trabalho integrado, fazemos mutirão para fechar os inquéritos e manter ele preso — relata o diretor da Delegacia de Polícia Regional de Porto Alegre, delegado Fernando Soares.
Em 2019, foram realizadas 774 prisões por essas delegacias — a maioria vinculada a crimes como roubos a pedestres. Na Brigada Militar, o monitoramento dos locais com maior incidência é uma das formas encontradas para tentar evitar a ação de criminosos. Com base em dados, definem-se as áreas mais visadas.
— Conseguimos identificar os locais e os horários de maior risco. Ou seja, adequamos o efetivo no terreno de maneira qualificada — explica o tenente-coronel José Carlos Pacheco Ferreira, chefe interino do Comando de Policiamento da Capital (CPC).
O ladrão de pedestre muitas vezes vive disso. É contumaz. Com esse trabalho integrado, fazemos mutirão para fechar os inquéritos e manter ele preso.
FERNANDO SOARES
Delegado da Polícia Civil
O policiamento montado — PMs a cavalo —, em praças e locais movimentados, também é apontado como estratégia para tentar inibir assaltos. No Centro, alguns locais onde há presença são Voluntários da Pátria e Praça da Alfândega. Da mesma forma, a Guarda Municipal também aposta na integração e mantém pontos fixos, como no Largo Glênio Peres e na Rua dos Andradas. A Operação Mobile, que fiscaliza lojas onde são vendidos celulares, para coibir a receptação, é uma das medidas em que participam BM, Guarda e Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico.
— Onde o guarda está não apenas previne o comércio irregular, como também o tráfico e mesmo os assaltos. Não importa a cor da farda. É um agente do Estado presente no local. O nosso foco de atuação é sempre na prevenção, junto de outros órgãos — afirma o comandante Marcelo Nascimento.
79% dos roubos
Dos 27.692 assaltos registrados em Porto Alegre no ano passado, 79% foram contra pedestres. Os demais são roubos a residências, comércios e transporte coletivo. Os roubos de veículos (4.762 casos em 2019) são divulgados à parte.
Como se proteger
- Ao sair de casa, não leve todos os documentos e cartões. Reúna os que serão necessários. Isso reduz o volume de itens transportados e, em caso de assalto, o transtorno será menor.
- Esteja atento ao seu redor. Uma pessoa distraída é um alvo mais fácil e pode inclusive fazer algum movimento interpretado como reação, se for abordada por ladrões.
- Evite andar sozinho, especialmente à noite, em locais pouco movimentados ou que considera arriscados.
- Se utilizar fones, mantenha o aparelho somente em um ouvido para conseguir perceber os outros sons no seu entorno.
- Bolsas e mochilas devem ser levadas em frente ao corpo e não nas costas. Isso pode inibir a ação do criminoso. Mantenha celulares e outros objetos de valor guardados.
- Se estiver na rua, em local que considera de risco, para utilizar o celular entre em algum estabelecimento como uma loja.
- A saída de agências bancárias pode ser um momento perigoso. Opte, quando possível, por usar terminais dentro de locais fechados: como galerias e shoppings.
- Se perceber que está sendo seguido, altere o caminho. Tente pedir ajuda e se abrigar em algum local que esteja aberto, como estabelecimento comercial.
- Se for vítima de assalto, não reaja. Além do criminoso poder estar armado, em geral assaltantes agem acompanhados.