O caso das duas crianças encontradas esquartejadas, em sacos plásticos azuis e em caixas de papelão, completa dois anos sem respostas. A investigação do crime teve reviravoltas. Suspeitos de envolvimento foram presos, durante as férias do delegado titular, como sendo os responsáveis por um ritual satânico, no qual as crianças teriam sido sacrificadas. Depois, a investigação voltou à estaca zero.
Relembre, em oito pontos, o passo a passo do caso:
1 - Os corpos
4 de setembro de 2017
Um catador recolhia materiais recicláveis na Rua Porto das Tranqueiras, estrada de chão que costuma ser usada como depósito de lixo, quando deparou com um tronco humano em um saco plástico azul. A poucos metros, dentro de duas caixas de papelão, embalados em sacos idênticos, estavam outras partes de dois cadáveres. Duas semanas após a localização dos corpos, novas partes foram localizadas também em sacos plásticos, a cerca de 500 metros do primeiro local. As cabeças não foram encontradas. A polícia acreditava que as vítimas eram uma mulher e uma criança.
2 - Duas crianças
7 de setembro de 2017
O Instituto-Geral de Perícias (IGP) apontou que os restos mortais eram, na verdade, de duas crianças — um menino, com idade entre oito e nove anos, e uma menina, com idade entre 10 e 12 anos. Não significa que essa seja a idade exata. Não foi possível identificá-los pelas digitais. A garota tinha unhas pintadas de rosa e o garoto pedaços de roupas que podem ser de uma camiseta vermelha. A pele era branca, mas estava bronzeada de sol.
3 - Parentesco
28 de setembro de 2017
Um exame de DNA apontou que os dois têm material genético compatível pelo lado materno. Podem ser irmãos, por parte de mãe, com pais diferentes. Mas também podem ser primos ou tia e sobrinho, por exemplo. A investigação confirma que as caixas de papelão nas quais as partes dos corpos das crianças foram armazenadas eram de um produto de limpeza fabricado por uma empresa de Pernambuco e comercializado apenas até o Estado de São Paulo.
4 - Sem parentes e uso de álcool
4 de outubro
Um mês após a localização dos corpos, a polícia afirmou que nenhum familiar havia procurado a polícia. A investigação passa a suspeitar que a mãe das crianças também pudesse estar morta. A perícia revela que no corpo do menino havia 15 decigramas de álcool por litro de sangue, o que indica que pode ter sido embriagado antes do crime. No da garota, não foi possível confirmar a presença de álcool. O delegado Rogério Baggio citou pela primeira vez ritual satânico como uma das hipóteses investigadas.
5 - Ritual satânico
27 de dezembro de 2017
Durante as férias do delegado Baggio, com a investigação sobre o comando do delegado Moacir Fermino, o caso toma outro rumo. A polícia prende o líder de um templo, em Gravataí, um morador de Novo Hamburgo, apontado como um dos que encomendou ritual e o filhe dele. No início de janeiro, outro homem é preso. Outros dois estão foragidos. Todos seriam inocentados na sequência.
6 - Revelação divina
8 de janeiro de 2018
O delegado Fermino afirma, durante coletiva, que as sete pessoas, quatro delas presas até então, participaram de ritual satânico. Divulga os nomes de outros três considerados foragidos. Delegado diz que empresários pagaram R$ 25 mil ao bruxo para realizar ritual. Ele reafirma ainda que as crianças eram argentinas e teriam sido trocadas por um caminhão roubado. Ele diz que teve uma "revelação divina" durante a investigação. A coletiva conturbada gera polêmica ao atribuir a Deus a solução do caso e uma reunião emergencial da chefia da Policia Civil é convocada para analisar o caso.
7 - Estaca zero
7 de fevereiro de 2018
A Polícia Civil informa que o depoimento de uma testemunha levou a uma reviravolta no caso. Segundo o delegado Baggio a apuração do caso "voltou à estaca zero". Durante uma acareação entre duas testemunhas uma delas contou que foi coagida e mentiu sobre a realização do ritual pelas pessoas presas. Uma pessoa foi presa por ter prestado falso testemunho. Após pedido da própria Polícia Civil, a Justiça manda soltar os cinco suspeitos presos e revoga as prisões preventivas dos dois que ainda eram considerados foragidos.
8 - Delegado vira réu
Março de 2018
A Corregedoria da Polícia Civil (Cogepol) solicitou à Justiça o afastamento do delegado Moacir Fermino. No mês de março o delegado seria indiciado pela Cogepol, denunciado pelo Ministério Público e se tornaria réu por falsidade documental e corrupção de testemunhas. Além dele, um policial e um informante também respondem ao processo, que está fase de realização de audiências. Fermino foi afastado de suas funções e está aposentado. Além do delegado, o policial civil Marcelo Cassanta e um informante, Paulo Sérgio Lehmen, viraram réus por falsidade ideológica e corrupção de testemunhas. O caso segue na Justiça.
Contrapontos
O advogado José Cláudio de Lima da Silva, responsável pela defesa de Moacir Fermino, afirmou que só se manifestará nos autos do processo. Paulo Lutero Natividade Gall, advogado que defende Marcelo Cassanta, também informou que o processo ainda está na fase de instrução, com testemunhas sendo ouvidas, e não se manifestará no momento. Não há audiência agendada.
A Defensoria Pública, responsável pela defesa de Paulo Sérgio Lehmen, afirmou que o "processo aguarda para encerramento da instrução com a oitiva de duas testemunhas e o interrogatório dos réus, mas ainda não há data para a solenidade".