Em meio à redução de quase todos os indicadores de violência no ano que se encerra, como latrocínios, assaltos em geral e roubos de veículos, pelo menos cinco casos ficam sem solução e deixam como herança a investigação às delegacias da Polícia Civil. Entre os crimes marcantes que aconteceram em 2018 e que ainda não foram totalmente esclarecidos, há dois envolvendo crianças. Em um deles, um bebê foi assassinado com os pais em um ataque a tiros de fuzil.
No outro, uma menina de nove anos acabou localizada morta horas após ter sido sequestrada na frente de sua casa, no bairro Rubem Berta.
Também fica para 2019, o esclarecimento da morte de um policial civil durante operação que visava a prisão de traficante, em um sítio, antes do amanhecer. O agente foi morto com tiro de fuzil, e ainda persiste a dúvida se o disparo veio de algum criminoso, ou se foi o chamado “fogo amigo”, com outro policial atingindo acidentalmente o colega.
Por fim, há dois casos de desaparecimentos no interior do Estado. Um deles envolve uma contadora de Boa Vista das Missões, no Noroeste. Para Polícia Civil e Ministério Público, o marido dela – um vereador do município – está por trás do crime e teria encomendado a morte da mulher. O corpo até hoje não apareceu.
O outro sumiço também é intrigante: um gerente do banco Sicredi de Anta Gorda, no Vale do Taquari, não é visto desde a metade de novembro. Não há pistas sobre o paradeiro do bancário.
— O grande problema dos desaparecimentos é que estão no limbo: não têm corpo, que é a materialidade, nem pedido de resgate – avalia, de forma genérica o delegado Gabriel Bicca, diretor de investigações do Departamento de Homicídios.
O policial ainda lembra que já houve casos em que supostas vítimas “sumiram” por vontade própria:
— Teve um homem dado por desaparecido pela família e, anos depois, foi encontrado em São Paulo, usando o mesmo nome, mas vivendo em meio a um novo círculo de pessoas. Agora, quando pessoas são retiradas de casa e depois não se tem mais notícias delas, trabalhamos com a possibilidade de que estejam mortas.
O ano termina também com redução no número de ocorrências de homicídios. Nesse indicador foi observado alto índice de resoluções de casos.
— Mantemos média de 70% de inquéritos remetidos em relação às ocorrências. Algumas delegacias ficam um pouco abaixo, com uns 65%, e outras chegam a 80% – conclui Bicca.
1 - Contadora desaparecida
Na manhã do dia 30 de janeiro, a contadora Sandra Mara Lovis Trentin, 49 anos, saiu do escritório que mantinha em sociedade com o marido, Paulo Ivan Baptista Landfeldt, em Boa Vista das Missões, para ir até Palmeira das Missões, a cerca de 30 quilômetros. Oficialmente, é a última vez em que foi vista. Sua caminhonete Ranger foi localizada abandonada na cidade vizinha.
Para o Ministério Público, a contadora foi raptada e morta por Ismael Bonetto, 22 anos, a mando de Landfeldt que, à época, era o presidente da Câmara de Vereadores de Boa Vista das Missões. O MP acusou Landfeldt de ter mandado matar a mulher por querer o fim do casamento sem partilha do patrimônio e sem a disputa pela guarda dos filhos. O casal estaria vivendo um relacionamento conturbado. O corpo da contadora, até agora, não foi localizado.
Bonetto e Landfelt viraram réus – o primeiro segue no sistema prisional, e o segundo responde em liberdade.
2 - Morte em meio a operação
Mais de 20 policiais participavam da operação que tinha como objetivo a prisão do foragido Valmir Ramos, o Bilinha, em um sítio de Pareci Novo, no Vale do Caí, no dia 2 de maio. A ofensiva acabou abortada pela morte do inspetor Leandro de Oliveira Lopes, 30 anos. O policial foi atingido por um tiro de fuzil em meio à ação.
Uma das possibilidades investigadas é a de Lopes ter sido atingido por outro policial. Reforça essa hipótese o resultado da perícia no projétil que matou o inspetor: era munição de fuzil calibre 5.56, tipo de arma que estava sendo usada por colegas de Lopes.
O Instituto-Geral de Perícias (IGP) e a Polícia Civil chegaram a realizar uma reconstituição da morte do inspetor para esclarecer as circunstâncias. Ainda assim, até agora, não houve conclusão sobre a autoria do disparo.
Lopes era casado e deixou uma filha de sete meses. Ele havia passado no concurso público para Polícia Civil em 2013, mas só foi chamado para assumir o cargo em abril de 2017.
3 - 40 tiros após festa de um ano
Na saída da festa de seu primeiro aniversário, antes de aprender a caminhar, em 23 de setembro, Alice Beatriz foi cruelmente assassinada junto a seus pais, Sabrine Panes Rodrigues, 24 anos, e Douglas Araújo da Silva, 29. O Ford Ka em que estavam foi perseguido por um automóvel do mesmo modelo e por uma Ecosport no Jardim Leopoldina, na zona norte de Porto Alegre. Desses carros, partiram tiros de fuzis.
A ordem para o ataque teria vindo do Presídio Central de Porto Alegre. Conforme o delegado Cassiano Cabral, da 3ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa, quem ordenou a execução tinha como alvo o pai da menina, que havia sido condenado a 10 anos de prisão por tráfico de drogas. O homem seria ligado a uma “coalizão” de quadrilhas que se reuniu contra uma das maiores facções da Região Metropolitana. Os mandantes seriam desta organização criminosa e suspeitariam que Silva estava envolvido no homicídio de um comparsa deles.
A Polícia Civil garante já ter obtido informações que devem levar aos autores, mas que, por questões estratégicas, ainda não divulga.
4 - Sequestro e assassinato
A menina Eduarda Herrera de Melo, nove anos, desapareceu na noite de 21 de outubro, quando brincava de roller com uma vizinha e uma irmão, na frente de casa, no bairro Rubem Berta, na zona norte de Porto Alegre. Na manhã seguinte, seu corpo foi encontrado às margens da RS-118, em Alvorada.
O inquérito policial sobre o caso ultrapassa 500 páginas e segue em segredo de Justiça.
No dia do crime, o subchefe da Polícia Civil, Leonel Carivalli, revelou que a menina morreu por afogamento. O atestado de óbito aponta que ela foi assassinada por volta de 0h30min – cerca de quatro horas após o rapto.
O assassinato de Eduarda provocou uma série de boatos sobre sequestro de crianças, principalmente na zona norte de Porto Alegre. Houve protestos em frente a delegacias e queima de pneus em vias.
O caso está sendo investigado pelo Departamento Estadual da Criança e do Adolescente (Deca). Até agora, ninguém foi preso.
5 - Mistério em Anta Gorda
Em um dos mistérios que desafiaram a polícia em 2018, o gerente da agência do banco Sicredi de Anta Gorda, no Vale do Taquari, Jacir Potrich, 55 anos, desapareceu no dia 13 de novembro. Às 19h7min, câmeras registraram a chegada dele ao condomínio onde mora com a mulher e um sobrinho dela de 24 anos.
Potrich entrou em casa e passou pela porta dos fundos com um balde, no qual estariam peixes fisgados no açude de um amigo, e um copo. A última imagem mostra caminhando em direção ao quiosque da piscina.
A mulher do gerente estava em Passo Fundo, visitando o filho do casal. O sobrinho também não estava em casa chegou cerca de uma hora depois do tio. Nos dias seguintes ao desaparecimento, Polícia Civil, BM, bombeiros e voluntários da comunidade realizaram buscas por matagais e pela área rural, utilizando cães farejadores. Um açude chegou a ser esvaziado, mas não foram encontradas pistas.