Chacinas, tiroteios e mortes de envolvidos com o crime e de inocentes estão longe de deixar de fazer parte da realidade dos maiores municípios gaúchos. Porém, a violência parece ter perdido intensidade nos últimos meses. De janeiro a outubro deste ano, os homicídios registraram queda de 28% nas 10 maiores cidades da Grande Porto Alegre — incluindo a capital gaúcha —, na comparação com o mesmo período do ano passado. Foram 384 assassinatos a menos nesses municípios, não atingindo o patamar de mil mortes para a época — foram 975 casos.
Em uma análise ampla, considerando todo o Estado, a queda foi de 22%, com redução dos homicídios em 147 municípios, segundo dados da Secretaria da Segurança Pública (SSP). Nessas cidades, moram mais de 7 milhões de pessoas, o que corresponde a 65% da população gaúcha.
Em outros 88 municípios houve aumento nos assassinatos. Nesta lista estão Caxias do Sul e Rio Grande, que apresentaram aumento de um caso na comparação. Em 262 municípios, a situação é estável.
A que se deve a queda nos assassinatos?
Conforme o diretor de investigações do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), delegado Gabriel Bicca, a situação reflete o trabalho dividido em quatro frentes: prisão de assassinos, intensificação do policiamento ostensivo pela Brigada Militar, combate ao tráfico de drogas e combate à lavagem de dinheiro, com o sequestro de bens das facções. Sem mão de obra e recursos, os grupos criminosos acabaram enfraquecidos ou tiveram de repensar ações.
Segundo o delegado, antes, as facções estavam preocupadas não apenas em disputar territórios, mas aniquilar os rivais. Agora, com perda de capital e de mão de obra, acabaram voltando-se para questões internas, para dar continuidade à venda do tráfico — maior causa dos homicídios em todo o Estado.
— Eles pensam: "Não vou deixar de matar, mas tenho tanta coisa para me preocupar, preciso manter a boca de fumo" — analisa o delegado.
O isolamento de 27 criminosos apontados como líderes das facções, com suas transferências para prisões federais em julho de 2017, foi, para o secretário da Segurança Pública, Cezar Schirmer, o ponto crucial para a redução dos homicídios no Estado.
— O ponto de inflexão foi na Operação Pulso Firme, mas não podemos também atribuir a um único fator a queda nos indicadores criminais — diz.
Segundo o secretário, outras medidas, como o aumento dos efetivos das forças policiais, parcerias com os municípios, compra de armas e viaturas e a criação da Força Gaúcha, também foram decisivas nas mudanças.
Para o cientista social Charles Kieling, a situação está relacionada à migração dos criminosos do tráfico de drogas para outros mercados e até demonstra o avanço do Primeiro Comando da Capital (PCC) em solo gaúcho. Em setembro deste ano, relatório do Ministério Público paulista apontou a existência de 700 filiados ao PCC no Rio Grande do Sul.
Segundo Kieling, a organização criminosa paulista faz alianças com bandidos de outros Estados e, de quebra, os locais recebem aporte financeiro.
— Eles vão chegando, estabelecendo alianças. Há todo um processo político — entende Kieling.
Com uma única facção ganhando terreno, os confrontos entre rivais acabam perdendo força. Por consequência, os homicídios diminuem. Segundo o pesquisador, a transferência de presos para penitenciárias federais — onde estão os principais líderes do PCC — pode ter aproximado criminosos gaúchos desta facção, intensificando o processo de interação.
Produção: Rossana Ruschel