
Recolhido ao Presídio Central de Porto Alegre, um criminoso identificado pela Polícia Civil e pelo Ministério Público como um dos líderes de uma facção da Capital se tornou alvo de investigação de lavagem de dinheiro ao comprar uma caminhonete blindada e tentar legalizá-la junto à polícia.
Além disso, seria de André da Silva Dutra, o Gordo Dé, uma casa de luxo situada em Cachoeirinha. No amplo imóvel, com piscina, a mulher do criminoso cumpre prisão domiciliar. Recentemente, o Ministério Público denunciou o casal e outras seis pessoas por organização criminosa e lavagem de dinheiro.
Conforme investigação, Gordo Dé financiou a compra de uma Captiva blindada. O detalhe é que para usar um carro blindado é necessário a emissão de um alvará feito pela Polícia Civil, que faz o controle e dá a devida autorização para uso.
Para tentar despistar as autoridades, conforme a investigação, o criminoso mandou registrar a Captiva em nome de uma "laranja" (pessoa que empresta o nome para constar como proprietária de bens), mulher de um detento. Quando a Divisão de Armas, Munições e Explosivos (Dame) da Polícia Civil fez consulta à identidade da suposta dona do carro e detectou que ela constava no sistema como visitante de um preso. Após investigação, foi confirmada a relação da mulher com um detento.
A partir disso, policiais passaram a fazer campana no presídio para verificar se a mulher, suposta dona, usava a Captiva. Flagraram outra mulher chegando com o blindado em mais de uma oportunidade. A investigação revelou que era Veridiana Araújo Antunes, casada com Gordo Dé, recolhido ao Presídio Central, de onde comandaria o tráfico e outras ações da facção. Com isso, foi desencadeada a investigação por lavagem de dinheiro.
Até o momento, a polícia identificou duas casas avaliadas em cerca de R$ 1 milhão as duas e que teriam sido adquiridas com dinheiro do tráfico, além da Captiva, uma Santa Fé e um Gol. Ao deflagrar operação no ano passado, Veridiana e a mulher que tinham a Captiva em seu nome foram presas. Mas a polícia não localizou o blindado. A caminhonete já havia sido vendida a outro criminoso. Foi exigida a localização do veículo. Veridiana teria falado com Gordo Dé e, dias depois, a polícia foi informada de que o blindado estava estacionado em um shopping com as chaves sobre uma das rodas. O carro foi apreendido.
— A Delegacia de Lavagem tem trabalhado em bons casos e conseguiu coletar provas suficientes do patrimônio dessa célula criminosa e fez descoberta de patrimônio significativo deste líder. A intenção é perseguir o que faz com que a facção siga praticando crimes para retirar a fonte de economia — explica o promotor Marcelo Tubino, da Promotoria Especializada no Combate aos Crimes de Lavagem de Dinheiro e Organização Criminosa.
A mulher de Gordo Dé tem preventiva decretada ano passado, mas recorreu à Justiça e obteve o direito de ficar em prisão domiciliar pelos crimes de lavagem de dinheiro e organização criminosa. O principal argumento foi a necessidade de prestar cuidados de saúde a um filho que passa por tratamento médico, além de ter outros filhos pequenos e de não ter antecedentes criminais. Ela cumpre a medida na casa de luxo que, conforme a polícia, foi adquirida pela facção em 2015, em Cachoeirinha.
Tubino discorda do benefício:
— Essas pessoas, embora do sexo feminino e sem atuação violenta, são elas que sustentam as demais atividades criminosas da célula mais violenta. Elas cuidam do capital, do lucro, conservam o patrimônio, conservam carros, vendem carros e imóveis, eventualmente fazem depósitos, enfim, elas contribuem de forma grave para a expansão da criminalidade e da violência no Estado.

A denúncia de oito pessoas da facção por lavagem de dinheiro e organização criminosa é resultado do trabalho conjunto do MP com a Delegacia de Repressão ao Crime de Lavagem de Dinheiro do Gabinete de Inteligência e Assuntos Estratégicos da polícia. O caso tramita na Justiça de Cachoeirinha.
A polícia identificou veículos e imóveis adquiridos pela quadrilha, mas mantidos em nome de terceiros, que também estão sendo denunciados pelo MP por participar da organização criminosa. Parte dos bens já está sequestrada e o MP solicitou à Justiça a apreensão também em relação a outros veículos, além de autorização para que a polícia, que carece de recursos para o trabalho, possa usar esses carros. A investigação prossegue visando a identificar mais imóveis comprados pelo grupo.
— Há um dito popular de que o crime está organizado e o Estado não. Percebemos na nossa atividade criminal que tínhamos preocupação de atacar o crime que a organização praticava — seja homicidio, roubo, sequestro, latrocínio — e não havia preocupação coordenada em relação ao lucro que essas organizações vão acumulando. Com este olhar, principalmente olhando para nossa realidade prisional, vendo que a a simples prisão e condenação não altera a realidade das facções, passamos a ter esse trabalho mais focado no lucro, a partir de uma articulação com as forças da segurança pública, a Polícia Civil — diz o promotor Luciano Vaccaro, coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal e de Segurança Pública.
Quem é André da Silva Dutra, o Gordo Dé, segundo a apuração

Conforme a polícia e o MP, Gordo Dé atuava predominantemente na zona norte de Porto Alegre e na Vila Timbaúva, no bairro Mario Quintana. Comandava o tráfico de drogas de dentro do Presídio Central de Porto Alegre, onde é "Plantão" (e considerado "Patrão") da 2ª galeria localizada no pavilhão D, local destinado aos presos pertencentes à facção Os Abertos.
É, segundo a polícia, protagonista de homicídios praticados em Porto Alegre e Região Metropolitana, sendo o autor intelectual de crimes, tendo determinado execuções em nome da proteção de seus pontos de venda de entorpecentes e visando a assumir controle de outras "bocas de fumo".
Contraponto
Até a publicação desta reportagem, Aline Amaral, advogada de André da Silva Dutra e de Veridiana Araújo Antunes, não havia se manifestado.