
Para quem convive com gatos, o inverno é um momento difícil, cresce exponencialmente o poder mental felino. Gatos necessitam de calor, para isso buscam qualquer maneira que os deixe aquecidos. Nessa estação, eles aderem ao nosso corpo em busca de aconchego. É aí que mora o perigo.
Quando eles conseguem um encaixe no nosso corpo que os aqueça, emitem raios mentais para desestimular qualquer movimento humano. Claro, não somos completamente impotentes, podemos vencer a artimanha hipnótica dos gatos, o problema é que essa reação contra o poder felino requer mobilizar uma usina de Itaipu.
Tendo um gato em casa, que esteja dormindo em cima de alguém, sair das cobertas é subir o Himalaia. As cobertas parecem feitas de madeira, não se movem, o colchão exerce uma gravidade semelhante à do planeta Júpiter.
Quem não tem gato, e mesmo assim sofre desse problema, talvez seja porque o alcance dos raios da imobilidade seja como um sinal de internet, ultrapassa andares e paredes. Um par de gatos pode contaminar, além do seu piso, um andar para cima e outro pra baixo.
Como tutor de duas gatas, peço perdão aos meus vizinhos pelo incômodo desse indesejado efeito colateral chamado: Síndrome da Paralisia Felina Transitória ou, no jargão médico, SPFT (decore a sigla para justificar atrasos na escola ou no trabalho). Infelizmente sou dependente de gatos, necessito do efeito antidepressivo que eles trazem. Os bichanos são sachês de ternura e quietude.
Gatos são zen budistas peludos, mestres na arte de descomplicar. Numa era de burnout e hiperconexão, eles oferecem um tratado vivo sobre como habitar o mundo com mais graça e menos desespero. Enquanto nos afogamos em metas tóxicas, o gato não faz nada com profunda excelência. Eles fazem do tédio um luxo e da preguiça uma virtude.
Quando o inverno transforma nossos gatos em pequenos tiranos do aconchego, resta-nos aceitar: ser refém de um felino pode ser um começo de cura da nossa insana agitação. Troque a rede social por um gato e você não vai se arrepender.
Mais do que conformado, sou entusiasta. Se os gatos nos aprisionam com sua hipnose térmica, que assim seja. Melhor ser escravo do ronronar do que do relógio.