Uma vez ou outra todos já sentimos tontura, nem que seja de maneira leve. É um sintoma tão comum que tem um dia dedicado ao debate sobre o tema. O Dia Nacional da Tontura, celebrado em 22 de abril, tem como objetivo incentivar o correto diagnóstico e tratamento desta manifestação. De maneira ampla, a tontura é um termo médico genérico que define as alterações da percepção espacial. Quando tontos, os indivíduos têm dificuldades de se perceber no ambiente, ou seja, podem acontecer ilusões de movimento ou dificuldades para se localizar e se entender dentro de um espaço.
De acordo com o otorrinolaringologista e membro do departamento de Otoneurologia da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial (ABORL-CCF) Lucas Mangia, a tontura é uma percepção individual cuja descrição sofre interferências culturais, regionais e pessoais. Por definição, a tontura é um sintoma subjetivo e não tem um parâmetro norteador objetivo para o diagnóstico como a febre, por exemplo.
— A tontura é um problema de saúde pública. É uma queixa muito comum entre a população em geral e quem sofre com tontura tem uma piora na qualidade de vida. Em alguns casos, pode, ainda, indicar doenças sérias. Por isso a importância de trazer o assunto para o debate entre médicos e entre a sociedade com uma data dessas — explica Mangia, que também é professor do curso de Medicina da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Causas da tontura
Para entender o que leva à tontura é preciso entender primeiro o que garante a percepção espacial. De acordo com Mangia, ela é dada pelo conjunto de informações sensoriais que convergem no sistema nervoso central e são processadas pelo cérebro, gerando uma noção perceptual contínua, normalmente inconsciente em situações habituais. Esse conjunto de sistemas funciona como uma grande engrenagem e qualquer alteração ou falha nela, que permite a localização e o entendimento dentro do ambiente, pode gerar tontura.
Essa engrenagem de percepção inclui, principalmente, o sistema vestibular ou labirinto (que são sensores de movimento localizados internamente nos ouvidos) e é complementado pelos sistemas visual, auditivo e proprioceptivo (as informações geradas nas articulações, músculos e tendões). Tudo isso é integrado no sistema nervoso central e o resultado final que o cérebro nos devolve é a percepção espacial.
— Alterações no funcionamento desses diversos componentes podem gerar tontura, por isso é algo complexo. Muitas vezes é multifatorial e pode envolver diretamente o labirinto, que é famoso por gerar tontura, ou indiretamente. Por exemplo, alterações no sangue podem prejudicar o funcionamento do labirinto e isso levar à tontura — completa o otorrinolaringologista.
Muitas vezes o diagnóstico é um grande trabalho de detetive para o médico avaliar onde está o problema. Segundo Mangia, o termo labirintite, por exemplo, é usado de forma leiga para quase todo o processo que leva à tontura e essa generalização pode trazer alguns problemas pois priva o paciente do diagnóstico e tratamento corretos.
— A labirintite traduz uma doença específica do labirinto. Ela é uma inflamação aguda da parte do ouvido que contém os receptores responsáveis pelas informações vestibulares. Porém, hoje em dia essas inflamações são raras. Então a labirintite de fato existe, mas é rara — completa.
As causas mais frequentes de tonturas agudas e recorrentes ou crônicas são outras alterações originadas no labirinto, as chamadas labirintopatias.
Diagnóstico e tratamento
Pelo fato de não ser uma doença propriamente dita e sim um sintoma subjetivo de cada pessoa, o diagnóstico de quadros de tontura pode ser complexo. Existem diversos outros problemas por trás das queixas. Portanto, o diagnóstico passa primeiramente pela descrição do paciente das características e especificidades que sente quando está tonto.
A partir disso, o médico investiga o histórico da pessoa e os seus sintomas associados, determinando hipóteses possíveis de origem do problema. Relacionadas a labirintopatia, alguns possíveis diagnósticos são a neurite vestibular, doença de Méniere e doença dos cristais. Mas outras hipóteses, como o uso de alguns medicamentos, a enxaqueca e a hipotensão postural, que é a queda da pressão arterial que acontece quando se muda a posição de sentada ou deitada para em pé, podem ser diagnósticos atrelados à tontura.
Existem diferentes tipos de tratamentos para pacientes com o sintoma, a maioria deles multidisciplinar. Alguns podem ser a base de medicações e em outros casos, mais raros, a cirurgia pode ser o mais recomendado. O tratamento também pode incluir com frequência atendimentos com fonoaudiólogo e fisioterapeuta.
Sintomas associados
Náusea, enjoos, suor excessivo e frio e palidez são alguns sintomas mais recorrentes em pacientes com tontura. No entanto, perda de audição, zumbidos no ouvido, dores de cabeça ou no pescoço também são quixas que podem estar relacionadas com a tontura.
— O médico examinando um paciente com tontura que está ocorrendo naquele momento pode ter indícios claros de que o paciente está sofrendo com essas alterações muito pronunciadas da percepção espacial. Mas antes de tudo a maioria dos pacientes vão relatar sintomas perceptuais muito singulares e a gente vai se apoiar nesse relato para considerar a queixa. Em boa parte dos casos não vão ter sinais objetivos e claros de que o paciente está tonto — detalha Mangia.
Hora de procurar um médico
Ter tontura não é normal. Muito pelo contrário, é um indicativo de que algo no organismo não está funcionando bem. Casos de tontura aguda que não se resolvem ou que estão acontecendo muitas vezes levando ao prejuízo da qualidade de vida devem ser avaliados por um médico para identificar a causa. No entanto, Mangia ressalta que qualquer tontura, mesmo que isolada, merece atenção pois podem ser indicadores de que algo não está bem: quadros de desidratação, má qualidade de sono e ansiedade, por exemplo, podem manifestar-se dessa maneira.
Estou tonto, e agora?
Quem nunca levantou rápido e se sentiu tonto, não é mesmo? Neste caso em específico, isso acontece pela perda temporária de irrigação sanguínea na cabeça prejudicando o funcionamento do labirinto. Já nos casos de pessoas que ficam tontas em ônibus ou no banco de trás do carro, o motivo da tontura pode ser pela situação de conflito entre as informações sensoriais .
Como a tontura afeta a noção da sua percepção no espaço o risco de queda é muito grande. Se você estiver se sentindo tonto, procure permanecer em um local confortável e onde possa se apoiar. O especialista orienta também que a pessoa mantenha a tranquilidade e se concentre na respiração para diminuir o desconforto. Se for possível, deite e aguarde a crise passar.
Nos casos em que a sensação persiste ou volta a se repetir de maneira mais séria procure o atendimento médico. De maneira geral, o controle do estresse e de comorbidades, como diabetes, colesterol e pressão alta, atrelado a uma boa alimentação, prática de atividades físicas e uma boa qualidade de sono podem ajudar a evitar a reduzir o número de ocorrências de tontura.
— A tontura é um sintoma muito frequente e impactante, mas infelizmente é muito negligenciado. As pessoas acabam sofrendo com esse sintoma sem diagnóstico e pulando de tratamento em tratamento. A tontura é coisa séria e precisa ser abordada de maneira correta — finaliza o médico.
Produção: Rochane Carvalho