Popularizada pelas convulsões, a epilepsia é uma doença que causa movimentos involuntários e afeta a consciência e percepção. As crises decorrem de uma atividade elétrica anormal originada no cérebro.
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) estimam que 50 milhões de pessoas sejam afetadas pela doença no mundo. No Brasil, cerca de 2% da população é acometida pela epilepsia, conforme dados do Ministério da Saúde, o que representaria mais de dois milhões de brasileiros.
Considerada uma doença cerebral, a epilepsia tem como origem lesões cerebrais que podem desencadear uma atividade elétrica incomum no cérebro por alguns segundos ou minutos. Neste período, há descarga de sinais de eletricidade “incorretos”, que podem ficar presos a região de origem ou se espalhar por outros hemisférios.
Apesar da convulsão ser a manifestação mais conhecida e retratada de crises epiléticas, William Martins, neurologista especializado em epilepsia do Hospital São Lucas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e professor de Medicina da ULBRA, alerta que há outras formas da doença se manifestar.
— Podemos ter crises que afetam a consciência, que a pessoa fica só um pouco fora do ar, mexendo a boca, com movimentos involuntários dos braços e na volta a pessoa não se lembra de nada. São crises que alteram a consciência e percepção, podendo ter alterações motoras e sensitivas também — explica.
Não existe pré-condição ou uma origem determinada para desenvolver epilepsia. Apesar disso, pessoas que sofreram alguma lesão cerebral, como vítimas de Acidente Vascular Cerebral (AVC) ou que sofreram algum trauma durante o parto estão mais suscetíveis a serem acometidas.
— De 5% a 10% das pessoas vão ter uma convulsão e não se trata de epilepsia. Basta ter cérebro, para ter uma convulsão. Por exemplo, um paciente com diabetes usa o medicamento para controlar e baixa o nível de açúcar no sangue, isso pode ocasionar uma convulsão. O fator da epilepsia é se repetir, sem a presença de fatores como baixa do nível de açúcar — conta.
O diagnóstico da epilepsia ocorre quando há repetição da crise. Casos em que a convulsão dura cinco minutos ou mais indicam um estágio avançado da doença, o que indica a necessidade imediata de acompanhamento médico. Apesar de não ser usualmente fatal, há inúmeros riscos durante uma crise:
- Chance de trauma (batida grave) ao cair
- Queimaduras (se estiver próximo do fogo)
- Possibilidade de se chocar com algum objeto ou móvel próximo
- Risco de acidentes ao dirigir veículos
Martins ressalta que pacientes com diagnóstico de epilepsia só tem permissão para dirigir após tratamento de um ano e com a doença controlada, para minimizar riscos mais graves.
Sinais e ação
Em boa parte dos casos, a convulsão é o primeiro sinal perceptível da epilepsia. Antes da crise, o paciente pode ter sensações diferentes no estômago, perda de consciência, movimentos despropositados e momentos de dejavú – sensação de volta ao passado ou de reviver um momento.
— Outros sinais são os choques rápidos, como aqueles de quando estamos dormindo. Também pode haver um pouco de irritabilidade e euforia neste período, mas os sinais variam de acordo com cada caso — diz o especialista.
Durante uma crise de convulsão, existem algumas medidas a serem seguidas. Martins destaca que, se for a primeira vez, é importante observar o tempo de duração para informar ao médico. Ao contrário do que a cultura popular passa, ele não recomenda botar algo na boca da vítima ou “tentar puxar a língua”.
— A primeira coisa é manter a calma, afastar os móveis onde a pessoa possa se bater. Depois, deixe ela de lado e coloque algo para não bater a cabeça no chão. É importante salientar para não tentar retirar a língua da boca para a pessoa não se afogar, isso não existe, as pessoas acabam fazendo isso e se machucando — explica.
Tratamento
O tratamento da epilepsia tem como base remédios que inibem descargas elétricas involuntárias no cérebro. De acordo com o neurologista, em dois terços dos casos tratados adequadamente o paciente não sofre mais com as crises. O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza todo o tratamento e acompanhamento médico necessário desde o diagnóstico da doença.
— Os remédios atuam estabilizando a energia cerebral, estabilizando os neurônios entre excitação e inibição. São altamente efetivos, muitas pessoas conseguem conviver sem as crises — comenta.
Em alguns casos, há necessidade ou possibilidade de intervenção cirúrgica. No Hospital São Lucas, já foram operados mais de 2.500 pacientes, até mesmo de diferentes países, como Bolívia, Chile e Uruguai. O procedimento é realizado para retirar a região afetada pela doença, muitas vezes levando ao controle completo da patologia - às vezes à cura.
— Quando conseguimos identificar o local do cérebro onde ocorrem essas crises, realizamos a cirurgia e retiramos essa parte para estabilizar a doença —
Alguns métodos de neuro-estimulação também auxiliam no controle da doença, como o estimulador do Nervo Vago e novos medicamentos. Martins destaca o uso de canabidiol, que permitiu uma “melhora exponencial” em alguns pacientes tratados por ele.
*Produção: Lucas de Oliveira