O puerpério é um período de grandes adaptações e mudanças na vida das mulheres — e das famílias em geral. As alterações podem ser físicas ou emocionais. Para o período se tornar minimamente mais leve, é preciso que as pacientes estejam cientes da turbulência que as espera. Dessa forma, é possível se preparar para as adversidades que podem surgir. Por definição médica, o puerpério é o tempo que vai desde o nascimento até as seis semanas posteriores ao parto.
De acordo com Adriani Oliveira Galão, professora do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e membro da equipe de puerpério, os cuidados para um pós-parto mais tranquilo começam já no pré-natal.
— Desde do pré-natal a gente pode vir orientando essas pacientes sobre as mudanças no corpo, sobre os desafios da amamentação, sobre como vai ser os primeiros dias em casa com o bebê, como vai ser o retorno ao trabalho, para que tudo seja mais fácil quando ela estiver nesse período pós-parto — detalha Adriani
Para além de monitorar peso, crescimento e desenvolvimento do bebê, o pré-natal é uma etapa importante para manter o cuidado com as mães mesmo antes do nascimento do bebê. Desde essa fase, a equipe médica tenta mapear tudo que pode atrapalhar essa gestação, incluindo as patologias físicas e psicológicas. Por determinação da Organização Mundial da Saúde (OMS) o pré-natal precisa ter pelo menos seis consultas.
— Com as consultas, a paciente tem a oportunidade de conversar várias vezes com sobre isso, ser orientada sobre várias coisas da gravidez, além de fazermos a avaliação adequada do bebê, tentando buscar quem são as pacientes de alto risco — complementa a profissional.
No Hospital de Clínicas, cerca de 20% das mães precisam de atendimento especial no puerpério.
Principais problemas no pós-parto
Todas as pacientes que saem da maternidade precisam estar atentas a quaisquer possíveis anormalidades no seu estado clínico. Um dos pontos para cuidar são alterações no lóquio, que é o sangramento vaginal pós-parto. Nos primeiros instantes depois do nascimento, a característica comum da secreção é ter um aspecto avermelhado bem vivo. Com o passar dos dias, esse corrimento deve ir clareando até se tornar mais esbranquiçado. Após 15 dias, o sangramento deve ser reduzido. Se ocorrer algo diferente, a paciente deve buscar atendimento.
A dor também pode indicar irregularidades no puerpério. Até os primeiros três dias após o nascimento, ela é considerada normal. Após esse período, o ideal é que ela praticamente suma, independentemente se o parto for normal ou cesariana. Se a mãe, ao contrário de se sentir mais confortável, notar uma piora na dor, deve procurar o seu médico. Febre também não é comum.
Segundo a professora do Clínicas, quanto melhor for o estado de saúde da paciente antes da gravidez mais fácil será o retorno ao seu estado pré-gestação. Nesse intervalo de tempo, além das mudanças psicológicas, o corpo passa por diversas alterações fisiológicas — como nas mamas, no volume sanguíneo e no retorno da ovulação.
Depressão e rede de apoio
O processo de nascimento de um bebê por si só já é bastante conturbado. São noites sem dormir, que se somam ao cansaço acumulado do esforço do parto e a preocupação com o bem estar do filho recém-nascido. Portanto, o estresse da mãe é considerado absolutamente normal. Sintomas como irritabilidade, instabilidade emocional e choro sem motivos podem aparecer durante este tempo, assim como surgem ao longo da gestação.
Apesar disso, Adriani destaca que qualquer um desses comportamentos em excesso deve acender um alerta para uma possível depressão pós-parto. Além disso, a família também deve se atentar à falta de vínculo entre mãe e bebê.
— Se eu entro no quarto de uma paciente que eu vou fazer a visita de puerpério e, por exemplo, o bebê está chorando no berço e ela de costas, falando ou mexendo no celular, é suspeito. A gente tem que ficar atento porque isso não é o esperado — conta a médica.
A partir desse primeiro estranhamento, é necessário dar início a uma investigação para descobrir se essa atitude é decorrência do cansaço ou se de fato existe um transtorno psicológico. Porém, além do desinteresse, o extremo oposto também é preocupante. Mães em intensa vigilância com o bebê —quando não dormem por medo de que algo aconteça com o filho, por exemplo — podem estar passando por sofrimento psíquico.
O principal fator de risco para ter um quadro de depressão após o nascimento é já ter passado por uma situação dessas anteriormente. Entretanto, a falta de suporte familiar também pode contribuir com esse quadro clínico. Quanto mais a maternidade for dividida, mais fácil ela fica. E neste sentido, a rede de apoio, que pode ser composta por qualquer pessoa, companheiros, pais, avós ou amigos, é fundamental para que as recém-mamães possam passar de uma maneira mais tranquila por esse ciclo.
— Eu sempre gosto de receber a paciente no puerpério com a família porque as coisas ficam mais claras. Às vezes, a paciente não se dá conta e o familiar que nos revela “olha ela não dorme mais, ela não está conseguindo se alimentar”. Elas podem não contar espontaneamente — exemplifica Adriani.
O mais importante é que as mães, principalmente as de primeira viagem, saibam que a depressão pós-parto existe. Conforme a professora, os pensamentos de que é está tudo bem não dormir, não ter tempo para comer ou fazer algum exercício não devem ser normalizados. A médica destaca, ainda, que não existe um prazo para recuperação, cada paciente é única e o tempo até a melhora vai depender de vários fatores, não devendo haver cobranças.