Shakespeare sabiamente reconheceu que o sono "que remenda o pano esgarçado da saúde" confere alívio às dores físicas e emocionais da vida. Infelizmente, esse "prato principal no banquete da vida", como ele o chama, normalmente escapa a milhões de pessoas que sofrem de insônia. Desesperadas para dormir ou voltar a dormir, muitas recorrem a zolpidem ou qualquer outra medicação indutora do sono para conseguirem realizar a árdua tarefa de fechar os olhos.
Contudo, com exceção daqueles que enfrentam problemas de curto prazo que podem prejudicar o sono, como dores pós-cirúrgicas ou luto, esses sedativos hipnóticos têm benefício limitado e podem, às vezes, causar problemas mais sérios do que os que poderiam prevenir. Eles não devem ser usados por mais de quatro ou cinco semanas.
Em abril, a FDA (agência federal norte-americana responsável pelo controle de alimentos e remédios) incluiu uma advertência nas embalagens das medicações controladas zolpidem (Ambien, Edluar, Intermezzo e Zolpimist), zaleplon (Sonata) e eszopiclone (Lunesta), depois de relatos sobre pessoas que se machucaram ou morreram em decorrência de sonambulismo, cochilo ao volante e outras atividades perigosas sem estarem devidamente alertas.
Em julho do ano passado, uma mulher do estado da Geórgia foi presa ao dirigir na contramão em uma estrada no dia seguinte ao uso de Ambien, sob prescrição, para dormir. Apesar de não ter consumido álcool, testou positivo no bafômetro e disse à polícia que não sabia como acabara pegando a direção errada.
Embora as reações extremas a esses remédios para dormir sejam incomuns, são imprevisíveis e podem ser desastrosas quando acontecem. Algumas resultaram em mortes no trânsito.
"Intervenções não farmacológicas são subutilizadas"
Entre 20% e 30% da população como um todo dorme mal. Esse número representa os que têm dificuldade para dormir ou para permanecer dormindo. Algumas pessoas acordam cedo demais, enquanto outras não se sentem descansadas mesmo tendo dormido uma noite inteira. Para uma entre dez pessoas, a insônia é um problema crônico que se repete noite após noite. Não é de surpreender que tantas recorram a remédios para lidar com isso.
— O sono curto não é apenas irritante. É algo que traz consequências reais além do mau humor no dia seguinte — esclareceu Adam P. Spira, pesquisador do sono na Escola Bloomberg de Saúde Pública da Universidade Johns Hopkins.
O sono curto não é apenas irritante. É algo que traz consequências reais além do mau humor no dia seguinte.
ADAM P. SPIRA
Pesquisador do sono
No entanto, Spira e outros especialistas afirmam que há alternativas melhores, mais seguras e mais duradouras do que as medicações controladas para tratar esse problema comum. Estas se mostram especialmente valiosas para idosos, que demoram mais para metabolizar remédios, possivelmente apresentam causas inerentes à insônia que podem ser tratáveis e são mais suscetíveis aos efeitos colaterais adversos das medicações.
"Como regra geral, a insônia não recebe o tratamento adequado e intervenções não farmacológicas são subutilizadas por profissionais da saúde", escreveram os geriatras Nabil S. Kamel, do Cox Health, em Springfield, Missouri, e Julie K. Gammack, do Centro de Ciências da Saúde da Universidade St. Louis, na publicação científica "The American Journal of Medicine".
Em outras palavras, quando a insônia persistente se torna um problema, antes de seu médico prescrever um remédio para dormir, pergunte se não há outras maneiras mais seguras, eficazes e duradouras.
Origem da insônia
Por exemplo, se a dor ou outros sintomas de um distúrbio médico estão impedindo que você durma, o primeiro passo deve ser o tratamento dessa enfermidade subjacente para minimizar os efeitos da interrupção do sono.
Uma vez, fiquei três noites sem dormir, torturada por uma coceira intensa, até um dermatologista receitar um remédio para o que se revelou uma invasão de pulgas de aves. Mais recentemente, minhas câimbras nas pernas no meio da noite foram quase totalmente eliminadas quando passei a tomar 230 ml de água tônica com quinino (na verdade, tônica diet) todas as noites antes de dormir.
Às vezes, a medicação recomendada para tratar uma doença crônica interfere na capacidade de dormir bem. Nesse caso, o médico pode receitar uma dose mais baixa, substituir o remédio ou ajustar o horário da dose.
Entretanto, quando os próprios sintomas da doença crônica são prejudiciais ao sono, pode ser necessário buscar um especialista, incluindo talvez um especialista em dor, para tratar e melhorar sua capacidade de dormir.
Alternativas aos medicamentos e técnicas para dormir
Agora, se o que está mantendo você acordado são problemas emocionais, considere consultar um psicólogo, um assistente social psiquiátrico ou um psiquiatra antes de recorrer aos remédios.
A terapia cognitivo-comportamental é, hoje, considerada o melhor tratamento para a insônia, especialmente para adultos mais velhos. Ela ensina pessoas a desafiar pensamentos negativos destrutivos e substituí-los por outros enaltecedores, que suprimem o estado de agitação e induzem o relaxamento. Antes de ir para a cama, tente se concentrar em imagens relaxantes ou meditar para reduzir o estímulo cognitivo.
O American College of Physicians recomenda a terapia cognitivo-comportamental, ou TCC, como "tratamento primário para adultos com insônia crônica". Ela é muito mais segura do que os remédios e, diferentemente dos soníferos, que só funcionam quando ingeridos e não devem ser usados no longo prazo, ensina estratégias efetivas que continuam a funcionar muito após seu término.
A instituição sugere que, se necessário, remédios para dormir devem ser usados apenas por um curto período, enquanto se aprendem as técnicas da terapia comportamental cognitiva para a insônia.
Outra estratégia eficaz é o que especialistas chamam de terapia de controle de estímulos – limitando o tempo no quarto para dormir e transar. Ao evitar a realização de atividades incompatíveis a esse espaço, você aprende a associar o quarto ao sono. Se você passa tempo demais deitado na cama sem dormir, o cérebro começa a relacionar o dormitório com o fato de não dormir. Além disso, evite ir para cama se não estiver com sono.
Se você não adormecer após aproximadamente 20 minutos na cama, Kamel e Gammack recomendam que se levante, talvez tome um banho ou leia e volte para a cama quando estiver com sono.
Se tudo o mais falhar, a terapia de restrição de sono pode ser eficaz mesmo depois de uma semana ou duas, especialmente ao eliminar a vigília prolongada no meio da noite. Ela não restringe o sono propriamente dito, mas limita o tempo em que não se dorme ao restringir seu tempo na cama à quantidade de sono que você tem atualmente.
Vá para a cama aproximadamente no mesmo horário todos os dias, acione um despertador e mantenha esse horário de despertar todos os dias por, pelo menos, duas semanas, independentemente de quanto tenha dormido na noite anterior. Em seguida, aumente gradualmente o tempo na cama em 15 a 30 minutos, deixando um intervalo de uma semana entre cada extensão, até conseguir atingir a quantidade de sono restaurador que você precisa sem acordar, ou acordando o mínimo possível, no meio da noite.
Por Jane E. Brody