O prejuízo causado por superfaturamentos e pagamentos por serviços não executados em um contrato do Departamento de Habitação (Demhab) da prefeitura de Porto Alegre, de 2012, é de R$ 16,4 milhões em valor atualizado, segundo o Ministério Público (MP). O serviço, que envolvia retirada de vegetação e de entulhos, além da instalação de infraestrutura de rede de esgotos em dois condomínios, foi alvo de apuração do MP e resultou em Ação Civil Pública que ainda tramita na Justiça.
Na ação, o MP argumenta que o Demhab teria pago por um volume 230 vezes maior do que o existente de vegetação a ser retirada de apenas uma das áreas que seriam usadas para instalar os condomínios Senhor do Bom Fim e Irmãos Maristas, que começaram a receber recentemente famílias transferidas da Vila Nazaré. O superfaturamento e outras inconsistências durante a execução do contrato foram apontados em auditorias do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e também são foco das investigações da Operação Mancha Verde, deflagrada na quinta-feira (27) pela Polícia Civil.
Jorge Luis Vani Dusso e Everton Luiz Gomes Braz, ex-diretores da autarquia, são alvos da ação de improbidade administrativa, além de três engenheiros, que são servidores públicos, e a empresa Conterra Construções e Terraplanagem. Todos tiveram os bens bloqueados pela Justiça a pedido da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público.
Além disso, Dusso e Braz também já tinham sido condenados pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) a devolver R$ 5,97 milhões aos cofres públicos, em decisão tomada durante sessão da Primeira Câmara do TCE, em 18 de junho.
O parecer técnico que apontou que a mancha verde — ou seja, a vegetação que precisava ser extraída para implantação de infraestrutura do condomínio Senhor do Bom Fim — teria sido paga 230 vezes a mais que o volume de vegetação existente foi encomendado pelo próprio Demhab em 2013. O MP destaca que, apesar de ter tido conhecimento da diferença paga, o diretor-geral — que, à época, já era Everton Braz — não adotou nenhuma medida:
"Apesar das conclusões do parecer técnico em posse do Demhab, o diretor-geral silenciou a respeito nas novas manifestações que se sucederam naquela Inspeção Especial. Tampouco há notícia de qualquer providência corretiva na órbita do Demhab para ressarcir o erário dos pagamentos efetuados a maior".
O MP também deu destaque para a falta da efetividade de sindicância feita pelo Demhab a fim de apurar responsabilidades. O procedimento administrativo tramitou entre setembro de 2012 e abril de 2013. Ficou parado, conforme a promotoria, até setembro de 2014, quando teve sequência com a apresentação de defesas pelos investigados. Em maio de 2015, no entanto, foi reconhecida a prescrição e ninguém foi responsabilizado. Mais uma vez, o MP aponta inércia por parte do gestor da autarquia:
"Ocorre que a deficiência na tramitação do expediente era do conhecimento pessoal do diretor-Geral do Demhab, Everton Braz, a quem foram dirigidos ofícios demandando o andamento da sindicância, quase todos respondidos pelo próprio. Nada fez, porém, para agilizar a apuração das responsabilidades. Inversamente, advogava junto ao TCE/RS o acerto dos procedimentos", escreveu o MP na ação.
Braz é suspeito ainda de ter liberado valores que estavam bloqueados por pedido do TCE "sem cautelas mínimas". Em relação ao diretor-geral anterior a Braz, o economista Dusso, que dirigia o órgão quando os serviços foram realizados e atestados, o MP diz que ele "teve atuação direta sobre os fatos que acarretaram em lesão ao erário público, tendo por ações e omissões, facilitado e concorrido para o enriquecimento indevido da empresa Conterra, sendo negligente na conservação do patrimônio público, violando os deveres da eficiência e imparcialidade".
Dusso dirigiu a autarquia entre 2012 e janeiro de 2013, quando Braz assumiu, ficando até abril de 2016. Dusso é economista aposentado do quadro da prefeitura e filiado ao PTB. Braz, atual presidente do mesmo partido em Porto Alegre, é chefe de gabinete do deputado federal Maurício Dziedricki (PTB).
Para o MP, os agentes públicos envolvidos e os gestores não adotaram as devidas medidas para evitar o dano milionário e ressarci-lo. A promotoria pede condenação pelas "ações e omissões que violaram os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência e da lealdade, que geraram prejuízo ao erário e o correspondente enriquecimento indevido da Conterra, bem como o ressarcimento do dano ao erário correspondente aos pagamentos indevidos".
Contraponto
O que diz Everton Braz por meio de nota:
"Com relação a ação de improbidade administrativa decorrente da obra "Mancha Verde" - licitada, contratada e executada em 2012, antes do início da minha gestão no Demhab - esclareço que apresentei defesa prévia em juízo. A Ação Civil Pública ainda não foi aceita pelo juiz designado e que, consequentemente, ainda não foi decidido quem será objeto da ação. Portanto, qualquer afirmação com relação a este processo trata-se de ilações sem base legal. Reafirmo ainda que confio plenamente na justiça, pois todos os atos praticados em minha gestão, com relação a este processo, decorreram de orientações e determinações do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e que estou à disposição para colaborar com as investigações em tudo o que estiver ao meu alcance".
GaúchaZH não conseguiu contato com a defesa de Jorge Luis Vani Dusso.
Na quinta-feira (27), após ocorrer a Operação Mancha Verde, a Conterra se manifestou por meio de seu advogado, que preferiu não se identificar: "Não houve superfaturamento e a empresa está contribuindo com a investigação".