O serviço de retirada de árvores e de entulhos para preparar lotes para a construção de dois condomínios em Porto Alegre foi superfaturado e causou um prejuízo de R$ 6 milhões aos cofres públicos, segundo investigação da Delegacia de Repressão aos Crimes contra a Administração Pública e Ordem Tributária (Deat).
Ex-gestores do Departamento Municipal de Habitação (Demhab) e engenheiros responsáveis por fiscalizar o contrato — firmado em 2012 — são investigados na Operação Mancha Verde, deflagrada nesta quinta-feira (27) pela Polícia Civil. Também são alvo os sócios da empresa contratada pelo órgão, a Conterra Construções e Terraplenagem.
O prejuízo foi apontado em auditoria do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e já existe ação civil pública por improbidade administrativa tramitando contra servidores e dois ex-diretores do departamento — que ainda não estão tendo os nomes divulgados.
As apurações indicaram que o Demhab fez, à época da contratação, planilha de orçamento com valores acima dos de mercado. Além disso, deixou de fiscalizar os serviços executados pela empresa, que acabou recebendo por itens não feitos.
O trabalho consistia em implantação de infraestrutura para a posterior construção dos condomínios Senhor do Bom Fim e Irmãos Maristas — o contrato não envolvia a obra civil, apenas a preparação do terreno, que era coberto por vegetação. Os dois condomínios começaram a receber recentemente famílias transferidas da Vila Nazaré.
O superfaturamento foi constatado pelo TCE na quantidade de árvores cortadas e na remoção e transporte de entulhos. O valor do prejuízo, não atualizado, é de R$ 6 milhões — o contrato era de R$ 33 milhões, mas o valor não foi todo pago.
Auditores públicos externos do TCE ouvidos no inquérito deram à polícia indicativos das irregularidades. Sobre a área de árvores que devia ser removida, foi dito: "O volume de vegetação foi calculado de maneira errada, uma vez que a orçamentista multiplicou a altura média das árvores pela área total, desprezando o volume de vazios entre as árvores, como se fosse um bloco maciço".
Também foi destacado pelos auditores o tempo gasto com o serviço de remoção da vegetação: 15 dias. Conforme auditores, se o volume calculado das árvores fosse o correto, seria impossível concluir o trabalho nesse prazo, pois exigiria "o carregamento de 80 caminhões por hora, um a cada 45 segundos".
A Deat está cumprindo 16 mandados de busca e apreensão em cinco cidades. O trabalho, coordenado pelos delegados Max Otto Ritter e Vinicios Batista do Valle visa localizar documentos que possam ser agregados às provas já reunidas e, conforme a polícia, comprovar eventual conluio entre os então gestores da autarquia, servidores públicos municipais e empresários contratados.
O caso chegou a ser apurado em sindicância em 2015 pela então gestão do Demhab, que admitiu ter ocorrido falta funcional de quem atestou os serviços não executados pela empresa. Houve indicação de pena de advertência, que nunca chegou a ser concretizada, pois teria ocorrido prescrição.
— Foi aplicada uma penalidade ínfima para um gravíssimo desfalque de R$ 6 milhões, dinheiro que poderia ser destinado à construção de novas unidades habitacionais para dirimir os problemas enfrentados pelas comunidades mais carentes — destaca o delegado Max.
Por meio de nota oficial, o Demhab se manifestou no começo da tarde sobre a operação:
"A atual gestão do Departamento Municipal de Habitação (DEMHAB), em 2017, recebeu os apontamentos do Tribunal de Contas do Estado (TCE), diante das informações chamou todos os ex-fiscais do projeto e os funcionários envolvidos para esclarecimentos. Com a análise da gravidade dos fatos que se apresentavam foi aberta uma sindicância interna para apuração detalhada dos fatos apontados pelo TCE. Todas as informações foram encaminhadas ao Ministério Público e Policia Civil para as devidas providências que agora resulta neste desdobramento com a operação Mancha Verde.
A atual gestão da prefeitura e do Demhab não aceitam qualquer tipo de irregularidade na administração pública. Todas as informações que embasam as investigações foram repassadas aos órgãos competentes com nossa inteira colaboração. E continuaremos colaborando com toda investigação, de qualquer ato que possa parecer irregular, em qualquer setor da administração pública municipal".
Contraponto
O que diz a Conterra por meio de seu advogado, que preferiu não se identificar:
"Não houve superfaturamento e a empresa está contribuindo com a investigação".