A missão não é fácil, mas aos 56 anos o técnico Rogério Zimmermann pode usar o seu conhecimento para conseguir tirar o Caxias de uma fila que parece não acabar: a do acesso nacional. Dentro de campo, o clube nunca conseguiu subir de divisão e bateu na trave inúmeras vezes.
Nos últimos quatro anos, o time grená chegou três vezes no jogo que vale a saída da última divisão nacional e parou em todas, com todos os perfis possíveis de comandantes. Ainda assim, o que não falta é experiência com acessos para o novo treinador. Zimmermann levou o Brasil-Pel da Divisão de Acesso à Série B do Brasileirão.
Nesta semana, o técnico foi convidado do programa Show dos Esportes da Gaúcha Serra. Em uma hora de entrevista, o chefe do vestiário grená comentou sobre a pré-temporada, o perfil do grupo de jogadores, o seu estilo de equipe, mas principalmente sobre as dificuldades que virão pela frente. Questionado sobre qual a competição mais difícil no futebol brasileiro hoje, Zimmermann foi claro:
— A Série D, sem dúvida. Acredito que está pior (comparando com o ano de 2014, quando subiu com o Xavante), porque antes eram dois mata-matas e agora são três. São 68 clubes, sendo que 64 não obtêm sucesso. A Série C tem 40% de chance de classificar à segunda fase e depois 50% de subir, são quatro e classificam dois. A Série B, se não tem o acesso, a chance de permanência é grande. A Quarta Divisão sequer tem essa possibilidade de disputar no ano que vem, se não sobe a classificação tem que ser buscada em outras situações — explicou o treinador.
Ainda assim, Rogério fez questão de salientar ao torcedor que sua decisão de trabalhar no Estádio Centenário não está ligada à divisão que o clube está. Ao seu estilo, o treinador já trabalha para convencer aos grenás estarem ao seu lado no próximo ano.
— Eu vim por ser o Caxias, todos sabem que é um grande clube, de torcida e tradição. É um desafio, uma situação momentânea e de novo tem que usar isso como agente motivador — falou o treinador.
Confira alguns trechos da entrevista na Rádio Gaúcha.
O GRUPO DE ATLETAS
— Resolvemos trabalhar com um grupo pequeno, para aqueles jogadores que estão treinando, estão dentro do vestiário tenham a certeza de que serão convocados e utilizados. A gente não gosta de trabalhar com grupo grande, onde você convoca 20 a 22 jogadores e ficam lá de oito a 10 atletas fora da partida. Isso atrapalha o treino, o treinador não dá atenção devida. Tudo aquilo que está sendo planejado, estamos conseguindo.
GAUCHÃO 2022
— O Campeonato Gaúcho é muito parecido. Tem equipes que mantêm a mesma base, o São Luiz normalmente leva os mesmos jogadores. O Novo Hamburgo e o Aimoré podem ter alguma vantagem por jogarem a Copinha, e se não mudarem muito, já pegam uma sequência boa. Só que é uma competição que as primeiras rodadas vão direcionando e os times do Interior são muito parecidos. Temos que ter cuidado, porque são jogos muito rápidos, por isso é sempre importante começar bem e estar na ponta de cima. Mas eu vejo muita paridade entre as equipes.
CONTRATAÇÕES
— Você sempre quer contratar o bom jogador e tem a concorrência de outras equipes, a concorrência financeira, outras divisões mais atrativas para aqueles que pensam em ano inteiro. Estamos conversando com alguns jogadores e que até pouco tempo estavam jogando, mesmo se tiver acerto eles se apresentariam mais tarde. Nós conseguimos na parte defensiva praticamente ter dois jogadores por posição, se não específico, mas alguns que podem atuar em mais de uma posição.
O setor de ataque talvez seja uma preocupação maior. Mas se aparecer a oportunidade de trazer um bom jogador, precisa contratar. A ideia é contratar certo. Não podemos ter pressa, contratar um jogador e perceber que foi errado, tendo que ficar um ano com esse atleta não dá mais certo no futebol, por isso tem que pensar e estudar bem.
ANÁLISES DE JOGADORES
— Às vezes, parece que o dia tem mais de 24 horas, mas sempre sobra espaço para observar o Estadual. Olhamos mais o Campeonato Paulista, que é a grande vitrine. Vários times que jogam o Paulista terminam e perdem jogadores. A Ferroviária forma uma equipe no estadual e para Série D modifica. Eu sou o treinador que tenta ler e observa muito no próximo adversário (do Gauchão), e fazendo isso também observa jogadores.
Tem o outro setor, o de análise e desempenho, que olha equipes no Brasil inteiro e que pode observar jogadores que servem ao Caxias no futuro. Claro que tem que pensar no bom e barato. Tem que buscar sempre o jogador que o pessoal não observou tanto ou o jogador que tem um grande potencial, mas não vive uma grande fase. Essa é uma maneira de contratar dentro do orçamento.
AS EXPERIÊNCIAS
— A essência é a mesma, mas com o passar do tempo você procura os mesmos resultados no menor tempo possível. Você pega uma equipe e tenta passar ideia e modelo de jogo, enfim uma série de coisas encurtando o tempo de entendimento do jogador. Você sabe a melhor palestra, o melhor treino para conseguir os mesmos resultados em uma equipe entrosada e competitiva. Eu acho que esse é o grande desafio dos treinadores. O tempo vai te dando isso, a maneira de relação com atletas, com a direção.
Você escolhe os atletas, por isso a importância desse momento de formar o grupo e ter competência nas contratações definem o sucesso ou não da temporada. A experiência te ajuda a antecipar coisas, observações de ter vivido muitas vezes o processo e vai separando o que dá certo e o que não deu certo. Isso dá um caminho mais curto, rápido e efetivo
GANHAR O VESTIÁRIO
— O jogador não é um ser isolado. Ele tem empresário, a família, o cara que faz tatuagem, o cara que vende a corrente de ouro, o vendedor do carro, do seguro, o cara que ajuda na rede social, os parceiros. Ou seja, é um atleta e um monte de gente. Então, o jogador escuta muita gente, antigamente era o só treinador. Ele escuta muitas pessoas e nem sempre todos orientam bem, difícil ver jogadores com plano de carreira.
Por exemplo, ele está bem no clube, está progredindo, mas se vier uma proposta de R$ 1 mil ou R$ 2 mil a mais, ele sairá, mesmo que no outro clube não vá jogar. Tem muita dificuldade. Por isso a escolha dos atletas é fundamental.
Eu conversei com todos os jogadores até agora, a gente pergunta de posição, função, ambições e uma série de coisas para conhecer o atleta.
RETRANQUEIRO OU NÃO?
— Tu sabes que toda vez que se falava nisso, eu pensava: “eles não estão entendendo nada do que estamos fazendo”. É até estatístico, jogar cinco anos por uma bola e ela sempre entrar? Quando analisam a minha equipe e se diz isso, não conhecem o meu time e é um fator determinante para ter tido sucesso.
Quem acompanhava os jogos no Bento Freitas sabia que a gente atropelava os adversários e não deixava passar do meio de campo, mas se criou essa ideia e eu confesso que reforçava. A gente ganhava e vinha aqui (em Caxias do Sul) e ganha por 3 a 2 e eu dizia: foi por uma bola. As pessoas acreditavam. Só que tu for analisar foi 3 a 2, duas bolas no poste e uma que o goleiro defendeu, mas eu falava tão sério que as pessoas acreditavam.
Quando escutava até os adversários dizendo que o Brasil jogava por uma bola, dizia: “graças a Deus, ele não está entendendo nada”. Eu acho que 90% das equipes não jogam só de uma maneira, elas intercalam isso durante a partida ou entre um jogo e outro. A grande maioria faz as duas coisas e eu treino as duas coisas.
Importante é alcançar o resultado e da maneira que se tem mais conhecimento e que fica de acordo com o grupo de atletas e a qualidade técnica. Passo aos atletas saber jogar quando o adversário está fechado e quando o adversário te empurra e fornece espaços. Durante o jogo, o atleta escolhe a melhor maneira.
ARBITRAGEM
— Achava que o VAR iria melhorar a arbitragem, porque qualquer lance polêmico poderia ver no vídeo. Eu gostaria de ser assistente hoje. Não levanto a bandeira e deixo correr, depois o vídeo diz se estava regular ou não. O futebol tem muita interpretação, aí assistindo no vídeo todo mundo terá uma visão diferente de cada lance.
Acho que nós treinadores contribuímos muito pouco, realmente a gente reclama demais. É uma questão de impunidade ou não. Melhorou no momento em que os treinadores começaram ser advertidos. Só que pode melhorar mais. Imagina na Série D, que não tem VAR nos dois mata-matas e há um erro de arbitragem. Aquilo muda quem sobe e permanece, isso dói demais nos atletas e comissão.
O VAR veio para acabar com essas injustiças, talvez por ser novo a gente precise de tempo para melhorar e ficar mais rápido e certeiro, como está no futebol europeu, essa questão da interpretação.
RESULTADOS E ANÁLISES
— O contrato do treinador não diz que se as coisas não funcionarem vá ficar até o final e nem sempre as coisas correm normalmente. O futebol cobra resultados. Eu separei o mundo em dois grupos: os que analisam o futebol só pelo resultado e os que fingem que não analisam só pelo resultado.