Construído há 13 anos às margens da BR-285, em Mato Castelhano, na região norte do Estado, o Hotel Romanttei está prestes a ter parte de sua área demolida. Conforme o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), o restaurante, a garagem e um pedaço do hotel, o único do município, estão sob a faixa de domínio — área sobre a qual se assenta uma rodovia.
Há 10 anos, o DNIT moveu uma ação contra o hotel e desde lá as proprietárias Marinês Roman Mattei e sua filha, Aline Roman Mattei, e o órgão travam uma batalha judicial. O processo foi julgado pela Justiça Federal de Passo Fundo em dezembro de 2018. As proprietárias recorreram, mas a decisão foi mantida no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A demolição deve acontecer no prazo de 60 dias a contar do dia da entrega da intimação à proprietária, ocorrida no último dia 28 de fevereiro, segundo consta no mandado de intimação. Depois de quatro visitas sem localizar Marinês e Aline, a oficial de Justiça entregou uma cópia da intimação para uma das vizinhas do estabelecimento para que fosse entregue às proprietárias.
Hotel é tradicional ponto de parada de argentinos
Tradicional rota de passagem de argentinos, agricultores, representantes comerciais e da comunidade em geral, o hotel teve um investimento de R$ 2 milhões desde a construção. Com capacidade para 80 hóspedes, o local funciona regularmente com 70% da sua capacidade total. Tem garagem para 40 carros e serve mais de 100 almoços diariamente.
Marinês administra o hotel junto com a filha Aline, com apoio de mais cinco funcionários. Se a demolição realmente acontecer, ela calcula que terá que fechar as portas.
— Não teremos mais motivo para continuar. Foi muito investimento e o trabalho de uma vida inteira. Se demolirem o hotel, nós vamos embora de Mato Castelhano e iremos arrendar nossas terras. Isso tudo parece um pesadelo, estou sem chão, não sei o que fazer — lamentou.
A proprietária conta que recebeu notificação a partir de uma denúncia de que estaria em área do DNIT e desde lá luta na Justiça. Contratou um advogado e, depois de cerca de três anos, ele faleceu, e o processo ficou parado.
— Por quase dois anos nós não acompanhamos o andamento dessa ação, pois o advogado não tinha sócios no escritório e levou bastante tempo até conseguirmos contatar sua viúva e providenciar todos os papéis para então contratar um novo profissional. Faltamos duas audiências porque não ficamos sabendo que tinham sido agendadas. Eu e minha família ficamos desassistidos. Entendo que é uma decisão da Justiça, mas não vejo necessidade, o trânsito flui normalmente na rodovia, não estamos atrapalhando em nada — explicou.
Marinês disse que o atual advogado informou que ela havia perdido a ação na Justiça, o que a deixou surpresa.
— Nunca esperávamos que isso aconteceria. Eu achei que ia dar tudo certo, que jamais precisasse demolir parte do hotel. Parece um pesadelo. Estou sem chão, passando noites sem dormir, os meus dias tem sido uma tortura. Construímos esse hotel com muita economia. São quatro terrenos de área construída.
Ela disse que o impacto o fechamento do hotel será grande para a cidade, até mesmo para outros comércios que tem movimento devido aos clientes.
Impacto para a comunidade
A comunidade está mobilizada para que o local não seja destruído. O hotel movimenta a economia do município, de pouco mais de 2.400 habitantes.
O borracheiro Mário Assunção Pacheco abriu uma empresa há cinco anos e atende os hóspedes do hotel cotidianamente.
— É um absurdo tirar um comércio tão importante. A cidade já é pequena e se fechar este lugar vai terminar com todo o movimento. Todo mundo perde com isso. As pessoas que vão para jantar e dormir procuram a borracharia e as outras empresas também.
Cleiton Felipe de Souza Silva trabalha no ramo de agropecuária no município. É filho de agricultor e a família está na cidade há mais de 25 anos. Ele disse que a comunidade espera que a demolição possa ser revista.
— É o único hotel da cidade, é uma fonte de renda municipal. Essa área não está prejudicando o DNIT, essa alteração não faz sentido, não é viável, não atrapalha o trânsito e vai impactar muito na economia da nossa cidade. Imagina fechar o restaurante, que serve aos agricultores, funcionários da prefeitura e todo mundo que vem de fora. O turismo vai ser podado por essa ação.
José Luiz Rech é proprietário de um posto de atendimento do Banco do Brasil, que também é centro de entregas das mercadorias compradas pela internet pela comunidade. O local é anexo ao restaurante e recebe contas a comunidade luz, água, depósitos e pagamento de boletos. José diz que, caso o hotel venha a fechar, também não vai permanecer no município.
— Eu e minha família não teremos mais motivo para ficar aqui e já estamos decididos a voltar para Lagoa Vermelha, de onde viemos. É muito triste, vai ser um retrocesso para Mato Castelhano, para toda a comunidade, para a economia.
Soloni Dalle Aste é a administradora do café do hotel. Trabalha com a ajuda da irmã e da mãe, que tem 85 anos. Elas servem, em média, até 40 cafés pela manhã para os hóspedes do Romanttei.
— Essa demolição vai gerar um grande impacto para todos os comerciantes, para toda a cidade. O café mantém a nossa família. Vamos ficar sem lugar para trabalhar. Estamos numa BR, todos que passam por aqui param no hotel. As pessoas que antes vinham se hospedar vão ter que procurar hotéis em outras cidades, além do transtorno da locomoção vão pagar mais caro.
Ainda deve ser demolido um salão de beleza próximo do hotel, que também foi construído sob a faixa de domínio.
Em nota, o DNIT explicou que o imóvel foi construído sobre a faixa de domínio de 35 metros, mais 15 metros de reserva, e que para a realização de qualquer obra junto à rodovia é necessário consultar a autarquia. Ainda segundo o DNIT, a proprietária foi notificada, mas as obras prosseguiram, gerando os processos judiciais.
A Prefeitura de Mato Castelhano informou que o município não foi intimado ou citado, nem é parte, no que diz respeito ao processo judicial em que está sendo discutida a demolição de parte da obra do Hotel Romanttei. De qualquer forma, se solidariza com a situação uma vez que é o único empreendimento deste ramo no Município e se coloca à disposição de todas as partes envolvidas.
GZH Passo Fundo
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