Um fenômeno tomou conta dos gramados gaúchos neste início de 2024. Um furacão chamado Yeferson Soteldo tem levado os marcadores que enfrentam o Grêmio à loucura. Não foi por sua imposição física que o atacante recebeu o apelido de “Showteldo” do narrador Pedro Ernesto Denardin. Apesar de vestir uma camisa de tamanho juvenil, os dribles, a velocidade e o talento do venezuelano chamam atenção.
O novo camisa 7 tricolor foi listado com 1m60cm, mas quem trabalhou com o jogador nos clubes diz que está mais para 1m58cm. Mas o mesmo jogador que encantou a torcida pelos lances de efeito traz também na bagagem a Porto Alegre algumas polêmicas em seus outros clubes.
A história de Soteldo é daquelas que se repete no futebol. Uma pessoa que cresceu em um ambiente difícil, mas o talento como propulsor para alçar voos. A aposta feita pela direção do Grêmio é que o ambiente no CT evitará que o passado de problemas extracampo afete o talento que o venezuelano é capaz de mostrar. Uma missão que Renato Portaluppi se orgulha de ter mais acertos do que erros na carreira.
— Lidar com esse tipo de jogador é muito fácil. Fácil demais. A altura dele não influencia em nada. Eu quero é futebol. E futebol ele tem de sobra — disse Renato, em contato com ZH.
A história do novo jogador gremista começa em Acarigua, onde nasceu em 1997. Criado no bairro conhecido por El Muertico (o mortinho, em Português), sofreu em um ambiente de violência e miséria. As más companhias quase o levaram para longe do futebol. O comportamento inadequado custou uma vaga na base do Caracas. Mas uma segunda chance, desta vez no Zamora, o fez ser profissional. Estreou pela equipe principal em 2013, com apenas 16 anos.
A ida para o Huachipato surpreendeu. Se imaginava que um dos protagonistas da equipe vice-campeã mundial sub-17 iria para a Europa. Mas foi no Chile onde o atacante passou a ganhar manchetes. O bom rendimento o levou para a Universidade do Chile em 2018.
O jogador deixou o país com alguns episódios de indisciplina. Em 2018, na La U, chegou atrasado a um treino. Justificou que teria passado a madrugada auxiliando a esposa grávida, mas torcedores o flagraram em uma festa. O jogador se desculpou e recebeu uma partida de afastamento. As outras experiências fora do Brasil também tiveram alguns episódios. No Tigres-MEX, faltou a um treino no dia de seu aniversário de 25 anos.
Em sua segunda passagem pelo Santos, acabou afastado por um desentendimento com Paulo Turra. Soteldo teria se recusado a treinar com os demais reservas após o empate sem gols com o Blooming-BOL pela Sul-Americana, o que teria levado a uma discussão com o treinador. Após a saída de Turra, voltou a ser utilizado com regularidade.
Odair Hellmann, atualmente no Al Riyadh da Arábia Saudita, antecedeu Turra no Santos. Hellmann aposta que Soteldo tem tudo para deslanchar no Tricolor:
— É um jogador de muita personalidade, difícil de encontrar hoje em dia. Do drible e da assistência. Quando ele tá bem, não é só isso. Faz gols também. Comigo ele foi muito bem. Jogando e no dia a dia. Ele vai arrebentar aí, como já está fazendo.
Até mesmo a questão da estatura, na avaliação de quem trabalhou com o jogador, conta como ponto positivo. O preparador físico Rogério Dias, ex-Grêmio e hoje na comissão do Al Riyadh, vê Soteldo com a parte física como vantagem.
— Na minha visão, é um jogador beneficiado geneticamente. Principalmente pela capacidade de potência muscular. Produz muita força rapidamente. E essa capacidade fica nítida no campo com as mudanças de direção rápida que faz. Freia, acelera e muda de direção. Consegue proteger a bola também em virtude de apresentar um centro de gravidade baixo, que está diretamente relacionado ao equilíbrio e estabilidade — afirmou.
Receber a camisa 7 no Grêmio não é um gesto vazio. Quem veste o número tem a missão de carregar um legado especial. Soteldo brincou que gostaria de usar a 10, mas que recebeu como uma motivação a mais carregar a marca.
— A camisa 7 foi uma decisão difícil. Eu gosto de usar a 10. Mas me falaram que seria bom eu usar a 7 e eu disse que ia falar com o Renato. Ele sempre falando daquele jeito, que vou entrar com uma cadeira pesada, de história, na cabeça (risos). Mas de boa, gosto de desafios, vim para isso — prometeu.
Soteldo foi apresentado como reforço vestindo P, mas pediu uma PP em jogos. Como o clube não tinha o modelo, entrou em campo com uma da linha juvenil. O baixinho já caiu nas graças da torcida pelo futebol e pela estatura. Na sexta-feira, doou uma camisa para Stella Balen Felin, fã de 9 anos que levou um cartaz para o jogo contra o São José afirmando que cabia no fardamento do atacante.
O ambiente na Arena já é dos melhores. Agora, seja qual for o tamanho da roupa, Soteldo quer ser lembrado apenas pelo que faz no gramado e deixar os problemas extracampo para trás.