A paralisia da economia brasileira no primeiro trimestre de 2019 aumenta a atenção de economistas para dois assuntos. O primeiro, considerado essencial para começar o reequilíbrio fiscal do país no longo prazo, é a reforma da Previdência. O segundo é a ameaça de nova paralisação dos caminhoneiros.
Mesmo tendo seus efeitos práticos sentidos apenas nos próximos anos, a mudança das regras das aposentadorias é considerada um gatilho para a retomada da confiança e a liberação dos investimentos.
— A estabilidade macroeconômica do país depende da reforma da Previdência. É necessária para termos crescimento neste ano e nos próximos. Em 2019, seria mais pelo impacto na confiança e pelo destravamento de investimentos — afirma Luana Miranda, pesquisadora da área de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Economista-chefe da Tendências Consultoria, Alessandra Ribeiro observa que, apesar de a Previdência ser a prioridade, o governo também deveria encaminhar outras pautas de forma paralela, como uma reforma tributária e avanços nas concessões.
— Mas, sem a reforma da Previdência, não se garante uma coisa básica, que é o pilar fiscal. Então, não adianta ter uma agenda microeconômica um pouco melhor sem mudar a Previdência — destaca Alessandra.
O governo federal encerrou 2018 com déficit primário (sem contar os juros) de R$ 120,2 bilhões. Foi o quinto ano consecutivo de resultado negativo. Apenas a Previdência teve rombo R$ 195,2 bilhões. O parecer da reforma seria votado na semana passada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, mas a sessão teve de ser encerrada devido ao tumulto e à falta de acordo na sessão, em mais um episódio considerado uma derrota do Planalto no parlamento.
"Uma nova greve jogaria tudo fora"
Em meio à espera por melhor articulação do governo para tentar aprovar a reforma, uma preocupação de mais curto prazo voltou a assombrar: a possibilidade de nova paralisação dos caminhoneiros.
A greve, em maio de 2018, foi considerada fator essencial para abortar o início de recuperação da economia observada nos primeiros meses daquele ano. No mês, a atividade teve retração de 3,34%, de acordo com o IBC-Br, espécie de prévia do PIB, apurado pelo Banco Central.
— Uma nova greve dos caminhoneiros jogaria tudo fora — diz o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), Fabio Bentes, referindo-se às expectativas ainda existentes de expansão do PIB mais forte do que o ano passado, de 1,1%.
O contexto da atividade econômica global não é favorável, mas olhando para a nossa realidade, acho que há frustração com o início do governo.
ALESSANDRA RIBEIRO
Economista-chefe da Tendências Consultoria
Para Alessandra, da Tendências, apesar de a principal razão da insatisfação dos caminhoneiros ser o preço do diesel, a causa do desequilíbrio é mais profunda.
— O pano de fundo é um excesso de oferta, muitos caminhoneiros, e de outro lado a demanda fraca. Isso joga o preço (do frete). E eles têm pouca margem para absorver o aumento do diesel. Soluções artificiais não adiantam. As empresas acabam internalizando esta função também — resume a economista, aludindo à busca das companhias por formar uma frota própria para driblar exigências como preços mínimos do frete.
Brumadinho e Exterior também afetam o PIB
Embora o ambiente político interno e as dúvidas quanto à tramitação da reforma da Previdência sejam a maior fonte das inquietações, outros fatores também afetam a economia brasileira no início de 2019. O rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG) e a consequente paralisação de outras jazidas da mineradora devem trazer impacto significativo no Produto Interno Bruto (PIB) em 2019.
A pesquisadora da área de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da FGV Luana Miranda lembra que, devido à tragédia em Minas Gerais, a empresa anunciou corte equivalente a 20% de sua produção de minério de ferro no Brasil. Segundo a especialista, que fez projeções sobre a decisão, essa redução da oferta vai levar a uma queda de 0,2 ponto percentual do valor adicional bruto (VAB) na economia brasileira em 2019. O VAB equivale ao PIB, menos os impostos. Grosso modo, se a economia brasileira poderia crescer 2% em 2019, o potencial caiu para 1,8%, exemplifica.
— Isso impacta toda a cadeia, tanto pela escassez quanto pelos preços maiores — explica Luana.
O Exterior também preocupa. Um lado vem da desaceleração da economia global, que cresceu 3,6% no ano passado, de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Para 2019, a previsão mais recente, deste mês é de 3,3%, ante percentual de 3,5% em janeiro. Mas grande atenção vem da Argentina, que impacta principalmente a indústria brasileira. O país vizinho é o terceiro principal cliente do Brasil.
— As exportações caíram muito. De automóveis, químicos e outros manufaturados — relata Luana.
No ano passado, as vendas do Brasil para a Argentina somaram US$ 14,9 bilhões, queda de 15% sobre 2017. No primeiro trimestre de 2019, os embarques alcançaram US$ 2,3 bilhões — tombo bem maior, de 46% em relação aos três primeiros meses de 2018.
A crise econômica aliada à inflação alta fez o presidente Mauricio Macri anunciar um pacote que prevê o congelamento de preços de 60 itens da cesta básica por seis meses. O PIB do segundo maior país sul-americano caiu 2,5% no ano passado. O FMI estima novo recuo de 1,2% em 2019.