Os indicadores econômicos conhecidos do primeiro trimestre mais fracos do que o esperado, a queda da confiança de empresários e consumidores e o desemprego alto mostram que, mais uma vez, o país vê adiada a possibilidade de ter uma retomada vigorosa da atividade. Embora ainda sejam uma minoria, projeções mais sombrias, com possibilidade de até uma leve retração do Produto Interno Bruto (PIB), começaram a aparecer recentemente. O último recorte de três meses com resultado negativo foi observado no final de 2016.
Números para justificar o pessimismo não faltam (confira gráficos abaixo). Indicador do Banco Central (BC), o IBC-Br, por exemplo, teve retração de 0,73% na passagem de janeiro para fevereiro, após recuar 0,41% no primeiro mês do ano frente a dezembro. O Monitor do PIB, calculado pela Fundação Getulio Vargas (FGV), aponta recuo de 0,4% em fevereiro, apesar do avanço de 0,3% em janeiro.
Frustrados essencialmente pela desorganização política do Planalto na busca por angariar apoio para a aprovação da reforma da Previdência no Congresso, analistas financeiros consultados pelo Boletim Focus, do BC, diminuem há sete semanas consecutivas a previsão de alta do PIB para 2019. Em janeiro, no auge do otimismo, a mediana indicava crescimento de 2,57%. Na última edição do documento, divulgado na segunda-feira (15), o percentual estava em 1,95%.
O Banco Fibra, por exemplo, revisou o desempenho do PIB no primeiro trimestre de alta de 0,4% para variação levemente negativa de 0,1%. O Itaú fez o mesmo. De expansão de 0,3%, passou a esperar recuo de 0,1%, número que também é projetado pelo Bradesco. E indústria, comércio e serviços seguem com números fracos, enquanto o desemprego, que atinge 13,1 milhões de brasileiros, voltou a subir.
A questão é que agora as pessoas estão com dúvidas sobre a capacidade de articulação do governo para aprovar as reformas e ter uma agenda mais liberal da economia, prometida no período eleitoral.
LUANA MIRANDA
Pesquisadora da área de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV
— A produção industrial, o resultado dos serviços, a expedição de papelão ondulado, o fluxo de veículos nas estradas e outros indicadores divulgados mostram desempenho muito fraco de diversos setores da economia — afirma o economista-chefe do Banco Fibra, Cristiano Oliveira.
Pensar em dado negativo não é exagero, diz Fabio Bentes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo.
— A previsão de crescimento para o ano é cada vez menor e é consensual que o (primeiro) trimestre foi muito abaixo do que se esperava — avalia Bentes, lembrando que, por enquanto, a entidade trabalha oficialmente com variação positiva de 0,1% para o intervalo de janeiro a março, ante projeção inicial de avanço de 0,6%.
A realidade bateu à porta, diz especialista
Pesquisadora da área de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, Luana Miranda lembra que, no final do ano passado, após o resultado das eleições, dispararam as expectativas positivas de empresários e consumidores. No horizonte, a esperança de um governo liberal e uma agenda de reformas a ser tocada com entusiasmo.
— Mas chegou 2019 e a realidade bateu à porta — pondera Luana, referindo-se à inabilidade política do governo, inclusive com a sua base, a demora na tramitação e a possibilidade cada vez maior de desidratação da proposta de reforma da Previdência, que previa economia de R$ 1 trilhão em 10 anos.
O mercado de trabalho está muito lento, fraco, com níveis recorde de subutilização da mão de obra e desalento. Isso afeta setores que precisam do consumo para se recuperar.
FABIO BENTES
Economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC)
A economista-chefe da Tendências Consultoria, Alessandra Ribeiro, credita grande parte da frustração às confusões e contradições do governo, citando episódios como o mal-estar com países árabes importadores da carne brasileira pela intenção — depois revista — de mudar a embaixada de Tel Aviv para Jerusalém e a intervenção na Petrobras para segurar o preço do diesel. Além da falta de organização política do Planalto, a linha bolsonarista conflitante com o viés liberal da equipe econômica aumenta o grau de incerteza. Sem poder enxergar os próximos meses, a população segura o consumo e os empresários postergam ainda mais os investimentos, aponta Alessandra.
— Seria muito importante o governo tentar garantir a reforma da Previdência e melhorar o ambiente de confiança. Mas é o governo que cria as suas próprias crises, como meter a mão no preço do diesel e a briga (de Jair Bolsonaro) com o Maia — diz Alessandra, referindo-se ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia.
Diante da economia estagnada e da inflação ainda baixa, também começam a aumentar as apostas de que o Banco Central possa promover novos cortes na taxa Selic nos próximos meses. O juro básico da economia está estacionado em 6,5% ao ano desde o início de 2018.
Sinais desanimadores
Diversos indicadores mostram uma economia que está praticamente parada — em alguns setores, com pouco crescimento ou até no negativo.
Desempenho por setor
- Pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que os principais setores tiveram desempenho fraco nos dois primeiros meses do ano.
- No caso do comércio, após leve avanço em janeiro, não houve variação em fevereiro.
- Os serviços, segmento com o maior peso no Produto Interno Bruto (PIB), tiveram dois recuos consecutivos. A comparação é com o mês imediatamente anterior.
- A indústria até teve crescimento no segundo mês deste ano, mas que serviu apenas para compensar a queda de janeiro.
IBC-Br
- Considerado uma espécie de prévia do Produto Interno Bruto (PIB), o IBC-Br teve dois meses consecutivos de recuo. A queda de fevereiro foi a maior desde maio do ano passado, mês impactado pela greve dos caminhoneiros.
Desemprego
- Conforme o IBGE, no trimestre de dezembro de 2018 a fevereiro de 2019, eram cerca de 13,1 milhões de pessoas em busca de trabalho no Brasil.
- Houve aumento de 7,3% (mais 892 mil pessoas) frente ao intervalo imediatamente anterior, de setembro a novembro de 2018, quando a desocupação foi estimada em 12,2 milhões. Confira abaixo a evolução da taxa de desemprego (trimestre móvel encerrado no mês indicado).
Projeção do PIB
- À medida que o ano avança, a expectativa de alta da atividade da economia brasileira diminui.
- Analistas financeiros ouvidos pelo Banco Central cortam a previsão de aumento do PIB em 2019 há sete semanas seguidas.
- O auge do otimismo foi registrado na segunda edição do ano, quando a mediana indicava crescimento de 2,57%. Depois, estabilidade ou expectativas piores. Abaixo, a evolução da projeção de PIB para este ano.
Confiança empresarial e do consumidor
- O índice que mede a confiança empresarial (primeiro gráfico abaixo) caiu em março para o menor nível desde outubro de 2018.
- São feitas entrevistas feitas com empresários dos setores da indústria, de serviços, do comércio e da construção.
- A escala do indicador varia de zero (pessimismo total) a 200 pontos (otimismo total).
- O indicador que avalia a confiança do consumidor (segundo gráfico acima) recuou 5,1 pontos em março, na comparação com fevereiro, para 91.
- É o menor valor desde outubro de 2018. O índice varia de zero (pessimismo total) a 200 pontos (otimismo total).