A economia brasileira, que iniciou o ano iluminada por otimismo com projeções de reação mais consistente, de em torno de 3% em relação a 2017, se encaminha para fechar o primeiro semestre sob mau tempo. Bastou a chegada de uma nuvem carregada de incertezas políticas e turbulências no cenário externo para azedar estimativas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).
Acentuada com a greve dos caminhoneiros, a apreensão relacionada ao nível de retomada é ilustrada pelo mau humor no mercado financeiro, com a disparada na cotação do dólar, próxima dos R$ 4, e a bolsa de valores no vermelho.
— As perspectivas para a economia são desfavoráveis. Há instabilidade dentro do país, relacionada às eleições, e no cenário internacional — sintetiza o economista Fernando Ferrari Filho.
Depois de disparar nas últimas semanas, a cotação do dólar teve uma trégua nesta sexta-feira (8). Ao final da sessão, a moeda americana caiu 5,59%, para R$ 3,70, por conta da intervenção mais intensa do Banco Central (BC).
Na bolsa de valores, o dia foi marcado por nova queda. Desta vez, o recuo atingiu 1,23%, aos 72.942 pontos, menor patamar desde dezembro do ano passado – a última vez com fechamento abaixo desse nível ocorreu no dia 19 daquele mês, com 72.680.
— O mercado financeiro é influenciado, no cenário nacional, pela retomada fraca e por indefinições eleitorais. O ambiente externo também mudou nos últimos meses. O desempenho da economia é lento, gradual e errático — declara o economista-chefe da Geral Investimentos, Denilson Alencastro.
O temporal no mercado internacional está relacionado ao temor de alta no juro nos Estados Unidos em velocidade mais elevada do que a esperada inicialmente. Com taxas maiores, o país se tornaria ainda mais atraente a investimentos hoje aplicados em mercados emergentes, como o brasileiro, onde os riscos são mais acentuados.
— O cenário externo não está mais ajudando — define o economista Mauro Rochlin, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Antes da greve dos caminhoneiros, o Brasil registrou números positivos como o avanço de 0,8% na produção industrial em abril, segundo o IBGE. Apesar disso, as perdas causadas pela paralisação ameaçam o resultado do setor no mês seguinte.
— A recuperação é lenta e descontínua como um todo. Seria importante que o desempenho na indústria fosse mais forte no primeiro semestre. O resultado de maio deve ser ruim por causa da greve. É um cenário que caminha para a apreensão em meio ao horizonte eleitoral — sublinha o economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rafael Cagnin.
Mesmo com o término da paralisação dos motoristas, empresas de diferentes segmentos são atingidas por impactos como o crescimento nos custos de transporte de mercadorias. A alta é atribuída à tabela de preços mínimos de fretes, elaborada pelo governo de Michel Temer para colocar fim à greve. No Rio Grande do Sul, o avanço pode chegar a 150% em alguns trajetos, conforme a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs).
Na sexta-feira, horas após anunciar remodelação na política de piso ao custo para translado de cargas, o Palácio do Planalto recuou e suspendeu a medida.
Para Rochlin, os efeitos da paralisação devem frear o desempenho do PIB nacional de todo o ano, e não apenas no segundo trimestre. O economista calcula perda de até 0,5 ponto percentual no indicador ao final de 2018:
— No começo do ano, já era imaginado que o país sentiria a falta de maiores investimentos de empresas. Agora, depois da greve, a situação ficou ainda mais difícil.
Entre janeiro e março, o PIB avançou 0,4%. O leve aumento, puxado pelo tradicional bom momento da agropecuária no período, reforçou preocupações para o restante do ano. Em maio, o governo federal reduziu sua previsão de crescimento da economia em 2018 de 2,97% para 2,5%.
A economista-chefe da Fecomércio-RS, Patrícia Palermo, faz projeção ainda pior:
— Haverá recuperação no PIB ao final do ano, mas aquém da esperada inicialmente. Se a alta chegar a 2%, será algo bastante otimista.
Controle da inflação sob ameaça
Na tentativa de retomada da economia, a inflação é um dos poucos cenários de céu azul até o momento. Em maio, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiu 0,4%, mas continuou abaixo do piso da meta do Banco Central (BC) para o acumulado de 12 meses, que é de 3%. Nessa base de comparação, o IPCA ficou em 2,86%, a menor marca desde o início do Plano Real, em 1994.
Mas especialistas alertam que, em junho, o indicador deve apresentar alta mais intensa devido à pressão nos preços causada pela greve dos caminhoneiros no fim do mês passado. A elevação ocorreu porque, durante a paralisação, houve desabastecimento de produtos. Com menos oferta, os valores cobrados sobem.
— A paralisação afetará, com certeza, a dinâmica dos preços — comenta o economista Fernando Ferrari Filho.
No segundo semestre, as incertezas da corrida eleitoral devem seguir no radar de empresários. Por conta das interrogações das urnas, o investimento de companhias no país tende a seguir nublado, assinalam economistas.
Outro fator que joga contra a reação é o desemprego em patamar elevado. No trimestre encerrado em abril, a taxa de desocupação subiu para 12,9% em relação ao período imediatamente anterior, segundo o IBGE. Isso significa que pelo menos 13,6 milhões de brasileiros estavam sem trabalho. A falta de emprego, frisam analistas, tende a dificultar o avanço de negócios em setores como o varejo.
— O consumo das famílias segue em retomada no país, mas em vigor menor do que o esperado. No início do ano, era estimada reação maior — menciona a economista-chefe da Fecomércio-RS, Patrícia Palermo.
No horizonte de analistas, não está descartada eventual alta no juro básico do país até o fim deste ano. A próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), do BC, está marcada para os dias 19 e 20 deste mês.
No último encontro, em maio, política vista como estimulante à retomada da economia foi interrompida. Depois de 12 cortes seguidos, o comitê manteve o juro básico em 6,5% ao ano, menor patamar já registrado. A redução na taxa Selic era vista como esforço para alavancar o consumo, destravar investimentos de empresas e, consequentemente, abrir o tempo para crescimento do PIB.