O distanciamento social imposto pelo coronavírus no mundo está mudando a maneira que as pessoas se envolvem umas com as outras – seja nas relações amorosas ou de amizade. Casais que moram sob o mesmo teto precisam lidar com a intensa convivência a dois (ou mais, se tiverem filhos) – e seus prazeres e desafios. Os solteiros têm buscado outras formas de se relacionar: pode ser recorrendo a conversas mais apimentadas por mensagens de aplicativos ou encontros via videochamadas.
Ainda que seja por conta de um cenário de tensão nada agradável do lado de fora, parece que, para casados ou não, o isolamento instigou novas possibilidades quando o assunto é sexo. Nos últimos dois meses, o mercado erótico local viu suas vendas dispararem, em contrapartida ao restante do comércio, que teve de fechar as portas para conter o avanço da pandemia.
Sex shops consultadas por Donna apontaram um salto na busca por produtos que proporcionam diversão para quem está sozinho (ou acompanhado) em casa. E a alta procura continua. Tudo pela internet, é claro.
– Nas primeiras semanas da pandemia, foi devagar (o movimento). Acho que as pessoas não tinham cabeça para nada, nem para namorar. Mas depois, as vendas começaram a subir descontroladamente. Tivemos uma alta de 200% – afirma Rodrigo Albuquerque, diretor do e-commerce da sex shop Hot Pepper, embora sem divulgar números do faturamento.
O negócio existe há oito anos e tem duas lojas físicas em Porto Alegre, de onde vinham o maior faturamento da empresa. Mas com os dois estabelecimentos até então fechados por decreto, o jeito foi comprar online mesmo:
– Acho que o confinamento fez as pessoas se descobrirem e buscarem coisas diferentes – analisa Ana Luiza Migliavaca, esposa e sócia de Rodrigo no negócio. As unidades já foram reabertas, com restrições, mas as vendas pelo site e Whatsapp continuam.
A psiquiatra e sexóloga Carmita Abdo acredita que o interesse sexual das pessoas foi crescendo conforme as incertezas diante do futuro da covid-19.
O sexo ainda é um tabu muito grande, usar esses produtos também, mas acho que agora as pessoas estão tendo essa oportunidade de explorar melhor as sensações no próprio corpo e têm até mais tempo para desenvolver esse autoconhecimento.
LUANA LUMERTZ
dona de sex shop
– Em um confinamento sem data para terminar ou que é sucessivamente adiada, a necessidade sexual começou a se tornar mais presente, e as pessoas foram procurar uma alternativa. É uma forma indireta de se avaliar como as pessoas estão praticando sexo na pandemia – comenta a coordenadora do ProSex, Programa de Estudos em Sexualidade da USP. – Esses números demonstram que houve mesmo uma adesão às recomendações (das autoridades de saúde). De fato, parece que as pessoas estão cuidando para não fazer um sexo de risco – pontua.
E o boom nas sex shops não foi só no Brasil. A empresa alemã de sex toys, Womanizer, noticiou que suas vendas aumentaram cerca de 50% em relação ao previsto nos primeiros meses de 2020. O crescimento aconteceu principalmente nos países mais afetados pelas medidas de restrição, como a Itália e a França.
Os queridinhos da vez
O perfil do comprador de uma sex shop é cheio de mitos. Embora mulheres na faixa dos 25 a 35 anos sejam a maioria entre os consumidores, especialmente quando se fala de uso individual, muitos pares têm testado produtos eróticos nas suas relações. A compra pode estimular um casal a conversar mais sobre suas preferências sexuais.
– Muitas pessoas que estão sozinhas foram em busca dos sex toys para ajudar a aliviar as tensões desse período, e as que estão acompanhadas de parceiros ou parceiras estão na busca de inovar as coisas – explica Clariana Leal, uma das donas da Climaxxx, sex shop online voltada exclusivamente para o prazer feminino.
Entre as lojas consultadas, o campeão de vendas no período foi o Satysfier, nome de um dos modelos de sugador de clitóris. O produto, queridinho no exterior, ganhou status depois de ter aparecido nas redes sociais de Anitta. A cantora mostrou aos seguidores seu "companheiro de viagem" dizendo:
– Ele me salvou.
Bastou para que o brinquedinho esgotasse nas lojas do ramo.
Os vibradores e estimuladores de clitóris ainda reinam entre os mais vendidos, mas os produtos das sex shops são diversos. Elas têm óleos de massagem, cremes excitantes, géis para aquecer ou gelar, anestesiar, com sabor, jogo de cartas sensual (no estilo "verdade ou consequência") e por aí vai. Ainda sobre este mês, o mercado erótico segue otimista, especialmente com a proximidade do Dia dos Namorados, em junho, a melhor data para o ramo.
– No começo, achava que ia vender superbem e que depois ia diminuir. Mas para a minha surpresa, a gente ainda continua com um faturamento altíssimo. O sexo ainda é um tabu muito grande, usar esses produtos também, mas acho que agora as pessoas estão tendo essa oportunidade de explorar melhor as sensações do próprio corpo e têm até mais tempo para desenvolver esse autoconhecimento – opina Luana Lumertz, que divide a sociedade da sex shop Egalité com a mãe e mantém um canal no Youtube com conteúdos sobre sexualidade, que soma mais de 185 mil seguidores. A loja delas também opera exclusivamente pela internet.