Em sua primeira temporada, House of the Dragon precisava fazer muitas coisas: apresentar personagens, seus relacionamentos e divergências políticas ao longo de décadas de história, incluir cenas de batalha e de dragões e, principalmente, reconquistar fãs de Game of Thrones decepcionados com seu final. Deu certo.
Nesta segunda temporada da série baseada em Fogo & Sangue, de George R.R. Martin, que estreou neste domingo (16) na HBO e Max, com episódios semanais, o showrunner Ryan Condal abre as suas asas.
De um lado, está o Conselho Preto, ou os Pretos, liderados por Rhaenyra Targaryen (Emma D'Arcy), filha mais velha do rei Viserys (Paddy Considine) e declarada por ele sua herdeira. Do outro, está o Conselho Verde, ou os Verdes, que em uma manobra da rainha Alicent (Olivia Cooke), segunda mulher de Viserys, e do pai dela, o Mão do Rei Otto Hightower (Rhys Ifans), colocaram Aegon (Tom Glynn-Carney), filho mais velho de Alicent e Viserys, no trono.
Quem são os Pretos e quem são os Verdes?
Os fãs de House of the Dragon se dividem como seguidores de divas pop ou torcidas de futebol entre os Pretos e os Verdes. Mas quem são eles?
Conselho Preto: Rhaenyra Targaryen, seu marido/tio Daemon Targaryen (Matt Smith), Corlys Velaryon (Steve Toussaint), Rhaenys Targaryen (Eve Best), Jacaerys Velaryon (Harry Collett), Joffrey Velaryon (Oscar Eskinazi), Baela Targaryen (Bethany Antonia) e Rhaena Targaryen (Phoebe Campbell).
Conselho Verde: Alicent Hightower, Otto Hightower, Aegon II Targaryen, Aemond Targaryen (Ewan Mitchell), Helaena Targaryen (Phia Saban), Criston Cole (Fabien Frankel), Tyland Lannister (Jefferson Hall) e Larys Strong (Matthew Needham).
George R.R. Martin participou da segunda temporada?
Ryan Condal disse em entrevista coletiva que sua preocupação, na primeira temporada, era se alguém ia assistir:
— Por que você está vindo na sequência da série de maior sucesso de todos os tempos. Como suceder a Game of Thrones? Não dá. Você apenas tenta fazer algo bom que se sustente sozinho.
Condal criou a série junto com George R.R. Martin e teve Miguel Sapochnik, que dirigiu alguns dos maiores episódios de Game of Thrones, como Hardhomme e Battle of the Bastards, dividindo a posição de showrunner (é o produtor que dá a direção criativa para a série e comanda a sala de roteiristas).
George R.R. Martin, criador não só desse universo como desta série, não está diretamente envolvido na segunda temporada de House of the Dragon.
— Ele escreveu o livro, então, de certa forma, está sempre conosco — destacou o showrunner. — Mas está ocupado demais. Ele tem consciência do que estamos fazendo, estamos em contato. Mas, agora que já transpusemos bem Fogo & Sangue para a tela, estamos operando sozinhos.
Sapochnik saiu da posição de showrunner e não dirige nenhum episódio nesta temporada —na anterior, ele comandou três dos 10. Em compensação, Alan Taylor, diretor de sete episódios de Game of Thrones, é responsável por dois episódios, o primeiro e o quarto.
Relembre a primeira temporada de House of the Dragon
Atenção: o texto a seguir contém spoilers.
House of the Dragon se passa 200 anos antes dos eventos de Game of Thrones. Viserys Targaryen, Viserys I, ascendeu ao Trono de Ferro depois de uma disputa sucessória.
Ele era o filho mais velho do segundo filho do rei Jaehaerys, enquanto a sua prima Rhaenys (Eve Best) era a única filha do filho mais velho de Jaehaerys. Como a dinastia Targaryen ainda era recente e as regras de sucessão não eram claras, os lordes de Westeros se reuniram para decidir quem deveria ser o herdeiro.
Temendo colocar uma mulher na posição, eles elegeram Viserys. O drama se repetiu com ele, cuja mulher, Aemma (Sian Brooke), morre no parto tentando dar a ele um herdeiro homem. O rei só tem uma filha, Rhaenyra (Milly Alcock na adolescência).
Por causa do precedente, o trono deveria ir, então, para o irmão de Viserys, Daemon (Matt Smith), mas ele é considerado violento e instável para ser rei. Viserys acaba escolhendo Rhaenyra e consegue a aprovação de boa parte dos lordes de Westeros.
Enquanto isso, o Mão do Rei, Otto Hightower, manipula a filha Alicent (Emily Carey), obrigando-a a confortar o rei em seu luto. Não demora, e Viserys decide se casar com Alicent, provocando uma ruptura entre ela e Rhaenyra, que eram melhores amigas.
Alicent (vivida na fase adulta por Olivia Cooke) dá à luz quatro crianças: Aegon (Ty Tennant/Tom Glynn-Carney), Helaena (Evie Allen/Phia Saban), Aemond (Leo Ashton/Ewan Mitchell) e Daeron.
Em seus últimos momentos, Viserys delira sobre a Canção do Gelo e Fogo, a profecia que ele tinha revelado a Rhaenyra quando a escolheu como herdeira. A profecia faz ligação com Game of Thrones e fala como Aegon, o Conquistador, o primeiro Targaryen a reinar em Westeros, tinha sonhado com o final dos tempos, com uma ameaça vinda do Norte. Segundo Aegon, para impedir o fim da humanidade, um Targaryen, o príncipe (ou princesa) que foi prometido/a, teria de estar sentado no Trono de Ferro.
Alicent entende os murmúrios de Viserys como uma mudança de posição do rei, desejando que o seu filho Aegon ocupe o trono — esta é a inconveniência de repetir nome na família. Ela e Otto correm para coroar Aegon publicamente, enquanto Rhaenyra está no castelo da família em Pedra do Dragão, ao lado do marido, Daemon (sim, o tio). Verdes e Pretos correm pelo reino em busca de apoio para as suas causas.
Aemond, que tinha perdido um olho na adolescência por culpa de Lucerys Velaryon (Elliot Grihault), filho de Rhaenyra, nunca se conformou pela falta de punição ao sobrinho. Ele ataca Lucerys no ar, com seu dragão Vhagar, matando o dragão do sobrinho e o rapaz.
Tomada de ódio, Rhaenyra quer vingança.
Como é a segunda temporada
A segunda temporada — que, aliás, tem nova abertura — começa com este espírito, mas não parte para a batalha logo de cara, o que não significa marasmo, palavra inexistente em Westeros.
— Não dá para encher oito episódios com dragões lutando — disse o showrunner Ryan Condal em entrevista coletiva. — É preciso engajar as pessoas com os personagens e as histórias entre eles, para que, quando o espetáculo vier, elas se preocupem com as pessoas envolvidas e saiam emocionadas dessas cenas de ação.
A primeira sequência não tem nada de espetacular e, no entanto, toca fundo no coração do fã. O canto de um corvo anuncia que o espectador está em território para lá de conhecido: Winterfell, onde Jacaerys (Harry Collett), filho mais velho de Rhaenyra, chega para conquistar o apoio do Lorde Cregan Stark (Tom Taylor, que na série Legends curiosamente fez uma versão mais jovem de Sean Bean, intérprete de Ned Stark em Game of Thrones).
Winterfell não é a única parte visitada por House of the Dragon na segunda temporada, que mostra como a confusão pela coroa afeta os sete reinos. A guerra entre Verdes e Pretos é inevitável.
— Os dois lados compartilham muita história e se detestam. Esse ódio vai piorando conforme as tragédias se acumulam — disse Condal.
Como diz Rhaenys em dado momento, no fim das contas ninguém vai se lembrar de quando a guerra começou. Foi quando o trono foi usurpado pelos Verdes? Ou quando Aemond matou Lucerys? Ou lá atrás, quando Lucerys cegou Aemond?
— Mas a morte de Lucerys é um marco — disse Condal. — Qual vai ser o contragolpe? Aqui era muito importante mostrar quais as motivações de cada personagem e o que os torna fracos e fortes, o que eles querem e amam.
O problema é que dos dois lados há vozes moderadas e outras dispostas a agir no calor do momento, e um luto triplo — por Viserys, por Lucerys e pelo bebê que Rhaenyra esperava — é capaz de cegar. A resposta vem rápida e é uma tragédia daquelas praticamente impossíveis de perdoar. O luto que permeia toda a temporada vai terminar em mais luto e banhos de sangue.
— Daemon perdeu tudo — disse Matt Smith. — O luto é o catalisador desta temporada, começando pela morte do irmão. Daemon sente sua falta, mas não sabe falar disso. Ele fica maluco, o que é ótimo de interpretar.
Olivia Cooke concordou:
— Meu maior desafio foi o que fazer com minha cara ao interpretar diferentes tipos de luto, trauma e tristeza — disse, com bom humor, a atriz que interpreta Alicent.
Ryan Condal disse que Olivia Cooke estava sendo modesta demais:
— Alicent precisa deparar com o fato de ter conseguido o que foi criada para fazer, que era elevar a posição de sua família. Agora ela tem um filho sentado no Trono de Ferro. Mas, por isso, seu próprio poder foi reduzido.
Alicent é filha de seu pai e, como ele, tenta ser uma voz de moderação junto ao impulsivo Aegon. Do outro lado, Rhaenyra procura fazer jus aos 80 anos sem guerras que herdou do bisavô, Jaehaerys, e do pai, Viserys. Mas talvez seja tarde demais para a paz.
Spoilers dos quatro primeiros episódios
O grande diferencial do universo Game of Thrones são suas grandiosas cenas de ação, sejam as batalhas, os dragões ou as batalhas com dragões. Quem conhece Fogo & Sangue talvez espere sangue e vísceras a cada episódio. Mas a segunda temporada de House of the Dragon diminuiu as cenas muito brutais, como aquelas dos partos de Aemma e Rhaenyra na primeira temporada. Ryan Condal realmente leva um tempo para escalar o conflito entre os Pretos e os Verdes — ainda bem.
Para quem gosta de torcer pelos personagens, por mais odiosos que sejam — estou olhando para você, Criston Cole —, a metade inicial desta segunda temporada é um deleite. Há muitos embates vocais, com diálogos cortantes, em quartos e salas de conselho.
Também há muita política. Tanto Alicent quanto Rhaenyra precisam se impor, cada uma à sua maneira, para serem ouvidas, mesmo tendo muito a dizer.
Alicent tem de moderar os dois filhos, Aegon e Aemond, além de Criston Cole, o Senhor Comandante da Guarda Real, todos cabeça quente. Rhaenyra precisa segurar o marido Daemon e o filho mais velho, Jacaerys. Ela ganha aliadas poderosas em Rhaenys e Baela, sua enteada.
Alicent e Rhaenyra são personagens femininas raras em sua complexidade, e elas são honradas com interpretações fortes de Olivia Cooke e Emma D'Arcy. Outros também brilham, no entanto. Mesmo que Paddy Considine faça falta, Matt Smith, Eve Best, Steve Toussaint, Rhys Ifans e Ewan Mitchell formam um elenco sólido.
As protagonistas são mães e entendem as repercussões das guerras. As duas compreendem que os homens têm desejos de glória que passam pelo sangue, como viram no torneio brutal lá no primeiro episódio da primeira temporada. Pode soar como um clichê, mas a violência gera mais violência. A guerra deveria ser o último recurso, e não o primeiro, mesmo quando há sede de vingança.
House of the Dragon não trata os dragões como seres fofinhos que obedecem à sua mãe. As pessoas podem ficar fascinadas por eles, mas têm pavor deles, com razão. Em um mundo em que eles ainda eram comuns, um avistamento distante é motivo de pânico, porque não dá para saber se o dragão é amigo ou inimigo e se vai realmente ser controlado por seu montador. Um poder desses não pode ser utilizado de maneira leviana, e Alicent, Rhaenyra e a própria série sabem disso.
A guerra também afeta a população comum, as pessoas pobres que já sobrevivem com pouco. Se algumas vezes em Game of Thrones elas eram tratadas apenas como massas a serem salvas, conquistadas ou destruídas, nesta segunda temporada há a chance de ver o seu drama um pouco mais de perto.
Todos esses passos fazem com que, quando massacres acontecem, o espectador sinta. Não há glorificação da guerra e da violência. Quando finalmente dragões entram na batalha, o público entende as consequências para o mundo e para os personagens, queridos ou não, Pretos ou Verdes.
Aquelas cenas têm impacto porque sabemos tudo o que aconteceu até chegar ali, por que aquelas pessoas são como são e agem como agem. São poucas as séries que conseguem deixar quem assiste literalmente de boca aberta. House of the Dragon, como Game of Thrones, é uma delas.
A Casa do Dragão vai ter terceira temporada?
Sim. Antes mesmo da estreia da segunda, a HBO já confirmou a terceira temporada da série.