Se nas terças, o Ocidente é do Sarau Elétrico e as sextas e sábados são de festa, as quintas são de música ao vivo. Há 22 anos, o "Ocidente Acústico", projeto mais antigo da casa, promove shows de artistas locais. Nesta quinta-feira (5/5) será especial: duas bandas gaúchas foram reunidas para tocar na milésima edição: a Graforréia Xilarmônica, às 22h, e a Ultramen, às 23h30min.
As duas bandas têm ligação forte com o projeto, mas nenhuma fará um show acústico. Desde sempre o nome "Ocidente Acústico" causa confusão, mas tem explicação histórica. Depois de interditado por dois anos, o Ocidente foi reaberto em 1997 e, em janeiro de 1998, retomava aos poucos as atividades noturnas. Então o proprietário da casa, Fiapo Barth, fez um pedido ao idealizador do projeto, Márcio Ventura:
— Pedi para que tivesse a palavra acústico no nome para evitar que pessoas que jamais botaram os pês lá imaginassem uma coisa barulhenta. Mas, desde o começo, a ideia era que fosse tão acústico quanto o MTV Acústico... — brinca Fiapo. — O Bom Fim não era um lugar para shows. Não era um lugar para quase nada, era um bairro escuro, calado. Ninguém pedia para fazer show porque parecia que o Ocidente já tinha acabado.
Integrante da Graforréia Xilarmônica, Frank Jorge estava na primeira edição do "Ocidente Acústico", em 16 de janeiro de 1998, mas como integrante dos Cowboys Espirituais, que faziam sua estreia.
— Era só uma junção de amigos do Julio Reny, para gravar uma compacta que ele ia fazer para a namorada, mas acabou virando banda. O primeiro show foi de acordo com a proposta do bar, não tão barulhento. Foi muito legal, mas não dava para dimensionar que se tornaria uma quinta-feira bem definida, um espaço para a música autoral — lembra o cantor e compositor.
Em 28 de janeiro de 2000, Frank estava de volta para outro show histórico, a despedida da Graforréia. O repertório que a banda tocará nesta quinta não será muito diferente daquele dia já que desde então não lançou mais discos.
Já a Ultramen tocará seu quinto disco de inéditas, Tente Enxergar, de 2018, e alguns sucessos. A banda, que já chegou a fazer cem shows em um ano, também se apresenta com menos frequência ultimamente. Seus integrantes têm projetos paralelos e alguns moram fora de Porto Alegre. Ninguém confirma uma jam entre a Ultramen e a Graforréia, mas há chances. Afinal o maior clássico da segunda, Amigo Punk, já foi parte do repertório da Ultramen.
Noites históricas
Pouco depois da estreia, ainda em 1998, o projeto ganhou aspas no nome. Bastante eclético, abrange shows autorais e cover de MPB, rock, pop, jazz, funk etc. A lista de atrações inclui Darma Lóvers, Wander Wildner, Apanhador Só, Dingo Bells e muitos outros.
— Só não incluímos bandas de hard core ou metal porque aí sim o nome ficaria estranho — observa Márcio, admitindo que pagode e sertanejo também não entram.
Algumas noites foram o exato oposto de silenciosas. A mais ruidosa foi protagonizada pela Cachorro Grande em 2000:
— A Cachorro Grande fez temporada de três quintas. No fim da terceira, com casa cheia, eles começaram a quebrar todas as janelas do bar. O bumbo ficou entalado numa janela e por pouco não caiu na Osvaldo. Os taxistas queriam entrar no bar pra bater o Boizinho (o baterista Gabriel), que teve que sair fugido. Hoje dá para rir, mas foi o quadro do terror e do desespero, o pior dia da minha vida — relembra Márcio.
Naquele dia, o produtor teve certeza que o projeto morreria, assim como a sua carreira. Mas o empresário da banda pagou o prejuízo.
— O Fiapo não falou nada pra mim. Mas só foi ter show de um deles de novo lá em 2019 (solo de Marcelo Gross). Meu grande agradecimento ao Fiapo é ter deixado o projeto andar, mesmo quando teve pouco público e pouca grana. Só saio quando ele me mandar embora — diz o organizador.
Com relação a público, a pior época foi quando o projeto ocorria às quartas, tradicional dia de jogos de futebol. Mas o produtor garante nunca ter cancelado um show por vender poucos ingressos. Aliás, Márcio também está a frente de um projeto ainda mais desafiador (e tradicional) de Porto Alegre: a Segunda Maluca, que traz bandas de fora do Estado para tocar em uma segunda-feira por mês.
— É uma coisa meio camicase, mas quando tu contrata alguém tem que ir até o fim. Tem shows que tu tem que fazer porque têm um significado maior do que o interesse momentâneo do público.
Imprevistos não faltaram no "Ocidente Acústico". Em um show do Fernando Noronha, a mesa de som estragou e foi consertada por alguém do público. O bar todo já foi alagado após um show da banda Locomotores.
Mas Márcio se anima falando das surpresas boas, como descobrir bandas (a última que o empolgou foi Musa Híbrida) ou a vez em que a cantora Cássia Eller apareceu em um show da Groove James no Ocidente logo após cantar no Teatro do Sesi e acabou dando uma canja de seis músicas.
Em seus 22 anos, o projeto mudou junto com a cena musical de Porto Alegre. As bandas de rock dos anos 2000, como Cartolas, Identidade e Superguidis, deram espaço à música brasileira de bandas como Roda Viva. Nome frequente da programação, o cantor Tonho Crocco, da Ultramen, reforça a importância do projeto para a história da cidade:
– O Márcio é dessa geração que acreditou na música do seu tempo, dos anos 90, 2000, 2010. É incansável, um cara que tem ouvido, mas quer retorno financeiro, mescla bem os trabalhos de intérprete com os autorais. Nunca deixou de acreditar. Qual o projeto que tem mil edições? Qual produtor faz isso? Que bar?
“Ocidente Acústico” edição 1000
- Quinta-feira (5/3), no Ocidente (Av. Osvaldo Aranha, 960), às 22h (Graforreia Xilarmônica, no palco Espaço OX) e às 23h0min (Ultramen, no palco Ocidente )
- Discotecagem: Katia Suman e Claudio Cunha
- Ingressos: R$ 30 (meia-entrada), R$ 45 (solidário, com a doação de um quilo de alimento), R$ 60 (inteira).
- Informações e pontos de venda: (51) 3012-2675 e barocidente.com.br
- Próxima quinta-feira (12/3): Mil e Uma Noites de Tim... com Projeto Tim Maia Racional, Projeto Tim Maia lado B e Tributo a Tim Maia.