Estreia nesta quinta-feira (2) na Sala Eduardo Hirtz — e somente no horário das 14h45min — Plano 75 (Plan 75, 2022), filme japonês que imagina um futuro sombrio: para conter o envelhecimento da população do país asiático, o governo incentiva os cidadãos com 75 anos ou mais a participarem de um programa de eutanásia.
A pirâmide etária do Japão é um problema real. A população vem encolhendo desde 2008, quando, pela primeira vez, o número de mortes superou o de nascimentos. A parcela de idosos é cada vez maior. Hoje, 29,4% dos cidadãos têm mais de 65 anos, e a expectativa de vida dos 126 milhões dos habitantes é de 85 anos. A escassez de mão de obra se soma ao aumento dos gastos governamentais com a previdência social e a saúde.
Esse é o contexto que originou o primeiro longa-metragem da diretora Chie Hayakawa, 47 anos, que divide a autoria do roteiro com o britânico Jason Gray.
— Penso que Plano 75 diz respeito à atmosfera de intolerância com as pessoas socialmente fracas, incluindo os idosos. Não temos essa lei de verdade, mas tudo o mais retratado no filme existe, como o fato de que há tantos idosos que precisam trabalhar por causa do sistema previdenciário frágil, que eles têm dificuldade em encontrar um lugar para viver, que se sentem excluídos da sociedade e que tendem a hesitar em procurar ajuda do governo por sentimento de vergonha. Existe um clima de pressão sobre os idosos que faz com que se sintam inúteis — diz Hayakawa no material de divulgação de Plano 75, filme escolhido pelo Japão para buscar uma vaga no Oscar internacional de 2023 (foi eliminado antes da lista semifinal).
A trama começa no dia da aprovação da lei que dá título à obra. Como forma de protesto à notícia veiculada na imprensa, um homem realiza ataque armado em uma instituição para idosos e depois comete suicídio. Três anos depois, porém, o tal Plano 75 já é encarado com normalidade pela sociedade — é uma crítica da diretora à inércia e à insensibilidade que podem nos contaminar.
Apesar do que a sequência de abertura sugere, Plano 75 não tem qualquer tipo de cena de ação. É uma distopia observacional e reflexiva. Hayakawa adota um ritmo bastante contemplativo, alongando os planos à beira do exasperante, enquanto acompanha quatro personagens. Michi Kakutani (interpretada por Chieko Baishô) é uma idosa que, por questões econômicas, está tentada a aderir ao programa de eutanásia — cada voluntário recebe US$ 1 mil para gastar antes de morrer ou então deixar para a família. Yoko (Yumi Kawai) é uma funcionária do governo que, por telefone, cuida de trâmites burocráticos. Hiromu (Hayato Isomura) é encarregado de atrair participantes — mas ele entra em uma espécie de crise ao deparar com um tio, Yukio, de quem seu pai havia se afastado.
Através de Hiromu, a diretora disse querer atualizar a noção de laços familiares na sociedade japonesa. Segundo a cineasta, aquela imagem da ligação forte entre os filhos e os pais ou os avós não corresponde mais à realidade contemporânea:
— A falta de vínculo é um dos motivos para tornar as pessoas apáticas com os outros. Esses dois personagens jovens, Yoko e Hiromu, passam a sentir simpatia por Michi e Yukio. Acho que ter compaixão é a chave para lutar contra a intolerância e a apatia. Queria retratar uma esperança na percepção desses dois jovens.
O quarto foco narrativo é uma moça filipina, Maria (Stefanie Arianne), que vai trabalhar no setor funerário do Plano 75. Chie Hayakawa constrói uma cena que conecta esse futuro possível a um passado inolvidável: quando Maria e seu superior estão separando os pertences dos mortos, lembramos do que os nazistas faziam com os judeus exterminados na Segunda Guerra Mundial.