Se a propaganda boca a boca fizer a sua parte, 2 Coelhos (2012) tem tudo para entrar no top 10 da Netflix, plataforma de streaming que acaba de adicionar o filme a seu menu. Aliás, aí está uma dica para comemorar, nesta segunda-feira (19), uma das duas datas do Dia do Cinema Brasileiro.
O 5 de novembro lembra a exibição pública inaugural: em 1896, foram projetados oito curtas-metragens para a elite do Rio de Janeiro, na Rua do Ouvidor. No dia 19 de junho de 1898, o ítalo-brasileiro Affonso Segretto, a bordo de um navio, registrou as primeiras imagens em movimento no país — sua chegada à Baía da Guanabara.
2 Coelhos reúne algumas características de filmes que bombaram na Netflix recentemente. É um filme de ação, como Resgate 2 (2023), tem uma forte pegada tarantinesca, como Sangue e Ouro (2023), e oferece aos usuários uma oportunidade de conhecer ou rever um título lançado há muitos anos, como A Promessa (2001) e Os Suspeitos (2013).
O filme foi escrito e dirigido pelo então estreante Afonso Poyart, paulista de Santos que depois assinaria Presságios de um Crime (2015), rodado em Hollywood com Anthony Hopkins e Colin Farrell, e Mais Forte que o Mundo: A História de José Aldo (2016). Seus créditos incluem os 22 episódios da série Ilha de Ferro (2018-2019), estrelada por Cauã Reymond e Maria Casadevall.
2 Coelhos divide opiniões. O que é virtude para uns será defeito para outros. Uns vão dizer que o longa-metragem copia Quentin Tarantino e Guy Ritchie, e que o cinema brasileiro não deveria importar fórmulas. Outros entendem que a obra, à época de seu lançamento, preenchia uma lacuna na cinematografia nacional, a do subgênero dos filmes de roubo (descontando o tinhoso Assalto ao Banco Central, que havia estreado um ano antes, em 2011).
Estou entre os que consideram 2 Coelhos um dos melhores filmes de ação já realizados no país. Não deve nada a Hollywood (a não ser, claro, a inspiração estilística).
Na trama ambientada em São Paulo, Fernando Alves Pinto interpreta um carinha viciado em games e pornô que bola um plano para, ao mesmo tempo (daí o nome do filme), ganhar milhões de dólares e colocar em rota de colisão bandidos malvadões e políticos corruptos. No meio do caminho, ele cruzará com personagens como uma promotora maluquete, vivida por Alessandra Negrini, um garçom sorumbático, papel de Caco Ciocler, e um motoboy ladrão, o rapper Thaíde.
Filme a um só tempo despretensioso — não busca nada além de entreter, não há leitura política ou social a ser feita — e pretensioso (vide o esmero técnico, da fotografia, camaleônica nas cores, à montagem fragmentada), 2 Coelhos sabe divertir em seus 108 minutos de duração. O roteiro, apesar da boa dose de inverossimilhança, é engenhoso, com idas e voltas ao passado que vão revelando as ligações e as motivações dos personagens. Esses são imorais, mas acabamos simpatizando com eles — ajuda ter no elenco ótimos atores como Marat Descartes e Caco Ciocler, e figuraças como Thaíde e Thogun (a propósito do elenco: num lance tarantinesco, Poyart escalou Aldine Müller, musa das pornochanchadas dos anos 1970). As cenas de ação são espetaculares, com efeitos visuais espetaculares. E a trilha sonora é bacaníssima: tem Lenine, Titãs da fase áurea, Tom Waits e Radiohead.