Neste Sete de Setembro, Dia da Independência, a dica é assistir a filmes brasileiros.
Separei sete títulos que estão disponíveis em cinco plataformas de streaming: Globoplay, Netflix, Telecine, Google Play e YouTube. São quatro ficções, dois documentários e uma cinebiografia.
No conjunto da obra, os sete — quase todos premiados — pintam um retrato do nosso país, da nossa história, de nossa gente e de nossos problemas.
Cabra Marcado para Morrer (1984)
Primeira das grandes obras assinadas por Eduardo Coutinho (1933-2014), o mestre dos documentários, ganhou no Festival de Berlim o prêmio Fipresci, entregue pela federação internacional dos críticos de cinema. O filme é uma narrativa semidocumental da vida de João Pedro Teixeira, um líder camponês da Paraíba assassinado em 1962. Por causa do golpe militar em 1964, as filmagens foram interrompidas — parte da equipe acabou presa sob a alegação de "comunismo". Dezessete anos depois, Coutinho retomou o trabalho, recolhendo-se depoimentos dos camponeses que participaram das primeiras filmagens e também da viúva de João Pedro, Elizabeth, que desde dezembro de 1964 vivera na clandestinidade, separada dos filhos. (Globoplay e YouTube)
Tropa de Elite (2007)
Vencedor do Urso de Ouro no Festival de Berlim, o filme de José Padilha sobre a guerra do tráfico no Rio provocou um intenso debate: o diretor condena ou exalta a violência na ação dos policiais? Para uns, Tropa de Elite é uma radiografia da realidade do combate ao crime no Brasil, que mostra como a polícia se tornou corrupta e abusiva; para outros, o cineasta transforma o capitão Nascimento (interpretado por Wagner Moura) em herói, um justiceiro que acaba impondo a ordem pela força, à margem da lei, como única alternativa possível em um cenário em que a própria sociedade financia o negócio das drogas. O longa-metragem gerou uma continuação, Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora É Outro (2010), em que o protagonista já não sobe os morros cariocas — tem de lidar com a corrupção de políticos e agentes da segurança pública e o surgimento das milícias. (Globoplay, Netflix, Telecine, Google Play e YouTube; Tropa de Elite 2 está disponível nas mesmas plataformas, exceto a Netflix)
Xingu (2011)
Depois de mirar a ditadura militar pela visão de uma criança em O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias (2006), Cao Hamburger mergulhou mais fundo na história do país. Em Xingu, o cineasta visita os anos 1940 para reconstituir a aventura dos jovens irmãos Villas-Boas — Orlando (papel de Felipe Camargo), Cláudio (João Miguel) e Leonardo (Caio Blat) —, os fundadores da reserva indígena com mais de 2,6 mil hectares no norte de Mato Grosso. Cada irmão tem um perfil. Orlando, o mais velho, é o político; Leo, o caçula, é impetuoso; e Cláudio, o irmão do meio, é o idealista que expressa a contradição da expedição em meio a povos como os xavantes e os kalapalos: "Nós somos o antídoto e o veneno", afirma. (Telecine)
Branco Sai, Preto Fica (2014)
Essa foi a frase dita por um dos policiais que invadiram um baile de black music em Ceilândia, no Distrito Federal, em 1986. Combinando de forma inventiva o registro documental com a ficção científica, o diretor Adirley Queirós apresenta um contundente painel sobre a desigualdade racial no Brasil.
Seus protagonistas são dois homens que arrastam os efeitos daquela noite violenta. Marquim do Tropa ficou paraplégico. Shockito — apresentado no filme como Sartana — perdeu uma perna. Hoje, Marquim, que é DJ, reconstitui a tragédia fazendo rap. Sartana, artesão, produz ou conserta próteses para outros mutilados. Há um terceiro personagem, o agente Dimas Cravalanças (interpretado por Dilmar Durães), que vem do futuro para provar os crimes cometidos pelo Estado contra os excluídos, de modo que haja indenização, reparação, Justiça. O documentário conquistou os Candangos de melhor filme, ator (Marquim do Tropa) e direção de arte em Brasília e o prêmio de melhor filme latino-americano no Festival de Mar del Plata. (Netflix)
Que Horas Ela Volta? (2015)
Premiado nos festivais de Berlim, Sundance (Estados Unidos) e São Paulo, o filme de Anna Muylaert mostra a relação e os conflitos entre patrões e domésticas. Em uma atuação arrebatadora, Regina Casé interpreta Val, empregada em uma casa de classe média alta em São Paulo. Ela é "da família", mas quando sua filha chega de Pernambuco para prestar vestibular, a garota começa a questionar a desigualdade social e a não se conformar com as interdições — nem sempre explícitas — impostas pela elite. Jéssica (Camila Márdila) não sabe nem quer saber de "seu lugar": ao contrário da mãe, ela já entende que a sociedade não é estática. (Globoplay, Telecine, Google Play e YouTube)
Aquarius (2016)
Os protestos no Festival de Cannes, na França, tornaram o filme um símbolo da resistência cultural ao impeachment da presidente Dilma Rousseff e contra o governo Michel Temer. Com direção de Kleber Mendonça Filho, correalizador de Bacurau (2019), Aquarius conta a história de uma jornalista aposentada (Sônia Braga) de Recife que luta para defender o edifício onde morou a vida inteira do assédio de uma construtora. É uma obra sobre a preservação da memória e do afeto, com margem para a crítica ou a autocrítica: Clara, a protagonista, não deixa de ser uma burguesa que também usufrui de privilégios. Foi eleito o quarto melhor filme de 2016 pela revista francesa Cahiers du Cinema. (Globoplay, Netflix, Telecine, Google Play e YouTube)
Como Nossos Pais (2017)
A desigualdade de gênero no Brasil é o tema central do drama dirigido por Laís Bodanzky que recebeu seis Kikitos no Festival de Gramado: direção, atriz (Maria Ribeiro), ator (Paulo Vilhena), atriz coadjuvante (Clarisse Abujamra) e montagem. A protagonista, Rosa, está em crise diante do papel socialmente imposto de supermulher contemporânea, que deve dar conta da relação com o marido, educar os filhos, sustentar a casa e ainda manejar os conflitos com a própria mãe — que, em um almoço dominical, faz uma revelação desconcertante sobre o passado da família. (Netflix)