O HBO Max, plataforma de streaming que estreia nesta terça-feira (29) no Brasil, reúne uma coleção incrível de séries imperdíveis.
Afinal, o canal estadunidense HBO (abreviatura de Home Box Office) virou um sinônimo de qualidade e de vitórias no Emmy, a principal premiação da TV nos Estados Unidos — somente na edição de 2020, foram 30 troféus (a Netflix ficou em segundo lugar, com 21).
Fiz uma lista com cinco produções premiadas que estão entre as minhas preferidas de todos os tempos. Na verdade, levando em consideração a aprovação de outros críticos, dava para dobrar, triplicar ou até quintuplicar esta seleção. Ficaram de fora, por exemplo, duas obras recentes que ainda não vi: a comédia Barry (no ar desde 2018), sobre um matador de aluguel que decide virar ator, e a autobiográfica I May Destroy You (2020), sobre uma escritora que foi drogada e estuprada. Também poderiam ter entrado clássicos como Band of Brothers (2001) e The Wire (2002-2008), e Mare of Easttown (2021) só não figura aqui porque ainda está para concorrer a prêmios — portanto, não era "elegível".
Família Soprano (1998-2007)
Se a trilogia cinematográfica O Poderoso Chefão (1972, 1974 e 1990) glamorizou a figura dos mafiosos — a ponto de influenciar os criminosos da vida real—, com a Família Soprano (The Sopranos) eles se tornaram muito mais mundanos, muito mais humanos. Sua sequência de abertura já indicava um rumo diferente: deixamos a costumeira Nova York e pegamos a ponte para New Jersey. Lá, o criador David Chase e um time de roteiristas e diretores ambientaram menos uma série do que uma coleção de pequenos filmes centrados na família de Tony Soprano (interpretado por James Gandolfini), que usa uma empresa de coleta de lixo como fachada para seus negócios sujos, geralmente fechados na boate brega Bada Bing, e que procura uma psiquiatra quando começa a sofrer com crises de consciência e ataques de pânico. Algumas das histórias fogem do gênero policial e se aproximam do drama existencial. Outras alternam de forma impressionante sequências de sonho com explosões de violência.
O seriado é um marco na história da televisão. Suas seis temporadas receberam 112 indicações ao Emmy, com 21 conquistas — é um dos 15 programas mais premiados. Entre eles, estão dois de melhor série (2004 e 2007), três de ator (Gandolfini, em 2000, 2001 e 2003), três de atriz (Edie Falco, a Carmela Soprano, em 1999, 2001 e 2003) e seis de roteiro. Não à toa, acabou sendo escolhido pelo Sindicato dos Roteiristas dos Estados Unidos como o seriado mais bem escrito de todos os tempos, à frente de clássicos como Além da Imaginação e Seinfeld.
Roma (2005-2007)
Coproduzida pela BBC, do Reino Unido, filmada na Itália e com cada temporada (duas de 10 episódios) orçada em US$ 100 milhões, mostra a história da formação do Império Romano pelos olhos de dois soldados, entre os anos 52 antes de Cristo e 30 a.C. O certinho e casado Lucius Vorenus (vivido por Kevin McKidd) e o brigão e mulherengo Titus Pullo (Ray Stevenson) são nossos guias nos conturbados últimos anos do governo de Júlio César (Ciaran Hinds). Os dois acabam conquistando a simpatia de César e se envolvem nas suas reuniões com Cleópatra (Lyndsey Marshal), Marco Antônio (James Purefoy), Brutus (o ótimo Tobias Menzies, de The Crown), Otaviano e outras figuras notórias daquele período.
Roma — a série—foi criada por Bruno Heller, John Milius e William J. MacDonald. Embora mantenha a mania hollywoodiana de imprimir sotaque britânico a papéis de época, evita uma série de lugares-comuns. Por exemplo: as ruas não são limpas e organizadas como se via no cinema de antigamente, mas fétidas e tumultuadas. E, ao contrário do que poderia imaginar o espectador de filmes como Calígula (1979) e Gladiador (2000), há bem menos violência e sexo — a força do seriado são suas intrigas políticas. Ao todo, ganhou sete prêmios Emmy — os principais foram os de direção de arte (nas duas temporadas) e fotografia (na segunda).
True Detective (2014-2019)
A série criada por Nic Pizzolatto estreou sem maior badalação e conquistou público e crítica com sua peculiar estrutura narrativa e, sobretudo, pelo desempenho de seus protagonistas — Matthew McConaughey e Woody Harrelson. Os dois atores vivem tipos recorrentes nas tramas policiais: dois tiras que são como água e azeite e combinam seus perfis antagônicos numa convivência em alta tensão descarregada sobre um objetivo comum.
McConaughey e Harrelson vivem, respectivamente, o enigmático Rustin Cohle e o vulcânico Martin Hart, detetives que solucionaram um crime em 1995 e que estão, em 2012, dando explicações a dois policiais da região de Nova Orleans. Algo saiu dos trilhos nestes 17 anos, arrastando as vidas de Cohle e Hart por caminhos tortos, e um serial killer está nas ruas indicando que o caso supostamente resolvido pela dupla pode ter ficado com muitas pontas soltas.
Com oito episódios, a primeira temporada de True Detective (houve mais duas, com elencos diferentes) ferve em ritmo lento influências da literatura do gênero e do fantástico — como Robert W. Chambers, de O Rei de Amarelo —, temas como pedofilia e bruxaria e referências à série Twin Peaks (1990-1991), do cineasta David Lynch. No Emmy, venceu cinco categorias, incluindo direção (Cary Joji Fukunaga), e concorreu em outras sete — entre elas, melhor série dramática e melhor ator (em dupla indicação: McConaughey e Harrelson acabaram derrotados por Bryan Cranston, de Breaking Bad).
Chernobyl (2019)
O mundo lembrou recentemente os 35 anos do pior acidente nuclear da história. Foi o da usina de Chernobyl, ocorrido entre 25 e 26 de abril de 1986 perto da cidade de Pripyat, na Ucrânia — à época, ainda uma república pertencente à União Soviética (URSS). O número de mortos é controverso até hoje, porque o cálculo envolve não apenas as vítimas diretas (bombeiros que combateram o fogo, operários que limparam os destroços, moradores próximos ao local), mas também pessoas que sofreram os efeitos da contaminação — como casos de câncer ou de bebês nascidos com malformação. Uma versão ficcionalizada da tragédia, de suas consequências imediatas e das primeiras ações tomadas pelo governo soviético é o que oferece esta esplêndida minissérie em cinco capítulos — que ganhou assustadora atualidade durante a pandemia: cenas e falas parecem refletir o que vimos e ouvimos desde o surgimento do coronavírus.
Criada por Craig Mazin, Chernobyl arrebatou 10 prêmios Emmy, incluindo melhor minissérie, direção (Johan Renck) e trilha sonora original (Hildur Guðnadóttir, a mesma de Coringa e Trapped). Concorria a outros nove, entre eles melhor ator (Jared Harris, no papel do renomado químico Valery Legasov), atriz coadjuvante (Emily Watson, como a fictícia cientista Ulana Khomyuk) e ator coadjuvante (Stellan Skarsgård, que interpretou Boris Shcherbina, vice-presidente do Conselho de Ministros da URSS de 1984 a 1989, designado para supervisionar a gestão da crise desencadeada pelo acidente nuclear). O elenco multifacetado — que inclui Jessie Buckley como a esposa grávida de um bombeiro e Paul Ritter como o engenheiro que comandou o fatídico teste na usina — permite enxergarmos as dimensões científica, política e humana do desastre.
Watchmen (2019)
Um dos criadores do fenômeno Lost (2004-2010), Damon Lindelof é o responsável por adaptar uma famosa e premiada história em quadrinhos da segunda metade dos anos 1980. Quem leu a HQ de Alan Moore e Dave Gibbons vai pescar mais rapidamente as referências, como a chuva de lula e as primeiras aparições ou citações de personagens como Ozymandias e Dr. Manhattan. Mas a minissérie em nove episódios Watchmen foi muito feliz em criar uma trama central totalmente nova e absolutamente atual.
Os novos heróis, como a Sister Night (Regina King) e o Looking Glass (Tim Blake Nelson), lidam com a violência contra negros nos Estados Unidos. O inimigo é uma organização racista, a Sétima Kavalaria, que, como a Ku Klux Klan da vida real, prega a supremacia branca. Desde o primeiro capítulo, que reencena o Massacre de Tulsa, em 1921, durante anos apagado da história oficial estadunidense, Watchmen mostra como os traumas da escravidão passam de geração a geração.
Foram 11 troféus Emmy, incluindo melhor minissérie, atriz (Regina King), ator coadjuvante (Yahya Abdul-Mateen II) e trilha sonora (assinada por Atticus Ross e Trent Reznor e fundamental para o clima da trama).