Bohemian Rhapsody (2018), cartaz da Tela Quente desta segunda-feira (14), deu início a um festival de rock no cinema. Depois da cinebiografia de Freddie Mercury, o vocalista da banda inglesa Queen, seguiram-se pelo menos outros sete títulos sobre ou com homenagem a músicos da vida real, todos mais ou menos contemporâneos.
O longa-metragem que vai ao ar às 22h45min na RBS TV tem direção de Bryan Singer, autor de Os Suspeitos (1995) e de quatro aventuras dos X-Men. Ganhou os Oscar de melhor ator (Rami Malek), edição (John Ottman, habitual parceiro do cineasta), edição de som e mixagem de som. Só perdeu na categoria de melhor filme.
O americano Malek, 39 anos, em seu primeiro papel de destaque no cinema (já havia recebido um Emmy e um Globo de Ouro pelo protagonista do seriado Mr. Robot), conquistou praticamente tudo: além do Oscar, levou o Globo de Ouro, o Bafta (a premiação britânica) e o troféu do Sindicato dos Atores dos EUA.
O roteiro de Anthony McCarten (indicado ao Oscar por A Teoria de Tudo e por Dois Papas) volta às origens de Farrokh Bulsara, jovem da Tanzânia que passa a se chamar Freddie Mercury depois de ser descoberto pelo guitarrista Brian May (encarnado por Gwilym Lee) e pelo baterista Roger Taylor (papel de Ben Hardy). O filme acompanha a trajetória do Queen até meados dos anos 1980 — portanto, termina antes da morte de Mercury, aos 45 anos, em 1991, um dia depois de ter assumido publicamente que tinha aids.
Mas, em uma liberdade, digamos, cronológica, Freddie recebe o diagnóstico da doença e comunica a seus parceiros de banda às vésperas da apresentação no festival beneficente Live Aid, em 13 de julho de 1985. Fontes biográficas e o depoimento de Brian May no documentário Queen: Days of Our Lives (2011) destacam que esse comunicado se deu bem depois — as primeiras especulações na imprensa britânica datam de outubro de 1986, e Jim Hutton, namorado de Mercury, dizia que o cantor soube da aids em 1987.
A alteração é para efeitos dramáticos e não deixa de aludir à letra da canção Bohemian Rhapsody: "Is this the real life? Is this just fantasy?" (Isto é a vida real? Isto é apenas fantasia?). Há também uma confusão que envolve a primeira visita do Queen ao Brasil, para shows em 20 e 21 de março de 1981 no estádio Morumbi, em São Paulo. O filme coloca a estreia da banda por aqui no fim dos anos 1970 e no Rio de Janeiro. E mais: com cenas gerais do Rock in Rio de 1985.
Falando em 1985, a cinebiografia recria de forma primorosa 15 dos 21 minutos do show do Queen no Live Aid, apresentando na íntegra as faixas Bohemian Rhapsody, Radio Ga Ga, Hammer to Fall e We Are the Champions.
O sucesso de Bohemian Rhapsody — 41 prêmios e US$ 903,6 milhões arrecadados — abriu caminho para projetos semelhantes. O primeiro deles foi Rocketman (2019), de Dexter Fletcher, sobre o cantor britânico Elton John, encarnado por Taron Egerton com a bênção do próprio biografado. O filme faturou US$ 195,1 milhões, o Oscar de melhor canção (I'm Gonna Love me Again, composta por Elton John e Bernie Taupin) e os Globos de Ouro de ator em comédia ou musical e canção.
A Música da Minha Vida (Blinded by the Light, 2019) também é ambientado na Inglaterra, mas tem como homenageado um artista americano, Bruce Springsteen. O filme da diretora Gurinder Chadha é sobre um adolescente de família paquistanesa que, em 1987, em um país convulsionado pelo desemprego e pelo arrocho nos gastos públicos, acaba sensibilizado pelas letras de Springsteen, um notório porta-voz da classe operária.
The Dirt: Confissões do Mötley Crüe (2019) é a história de sucesso e excesso da banda americana de glam rock formada em 1981, em Los Angeles. Com direção de Jeff Tremaine, traz no elenco Iwan Rheon (o terrível Ramsay Bolton da série Game of Thrones).
Também de 2019, Yesterday, escrito por Richard Curtis e dirigido por Danny Boyle, é uma comédia romântica em que um cantor e compositor fracassado (Himesh Patel, visto neste ano em Tenet) torna-se a única pessoa no mundo a lembrar da existência dos Beatles. O protagonista fica em um impasse é faustiano: em nome da fama e do dinheiro, deve tomar para si a autoria de canções como Let It Be?
Outra comédia romântica, Uma Segunda Chance para Amar (2019) celebra um astro pop, George Michael, a começar pelo título original, Last Christmas, uma canção deliciosamente pegajosa de 1984, quando o homenageado ainda formava com Andrew Ridgeley a dupla Wham!. As canções de Michael embalam o filme de Paul Feig sobre o envolvimento da atrapalhada Kate (Emilia Clarke, a Daenerys de GoT) com um dublê de ciclista entregador e voluntário junto aos sem-teto. Aliás, o roteiro coescrito pela atriz Emma Thompson (que faz a mãe da protagonista) consegue estabelecer interessantes conexões entre a trama e o lado sociopolítico do cantor, certamente não tão conhecido quanto suas baladas e suas músicas para dançar.
Mas obscuro mesmo é Street Survivors: The True Story of the Lynyrd Skynyrd Plane Crash (2020). O longa se concentra no acidente de avião que, em 1977, no auge da fama da banda americana de rock sulista (é dela a clássica Sweet Home Alabama), matou o vocalista Ronnie Van Zant, o guitarrista Steve Gaines e sua irmã, Cassie, backing vocal. Inédito no Brasil, tem um elenco de anônimos e a assinatura de um diretor de filmes B de terror, Jared Cohn.
Por fim, por enquanto, temos o malfadado Stardust (2020), uma crônica da primeira visita de David Bowie aos Estados Unidos, em 1971. Dirigido por Gabriel Range e protagonizado por Johnny Flynn (da série Lovesick), o filme foi um desastre junto à crítica: tem apenas 14% de avaliações positivas no Rotten Tomatoes. Um dos principais problemas é que a produção não conseguiu o direito de usar canções de Bowie — ou seja, é uma cinebiografia musical sem músicas do biografado!