Durante os mais de três anos em que foi secretário da Fazenda de José Ivo Sartori, Giovani Feltes conviveu com um pesadelo: o dia em que o governo chegaria no último dia útil sem ter conseguido quitar todos os salários do mês anterior. O primeiro parcelamento ocorreu em agosto de 2015 e, em 2017, o Piratini passou a pagar a remuneração integral em grupos, começando pelos que ganhavam menos.
Para evitar que as folhas se encostassem, como indicavam as projeções, Sartori recorreu a um arsenal de mágicas. No fim de 2015, conseguiu na Assembleia a aprovação de aumento significativo das alíquotas de ICMS. Ao longo do governo, continuou usando dinheiro dos depósitos judiciais e ainda elevou de 85% para 95% o percentual do saldo que poderia ser sacado. Todos os meses, o governo do Estado chegava ao limite do valor permitido, até que no início de 2018 teve de suspender os saques para se enquadrar nas exigências da Secretaria do Tesouro Nacional para aderir ao regime de recuperação fiscal.
Já nos primeiros meses de mandato, os depósitos judiciais se mostraram insuficientes para cobrir o déficit que se avolumava. Alarmado com a situação, Sartori conseguiu negociar com a General Motors (GM) a antecipação de créditos que só deveriam entrar nos cofres em 2027. Feltes respirou aliviado, mas, no fim de 2015, faltou dinheiro para pagar o 13º salário e o governo ressuscitou a fórmula usada por Germano Rigotto: o servidor deveria contratar empréstimo no Banrisul e a Fazenda pagar o total em parcelas mensais. A prática se repetiu nos quatro anos da gestão Sartori.
As planilhas indicavam que o corte de despesas e o congelamento dos salários não eram suficientes para evitar o temido encontro das folhas, até porque Sartori herdara os reajustes dados pelo governo Tarso Genro aos servidores da segurança pública, que se estenderam até novembro de 2018. O emedebista cogitou suspender os reajustes, mas decidiu honrá-los, temendo o desgaste em uma área tão delicada.
As mágicas que permitiram ao governo anterior evitar o encontro das folhas incluiu a venda da folha de pagamento para o Banrisul, em junho de 2016, por R$ 1,25 bilhão, uma nova antecipação dos créditos da GM e, principalmente, a suspensão do pagamento da dívida com a União, garantida por liminar do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, vigente até hoje.
A situação se complicou no final de 2018 e, para não deixar toda a folha de dezembro para Eduardo Leite pagar, o governo antecipou o pagamento de parte do ICMS e do IPVA, limitando o desconto a quem pagasse o tributo até 28 de dezembro.
Leite assumiu com a promessa de colocar a folha em dia até o final deste ano e de dar previsibilidade aos servidores. Como o fluxo de caixa é previsível, ele o secretário da Fazenda, Marco Aurelio Cardoso, imaginavam que seria possível anunciar no último dia do mês a data de pagamento de cada faixa.
Em junho, já não foi possível divulgar o calendário completo. O governo definiu o pagamento até R$ 4,5 mil e só confirmou a escala do restante no dia 23, com uma má notícia: a folha de junho só será quitada em 12 de agosto e o salário de julho começa a ser pago no dia seguinte, para quem ganha até R$ 2,5 mil. O pagamento do salário de julho só deverá ser concluído em setembro, a menos que entrem recursos extraordinários.