Para reduzir o rombo nas contas de dezembro, a equipe do governador José Ivo Sartori optou por avançar na receita de janeiro, causando descontentamento na equipe do futuro governador Eduardo Leite. Além de entregar o governo com duas folhas em atraso, a de dezembro e o 13º salário, e com dívidas milionárias com fornecedores, Sartori decidiu antecipar a cobrança do ICMS de indústria, comércio, combustíveis e telecomunicações para a primeira quinzena de dezembro, tributo que só deveria ser pago em janeiro.
O desconto máximo do IPVA também só será aplicado para quem pagar o imposto até 28 de dezembro. Em outros anos, a vantagem valia para quem quitasse o imposto até o primeiro dia útil de janeiro.
Além disso, o governo lançou um novo Refaz, com desconto nos juros e na multa dos devedores de ICMS, e, contrariando o pedido de Leite, manteve a orientação ao Banrisul para repassar aos acionistas o valor referente à redução do capital, já que não levou adiante a venda de ações da Banrisul Cartões. Os R$ 175 milhões dessa operação deve entrar nos cofres públicos até o final da semana, o que poderá permitir o pagamento de mais uma faixa dos salários de outubro (entre R$ 10 mil e R$ 15 mil) ou até mesmo a quitação da folha, se os outros poderes concordarem em deixar parte do seu dinheiro no caixa único por mais alguns dias.
Com o Refaz, o governo acredita que pode chegar a uma arrecadação bruta de R$ 500 milhões (25% ficam com os municípios). No caso do IPVA, o governo espera arrecadar cerca de R$ 450 milhões até 28 de dezembro (metade desse valor vai para os municípios).
O decreto de antecipação do ICMS foi publicado no Diário Oficial do Estado nesta terça-feira (27). Conforme o decreto, o fato gerador do tributo entre 1º a 15 de dezembro deverá ser recolhido até 26 de dezembro. Já o da segunda quinzena do mês seguirá no calendário normal, que é 12 de janeiro. No caso do ICMS da energia elétrica e dos serviços de telecomunicações o pagamento será antecipado em um dia (de 27 para 26 dezembro).
— Demonstramos que a medida ajudará não apenas a situação financeira do Estado, mas a economia como um todo. Quanto mais conseguirmos pagar em salário, maior poderá ser o consumo — justificou o secretário da Fazenda, Luiz Antônio Bins.
O argumento não convenceu a indústria, que quer uma contrapartida à antecipação. A Fiergs pleiteia um desconto nos valores pagos antecipadamente e postergação na data de pagamento da próxima parcela, o que dificilmente será aceito pelo governo.
Interlocutores de Leite dizem que esses movimentos atestam que era falsa a afirmação de Sartori, feita na campanha, de que tinha arrumado a casa, já que até o pré-acordo de adesão ao regime de recuperação fiscal não passa de uma carta de intenções. Em nota, o PSDB diz que os atos "não contribuem para a sustentabilidade fiscal do Estado" e que são "medidas de última hora". Para o partido do governador eleito, os recursos antecipados "deveriam ser preservados para o cumprimento das obrigações do próximo exercício, em conformidade com os princípios da responsabilidade fiscal".
O atual secretário da Fazenda rebateu a nota e, à coluna, afirmou que o governo não está desrespeitando a lei de responsabilidade fiscal ou outra norma.
— Esses recursos serão utilizados para pagar despesas que em janeiro estariam acrescidas de juro e multa — explicou Bins.
Nota do PSDB sobre antecipação das receitas
"A atual administração do Governo do Estado do Rio Grande do Sul tem publicado nos últimos dias um conjunto de ações de arrecadação tributária com impacto direto sobre as receitas do próximo exercício.
Destacam-se, em particular, (i) o programa REFAZ 2018 (Decreto nº 54.346) com expressivos abatimentos para quitação de débitos tributários ainda em 2018, (ii) a súbita alteração nas datas de recolhimento do ICMS de competência dezembro com consequente redução na arrecadação de janeiro de 2019 (Decreto nº 54.348) e (iii) a oferta de descontos para pagamento do IPVA 2019 neste ano.
Esses atos não contribuem para a sustentabilidade fiscal do Estado, pois não representam acréscimos de arrecadação. Ao contrário, são medidas de última hora, configurando uma antecipação de recursos que deveriam ser preservados para o cumprimento das obrigações do próximo exercício, em conformidade com os princípios da responsabilidade fiscal".
Nota da Fiergs sobre o decreto
"O decreto que antecipa o pagamento de ICMS no Rio Grande do Sul, publicado no Diário Oficial do Estado nesta terça-feira (27), foi recebido pela indústria como uma decisão unilateral do Governo. O diretor da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (FIERGS), Thômaz Nunnenkamp, um dos interlocutores do setor industrial que participou da reunião da última sexta-feira (23) com representantes da Secretaria da Fazenda, informa que a indústria não deu o aval para a decisão tomada: “A antecipação foi discutida, mas não consensada”, a informação era de que a medida estava em estudo. “Entendemos o momento das finanças do Estado ao mesmo tempo em que avaliamos também a situação da indústria”, pondera Thômaz, ao lembrar que “poderíamos ter acertado contrapartidas que permitissem proporcionar resultados favoráveis para os dois lados”. Entre as possibilidades de ajuste, a indústria entende ser justo um desconto nos valores de ICMS pagos antecipadamente, bem como uma postergação dos valores a serem pagos na primeira parcela do próximo ano.
A questão do ICMS é assunto recorrente na indústria quer pelos impactos na economia gaúcha quanto pelos níveis de competitividade do setor industrial. Pelas alíquotas vigentes de ICMS a indústria gaúcha perde na concorrência com outros Estados. Cabe salientar que a competitividade não se dá apenas no âmbito tributário, reforça Thômaz, ao lembrar que as alíquotas de ICMS estão em vigor no Rio Grande do Sul desde 2016. A elevação do imposto foi de 17% para 18% na categoria geral e de 25% para 30% sobre os chamados produtos e serviços seletivos, como energia elétrica e comunicação".
Nota da Secretaria da Fazenda do RS
Diante de manifestações críticas às medidas que o governo do Estado vem adotando para reforçar a arrecadação ao longo do mês de dezembro, a Secretaria da Fazenda vem manifestar o que segue:
1. Todas as medidas são decorrentes de prerrogativas legais, em especial a Lei de Responsabilidade Fiscal, e foram tomadas em defesa do interesse do Estado, buscando honrar compromissos com a folha salarial dos servidores, repasses definidos na Constituição a municípios e demais Poderes e o custeio da saúde, entre outros;
2. O REFAZ 2018 foi aprovado no âmbito do Confaz - Conselho Nacional de Política Fazendária e oferece descontos na quitação de dívidas do ICMS nos mesmos patamares de outros programas,
3. A antecipação de ICMS sobre a atividades da indústria e comércio, sobre o fato gerador da primeira quinzena de dezembro, além das necessidades financeiras já mencionados do Estado, atende a um pedido formal da Famurs,
4. Já a antecipação do ICMS de combustíveis é de apenas um dia para facilitar a gestão de caixa no final do mês,
5. O desconto máximo do IPVA 2019 igualmente é mantido dentro do exercício deste ano e, assim como as demais medidas, ajudarão a honrar compromissos cujo atraso acarretaria custos maiores ao Tesouro, como é o caso da indenização dos salários,
6. Tais medidas poderiam não serem necessários caso o atual governo tivesse alcançado êxito nas propostas de privatizações e na mudança do critério de repasses do duodécimo aos demais Poderes e órgãos de Estado, para os quais não houve a devida solidariedade de partidos que integram a base do governo eleito e, por fim,
7. A Secretaria da Fazenda reafirma sua convicção de que está agindo amparado nas normais legais e em defesa do interesse público, buscando preservar os serviços essenciais à sociedade.
Porto Alegre, 27 de Novembro de 2018.