Fabio Alperowitch fundou a Fama Investimentos em 1993, quando a sigla ESG (de governança corporativa, social e ambiental) nem existia. Ainda na faculdade de Administração de Empresas e fazendo estágio em uma multinacional de bens de consumo, quis estruturar um negócio para investir em empresas éticas e responsáveis que fabricassem produtos "não lesivos a seres humanos", como descreveu à coluna. Agora, Alperowitch fez um anúncio que a coluna quis entender melhor: passará a investir em "ofensores do clima". Como assim? Na carta em que apresenta a iniciativa, afirma que "chegou a hora de causar transformação também nas empresas que geram relevantes externalidades climáticas negativas". A ideia é ter uma posição, via investimentos, em companhias que ainda não despertaram para as novas exigências éticas, ambientais e sociais para fazer a famosa "mudança por dentro", ou como propõe, um "turnaround climático". Turnaround é uma expressão que, no mundo dos negócios, significa algo como salvar uma empresa da falência.
O que guiou a criação da empresa, adiante de seu tempo?
Foi muito baseada em valores. Meu pai é engenheiro, minha mãe trabalha com psicologia, nenhum era particularmente ativista ambiental ou relacionado ao mercado financeiro. Talvez tenha sido a minha criação, não sei exatamente. Desde muito pequeno tenho essa questão mais empática ao planeta e ao social.
Quando começou a mudar?
Até 2019, esse debate era interditado no mercado financeiro e no mundo corporativo. Havia uma ou outra exceção, com consciência há mais tempo, mas era muito difícil trazer a perspectiva dos direitos humanos até 2019. Era automaticamente rotulado de comunista, petista, psolista. Agora, esse debate está desinterditado, mas segue sendo conduzido de forma muito superficial. Tem muito greenwashing (maquiagem averde), por isso nossos indicadores não melhoram.
Temos um país ainda mais desigual, racista, homofóbico e o que mais desmata na atualidade.
Quais indicadores?
Temos um país ainda mais desigual, racista, homofóbico e o que mais desmata na atualidade. Se fosse verdade que as empresas de fato estão preocupadas com essa agenda, veríamos o ponteiro se mexendo. Ainda tem muito discurso e pouca prática.
O que mudou em 2019?
O contexto. Na Europa, é um tema há mais tempo. Faltava chega aos Estados Unidos e ao Brasil, porque somos americanocêntricos. Na Europa, o ESG começou a se fortalecer entre 2017 e 2018 e ganhou robustez em 2019.
A famosa carta de Larry Fink, do BlackRock, influenciou?
A carta de janeiro de 2020 teve uma grande importância porque empurrou grandes empresas do mercado financeiro nessa direção. Mas está longe de ter sido ele que trouxe esse movimento. Na mesma época, o relatório de riscos do Fórum de Davos apontou que todos os cinco maiores eram ambientais.
No acumulado dos 30 anos, tivemos vários períodos com retorno superior ao dos índices da Bovespa.
Como é o retorno do fundo?
Isso é muito difícil de responder. Estamos falando de anos em que tudo aconteceu, pandemia. guerra na Rússia, rally de commodities. Os últimos dois anos não foram bons. No acumulado dos 30 anos, tivemos vários períodos com retorno superior ao dos índices da Bovespa. Conseguimos investir em empresas éticas e trabalhar para melhorá-las. Uma das nossas investidas é a Renner. É uma empresa muito correta, que tem priorizado questões sociais e ambientais, e a gente tenta ajudar. Também investimos em Klabin, Fleury, Omega Energia.
Qual é exatamente a proposta de investir em "ofensores do clima"?
A intenção é investir na empresa. e trazer soluções baseadas na ciência que sejam economicamente boas para as companhias.
Pessoas da nova geração serão consumidores mais conscientes, não vão querer produtos em desacordo com seus valores, que transgridem direitos humanos, não respeitam o ambiente.
É preciso ter participação relevante para pôr isso em prática?
Não, porque trazemos assuntos de interesse das companhias. Temos, por exemplo, participação na nossa equipe do professor Carlos Nobre, um dos mais celebrados especialistas no assunto. Ao trazer algo novo para a empresa, provamos matematicamente que vai ganhar com isso, não tem porque não acatar. O greenwashing está sendo desmascarado. Pessoas da nova geração serão consumidores mais conscientes, não vão querer produtos em desacordo com seus valores, que transgridem direitos humanos, não respeitam o ambiente. E empresas que agirem assim também não vão conseguir reter talentos. Os que acham que estão enganando perceberão o impacto reputacional quando forem expostos. E serão onerados. Por enquanto, não estão pagando pela quantidade de carbono que emitem, mas daqui a pouco vão pagar. O mesmo vai ocorrer por questões sociais.
O novo fundo já foi criado?
Ainda não existe, estamos trabalhando no projeto. Ainda não estamos buscando participantes, apenas conversando com investidores estrangeiros, para quem o fundo tem despertado atenção positiva. No Brasil, ainda não despertou.
Esse modelo já existe em algum lugar?
Acho que não existe nada assim, não fomos buscar inspiração no Exterior, sempre fui muito ligado a essa pautas. Pensei 'ninguém no Brasil faria, então vou fazer'.