O anúncio do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, de que prepara medida para permitir abertura de conta em dólares no Brasil causou alvoroço nesta quarta-feira (29). Campos Neto não se comprometeu com prazos para a entrada em vigor da facilidade e procurou restringir o alcance, mencionando que seria permitida em casos específicos, para facilitar a abertura de contas em reais no Exterior.
Falar em conta em dólares no Brasil suscita, especialmente no Rio Grande do Sul, mais perto da Argentina, inquietação com a fragilidade que uma economia mais dolarizada embute. Os sustos cambiais no vizinho, que tem preços definidos em moeda americana para qualquer produto de maior preço, de eletrodomésticos a apartamentos, ensinam que esse caminho embute riscos.
Especialistas, porém, destacam o fato que, nem de longe, a abertura de contas em dólar no Brasil deve se tornar uma possibilidade generalizada. Sidnei Nehme, da corretora de câmbio NGO, pondera que, mesmo sem mencionar prazo, o BC sabe que essa não é uma iniciativa capaz de avançar em menos de dois a três anos. Lembra, também, que no contexto da discussão, estão os altos custos das remessas de divisas do Brasil para o Exterior:
– A intenção é facilitar a vida de quem tem, por exemplo, um filho estudando fora. Se quer mandar US$ 1 mil, acaba pagando US$ 100 por remessa. Se desburocratizar, esse custo cai. Nesse sentido, é uma sinalização positiva.
No entanto, Nehme lembra que, no subtexto das declarações de Campos Neto, está sua ambição de transformar o real em moeda conversível, expressada em sua passagem por Porto Alegre em abril. Nesse sentido, vê baixa probabilidade de que essa meta seja atingida:
– Tenho uma convicção de que esse anseio é muito difícil. Embora tenhamos reservas e situação de contas externas bastante confortáveis, o real é uma moeda que, a nível global, é muito própria para ser alvo de especulação. Não inspira confiança como reserva de valor, o que é necessário para se tornar conversível. Foi um anseio que o Mantega (Guido, ex-ministro da Fazenda) também teve quando viu que o o giro em reais era muito grande no mercado de moedas. Mas isso ocorre exatamente porque o real é considerado uma moeda boa para especular. O país tem liquidez, porque tem reservas elevadas. Desde que caiu o padrão ouro, o que ficou valendo no mercado cambial é a potência econômica. Como a situação do Brasil é extremamente volátil, não conseguimos crescer, a economia conspira contra essa vontade.