O planejamento da sucessão na Fruki foi detalhado: prevê que Aline, filha do atual presidente, Nelson Eggers, fique no cargo mais alto por 15 anos, para então ser substituída pelo irmão Julio. Essa foi uma das revelações do empresário, na 12ª edição do Fórum Respostas Capitais, realizado na sede do Grupo RBS. Ele ainda aceitou relatar, finalmente, como a lata do guaraná que ajudou a formular foi parar na mão do ex-jogador David Beckham. Dependente de frete, desabafou, sobre o tratamento do assunto da tabela que elevou os preços do transporte pelo governo federal:
– É muita incompetência.
O Rio Grande do Sul já teve muitas fábricas de refrigerante, mas poucas sobreviveram. Por que a história da Fruki foi diferente?
Acho que foi pela vinda das grandes que a Fruki cresceu. São desenvolvidas e têm boa gestão. A gente foi copiando o que eles sabem fazer. E aí, a gente começou a fazer uma resistência grande a eles. Os pequenos que não se adaptaram tiveram que fechar. Nós continuamos a crescer, porque sempre estou copiando.
O que lhe expandir ao longo desses anos?
Buscar sempre o conhecimento, a adequação. Só temos 150 pessoas trabalhando na fábrica, porque é automática. Não são operários comuns, são engenheiros ou estudantes universitários. Sempre fiz questão que tivessem muito conhecimento. São 12 são engenheiros, vieram lá do Interior. O profissional que começou tudo isso já é diretor, tirou o meu lugar, porque eu era diretor industrial agora é ele.
Por que o senhor não chama funcionário de colaborador?
Alguém gosta de ser colaborador? A gente quer ser um profissional e, quando ele começa, ele é um funcionário da Fruki, mas eu quero transformá-lo em profissional.
O senhor é adepto da educação continuada antes de entrar na moda?
Não tive toda essa educação, mas nunca parei de buscar conhecimento. Inclusive, fazem 58 anos que comecei na empresa, esse ano vou completar 59, e é o meu quarto emprego. Nossa escola tinha biblioteca, eu aprendi a ler lá e meu pai, que era leitor assíduo, dava o exemplo. Hoje, tenho seis filhos e sempre fui muito trabalhador, todos eles leem também. Chegou um momento, eu já estava estudando aqui em Porto Alegre e estava no meu terceiro emprego. Aí eu fui fazer estágio porque eu também sou tenente da reserva do Exército, fiz o CPOR,. Lá, ganhei uma grana muito boa, melhor do que qualquer outro lugar onde trabalhei. Fiz concurso da Secretaria da Fazenda, passei, não assumi. No fim, eu fui trabalhar na empresa da família que era muito pequena, que tinha o pior salário de todos.
O que determinou?
Os outros não queriam, meus primos não queriam. Eram um negócio muito ruim, muito pequenininho, eles escolheram outras atividades. Em compensação, hoje eles estão muito arrependidos de não serem diretores.
Foi nessa época que o senhor lavava garrafas?
Fazia de tudo. Pegava a garrafa suja que vinha do mercado, colocava dentro de um tanquezinho e colocava um pouco de chumbo de caça e ficava sacudindo até que tirava toda a sujeira. A linha de água, a Água da Pedra, quem compra pode ser o primeiro a colocar a mão na garrafa. Vai completar 17 anos que conseguimos o registro da marca. Saímos do zero e hoje temos 40%, 43% de participação de mercado. Somos o primeiro no Estado, em segundo lugar está a água da Coca-Cola, que tem 14%, temos três vezes mais. Se fosse qualquer outro pequenininho, seria fácil, mas não, tem o gigante internacional aqui, que não conseguimos enfrentar no sabor cola.
O que transformou o lavador de garrafa no empresário que bate a Coca-Cola no seu mercado?
Não tem um ponto. Foi um pouco a cada minuto. Chegou a um ponto que a gente foi respeitado, com dignidade, pelos grandes. Eu os encontro na Alemanha, na Itália, nos Estados Unidos em feiras e eventos ele dizem 'ah, você é da Fruki, já me falaram muito" outros, aqui no Brasil, dizem assim 'nas reuniões, nossos patrões sempre dizem que a gente tem que se cuidar da Fruki'. Você tem que ter uma boa gestão. Quando eu comecei, entramos no PGQP (programa gaúcho de qualidade e produtividade), a questão era qualidade do produto e logo a gente percebeu que já tínhamos um pouco. É uma consequência de boa gestão, porque se alguém faz boa gestão, faz tudo certo. Estive em uma reunião em São Paulo, que uns 100 pequenos fabricantes de refrigerantes do Brasil e disseram assim, 'olha, agora eu quero que vocês digam quanto cada um vende com nota e quanto vende sem nota'. Um disse 'vendo 50% com e 50% sem' o outro '40% e 60%'. Eu disse 'vendo 100% com nota, tudo legal'. Daí já deu um bafafá, disseram que todos falaram a verdade e agora vem esse cara falar mentira. Dois que me conheciam falaram que estava falando a verdade. O cara que tem duas gavetas de dinheiro, o que é frio numa e o que é quente em outra, perde todo o controle. Pagamos muito imposto. Se vendo R$ 3 de produto R$ 1 vai para o governo e R$ 2 vai para o nosso caixa para pagar a operação.
É lenda ou verdade que a fórmula do guaraná é sua?
Fiz de tudo, lavei garrafa com chumbinho, fiz contabilidade, gestão. Também fui para o laboratório e lá aprendi com o concorrente. Quando a Brahma comprou a Skol, lançou um refrigerante marca Sport, que nos candidatamos a fabricar. Queria ter um contato com uma grande dessa, porque queria aprender. Conseguimos, deram treinamento, era nisso que queria chegar. Montamos laboratório, compramos equipamentos. Na primeira venda para distribuidores, compravam 80 volumes de Sport e 20 de Fruki. Na segunda compra, era 50 de Sport e 50 de Fruki. Continuamos distribuindo para os vendedores deles, e a Sport desapareceu.
E a fórmula?
Com a marca feita, prédio pronto. Um mês, dois meses antes da gente inaugurar eu fui para o laboratório, era uma salinha que tinha uma pia, um fogão e uma geladeira, e fui formular. Saiu o Guaraná Fruki. Em todos os Estados do Brasil o Guaraná Antártica é líder, só não é no Rio Grande do Sul, porque o líder é o Fruki. Como o laboratório era pequeno, no fundo tinha uma sala de vendas. Lá que testávamos. A gente olhava e parecia verde, mas tinha que ser amarela, jogava fora, preparava outra e verde de novo. Aí a gente foi ver que tinha o quadro verde na parede. Colocamos em um fundo branco, e não estava mais verde.
Qual foi o cachê de David Beckham para aquela famosa foto com o guaraná Fruki?
Eu fazia inglês em Lajeado e tinha um coleguinha de 14 anos. Quando ele terminou o curso, foi para os Estados Unidos. Depois de muitos anos, ele me telefona e diz 'olha eu gostaria de vender Fruki aqui, a Antártica está vendendo pouco, Perguntei se ele tinha atacado, ele disse que faria entregas com o carro. Vendi para ele, era Venice Beach, na Califórnia. Tinha um restaurante, Café Brasil, e lá perto morava o Beckham. Ele jogava com brasileiros, aprendeu a comer churrasco, feijão. Em uma ocasião, foi flagrado levando a lata de Fruki para casa.
Como está a experiência da Fruki em Santa Catarina?
Temos de expandir, já temos uma boa participação no mercado do Rio Grande do Sul, temos de pensar no futuro, tenho seis filhos. A Aline é uma, vai assumir a presidência no ano que vem. Todos estão preparados para fazer uma boa gestão. Então, a primeira experiência fora do Rio Grande do Sul é Santa Catarina, estamos atacando o Litoral, por Florianópolis, e o Interior, por Chapecó, completamos um ano agora. Estamos atingindo as metas traçadas no planejamento, é investimento que ainda não dá lucro.
O senhor mencionou que a Aline vai assumir a presidência. Como foi esse processo de sucessão?
Muito tranquilo, são os meus filhos. A empresa é filha também, costumo dizer que eu tenho sete filhos, três homens, três mulheres e a Fruki. Aprendi uma técnica de sucessão na empresa familiar. Uma foi mandar os filhos para o Exterior. Hoje, isso é normal, naquela época, não era. Meus filhos todos trabalharam fora da empresa. Varia um pouco e traz conhecimentos para a empresa. A Aline trabalhou 10 anos na Ipiranga e eu trouxe ela quando chegou a hora. Aprendeu muito lá. Nando, o mais velho, é PCD e trabalha na Fruki, ele tem problema intelectual, mas não muito grave. O Júlio começou como encarregado de entrega e hoje,é diretor de marketing. A Aline vai ficar 15 anos na presidência e depois ele vai assumir. Já está decidido.
Como foi para a Fruki o impacto da greve e agora desse impasse da tabela do frete?
De caminhões a gente têm 80 nossos que fazem entregas. Temos cinco CDS para fazer distribuição no Rio Grande do Sul, em Canoas, Pelotas, Caxias, Santo Ângelo, Lajeado, precisa de muito caminhões. Chegamos a carregar em uma noite, em torno de 400 caminhões. Como já vendemos 400 caminhões para entregar no dia seguinte, e só temos 80, faltaram 320. Isso nos atinge muito. Vendemos uma garrafa a R$ 0,90 lá nos postos de Bagé. Um terço é do governo, temos R$ 0,60, incluído o frete, imagina como vamos ser atingidos. Se fosse tão ruim nossos freteiros nos abandonariam, eles não nos abandonaram. O que ruim é a política do governo, que aumenta todos os dias o preço dos combustíveis. Então é muita incompetência do governo, não só desse, mas dos passados também, que trouxeram o país a essa situação. Não sei o que vai acontecer.
Quais são os próximos sonhos que o senhor quer realizar?
O sonho de agora é a cerveja. Temos um comitê, vários já foram para a Europa aprender esse processo. O Júlio, meu fiho, acabou de voltar com um vidrinho de levedura desenvolvida na Inglaterra, é exclusiva. Vamos lançar uma lager, que vai competir no mercado popular, mas com a Heineken. Também teremos weiss bier, belgian ale, a IPa. Fizemos acordos com diversas empresas que vão fabricar, por enquanto, para nós.
E quando sai?
Vamos lanças na Agas em agosto, fabricado por duas cervejarias. Estamos trabalhando no projeto na cervejaria, compramos uma área de 90 hectares lá em Paverama, no caminho para eu ir para casa. Do projeto não se fez nada ainda. Vai ser uma fábrica modular, à medida que vai aumentando a produção, aumenta a fábrica.