Uma miopia política embaça a compreensão de Lula sobre as razões da queda de sua popularidade. Na campanha, ele repetia que não tinha o direito de errar. Pois Lula e seu entorno estão colecionando uma sucessão de equívocos que proporcionam novo alento à extrema direita. Aqui, um breve mas não exaustivo compêndio dos erros.
1) Ao atribuir à economia a origem de seu infortúnio, Lula não distingue os reais motivos de suas atribulações. Vá lá que os resultados econômicos não sejam vistosos, mas estão longe do desastre. O desemprego está em 7,7%, um dos mais baixos da série histórica, e a renda média real do brasileiro cresceu 3,1% em 2023. Como o instinto populista de Lula é de gastar mais, a irresponsabilidade fiscal tende a agravar a inflação e retardar a queda dos juros. E aí sim a economia vai ser mesmo um problema.
2) Uma constante fonte de atrito para Lula e a esquerda é a agenda de comportamento, que se traduz na dita pauta progressista. O presidente e seu círculo próximo têm nítida dificuldade de lidar com o fato de que o Brasil profundo é conservador e crescentemente evangélico. A maioria da população condena o aborto e a legalização da maconha, para ficar em só dois exemplos. Quanto mais representantes da esquerda põem peso nestas polêmicas, mais o navio aderna para a direita.
3) Em vez de seguir o script do Itamaraty, Lula teima em queimar a imagem externa, com desgaste interno, ao falar sandices, como a comparação da ação militar em Gaza com o Holocausto, ou o endosso à ditadura da Venezuela.
4) Tema espinhoso para a esquerda, a violência segue como uma das principais preocupações do eleitorado. Em São Paulo, segundo o Datafolha, está bem à frente até da saúde. Segurança é principalmente responsabilidade dos governos estaduais, mas a sensação de omissão federal e um discurso que desprestigia forças policiais jogam larga fatia do país nos braços da extrema direita.
5) Lula e boa parte da esquerda ainda agem como se o PT e sua agenda tivessem ganho a eleição de 2022, quando quem venceu foi uma aliança anti-Bolsonaro que atraiu muita gente de centro e centro-direita que nunca seria convidada a uma festa petista. Num dia, como nas visitas aos Estados, um Lula errático junta esforços para afagar segmentos críticos para, no outro, pôr tudo a perder com comentários hostis.
6) O discurso do Lula de 20 anos atrás está cada vez mais deslocado. O que seria proteção do trabalho, como na regulação dos motoristas de aplicativo, é encarado como intromissão na vida alheia. O que era defesa do povo surge como interferência indevida, como na Petrobras, ou apenas soberba, como nas pressões sobre a Vale. A realidade é que boa parte da esquerda ainda tenta aplicar uma agenda intervencionista que ficou rançosa porque o país e o mundo mudaram. E a história nunca anda para trás.