Talvez seja hora de arejar a casa. Quartos, sala, cozinha, mais sótãos e porões se houver. Por tempo demais ali se acumularam monstros ou monstrinhos, fantasmas ou meros sustos.
Xingamos, acusamos, brigamos, fomos justos algumas vezes, outras nos descobrimos irresponsáveis, até cruéis. Mais fácil criticar do que elogiar. Nossos medos infantis e frustrações adultas nos deixam assim às vezes. Nem sempre, mas o perigo existe.
Atravessamos uma fase política e moral conturbada, muita balbúrdia emocional, brigas e separações em famílias e entre amigos. Dissemos e escrevemos coisas que não escreveríamos nem diríamos em condições "normais" – seja lá o que isso signifique.
Talvez esteja na hora de a gente parar, olhar, respirar... e refletir se não vale a pena repensar algumas posições radicais. Dar uma chance. Esperar para ver o que acontece. Tirar da alma algumas teias de aranha que atrapalham: nem enxergamos mais claramente as árvores, casas, flores, pessoas.
Raiva paralisa, cega, limita a inteligência e a intuição que antes funcionavam direitinho.
Quem sabe a gente dá uma folga a si mesmo, aos eleitos, às novidades que parecem improváveis e aos nossos próprios preconceitos?
Não acho que de repente a gente deva amar o adversário, mas sempre dá para aliviar um pouco, mudar de assunto e de tecla. Gosto imensamente da frase "meu adversário não precisa ser meu inimigo". Gosto de trégua e de renovação. Preciso de algum otimismo. E, tentando emergir de um luto muito pesado, preciso, sim, de algum conforto e claridade.
Acho que todos ou quase todos – porque também há os que adoram a fúria e a confusão – desejam algo mais leve do que esta fase tão tortuosa, inquietante e escura em que andamos metidos com a melhor das intenções. Porque ninguém com mente lúcida e emoções razoáveis quer o mal. E porque de um jeito ou outro queremos ser felizes ou menos infelizes. Aos pessimistas de carteirinha, digo que, sim, eu ainda acredito em paz de espírito e em um olhar positivo para a vida. Até para o Brasil? Pois até para este meu país maltratado, espoliado, envergonhado, que tantos amamos tanto.
Sim, eu dou um crédito à maioria dos novos eleitos. Dou um discreto voto de confiança ao futuro já quase presente.
Vou me decepcionar? É possível. Numa já longa vida, isso nem seria novidade... Nem por isso vou deixar que o pessimismo envenene minha alma, minha vida.
Num de meus momentos mais difíceis, deparei com esta maravilhosa frase: "Não somos humanos tendo experiências espirituais. Somos espíritos imortais tendo uma experiência humana. Depois, voltamos para casa".
Como quase todos nós, humanos, preciso de alguma claridade. De afetos e apoio. De coragem nem sempre fácil e às vezes ausente. De pensar que todas as pessoas que amei e partiram voltaram para casa.
Comparo a isso, em parte, o que acontece conosco nesta fase de moradores deste país – medo, dúvida, revolta justificada e, às vezes, justas mas exageradas reações. Inquietação nas casas, violência e perigo nas cidades e nas ruas.
Então, logo ali na esquina, aparece uma figura clara. Sem armas nem palavras duras, ela até sorri. E as pessoas começam a dizer umas às outras, um pouco surpresas e talvez desconfiadas: "Aquela ali, estão vendo? Não é miragem, não é ameaça nem embuste. Ela é possível. É real. Pode parecer um romance adolescente, mas é imperiosa e essencial. O nome dela é Esperança".