Em criança eu traduzia a lápis na margem dos livros infantis palavras e frases inteiras.
Que estranha vocação precoce de pensar em dois idiomas, porque falava os dois?
Que impaciência que transbordava?
Que encanto em ouvir o jardineiro dizer “transbaldava” em lugar de “ transbordava”? Entendi afinal que para ele a água saía pelas bordas dos baldes. Essas coisas triviais me seduziam.
Me perguntam como e quando me tornei escritora. Outra dúvida. Possivelmente quando saiu meu primeiro livro aos 25 anos, mas na verdade sempre escrevi em pensamento histórias para mim mesma, usando e abusando do giro das palavras dentro de mim.
Era meu jeito de ser e continua sendo. Desaparecer nas palavras e repetir: “não queiram me decifrar, não me prendam com o alfinete da interpretação. Se digo flor, é flor; se digo água, é água; corrente de sinais com o meu nome embaixo”.
E também ele um dia vai evanescer como umidade nas paredes.
E tudo será silêncio de grande colo de mãe.