Meu filho agora pegou a mania de fazer perguntas assim:
– O que tu prefere: morrer cozido em um caldeirão de óleo fervente ou ser devorado por lampreias famintas dentro de um poço de cinco metros de profundidade?
– O que tu prefere: cair do octogésimo andar de um prédio em Manhattan ou ter todos os teus ossos esmagados por um tanque do exército russo?
Muitos dizem que é nossa obrigação votar. Não é. É nosso direito, que exercemos se quisermos. Eu não quero.
Eu me irrito:
– Não prefiro nada disso, Bernardo!
Ele insiste:
– Tem que escolher!
O mesmo acontece agora, nas eleições brasileiras. O sol não se deita no Guaíba sem que eu receba uma dúzia de apelos: “Te posiciona! Tem que te posicionar! PT ou Bolsonaro?”.
Pois me posiciono: nenhum deles. Critico ambos e seguirei criticando-os. No PT já votei e já o elogiei, mas bastou a primeira crítica para ouvir: “Está defendendo o patrão? Te vendeu? Canalha!”. Aos poucos, fui compreendendo que essa não era uma reação isolada; é um modus operandi. Uma estratégia. Os petistas não examinam a crítica, tentam desmoralizar o crítico. E isso está no núcleo de tudo o que o partido é e faz: o PT precisa dividir a sociedade entre bons e maus, para dizer que ele e os seus são os bons, lutando contra os maus – que são os que o criticam.
Foi essa filosofia que fraturou a sociedade brasileira. Sempre houve disputa política no Brasil. Houve até violência. Mas nunca tamanha amargura. Os petistas vivem reclamando de que são vítimas do ódio. Foram eles que ensinaram a odiar. Foram eles que viabilizaram Bolsonaro.
Essa é minha maior crítica ao PT. Nem critico tanto a corrupção, que, como bem alegam os petistas, sempre houve.
Sei também que o PT se move por uma quase incontrolável ânsia autoritária. A ideia de governar por meio de conselhos é chamada de “democracia participativa”, mas, na verdade, é apenas uma forma de boicotar a democracia representativa, de enfraquecer a vigilância do Congresso. Os conselhos, obviamente, seriam dominados pelo partido, que, assim, submeteria o Estado. A fórmula é cristalina. E abjeta.
Bolsonaro é um autoritário de outro tipo. É um tosco, um primário, faz declarações constrangedoras, manifesta um pensamento que já era atrasado nos anos 1960. É lógico que é mais difícil analisar quem de fato é Bolsonaro porque ele nunca governou coisa alguma, mas a forma como se comporta muitas vezes é repulsiva.
O episódio mais famoso de Bolsonaro é seu embate contra a deputada Maria do Rosário. São cenas desagradáveis, para dizer o mínimo. Um deputado gritar para uma deputada, nos corredores da Câmara Federal, que não a estupraria por ela ser muito feia é de uma baixeza impensável para quem pretende ser presidente da República.
Não dá para votar num sujeito desses. E não dá para votar no PT. Na verdade, não dá para votar em nenhum grupo político do Brasil. Não gosto de nenhum deles e, desde que me mudei para os Estados Unidos, não voto em ninguém.
Muitos dizem que é nossa obrigação votar. Não é. É nosso direito, que exercemos se quisermos. Eu não quero. Não preciso escolher entre o ruim e o péssimo. Entre o poço de lampreias e o caldeirão de óleo fervente, fico fora dos dois. Fico em cima do muro. Daqui a vista é muito melhor.