Uma das investigações que apura a execução de um preso dentro da Penitenciária Estadual de Canoas (Pecan) 3 aguarda o resultado de perícias para ser concluída. A apuração deverá esclarecer toda a dinâmica da execução de Jackson Peixoto Rodrigues, 41 anos, o Nego Jackson.
O apenado foi executado a tiros dentro da cela que ocupava numa ala de triagem e isolamento. Dois presos são apontados como autores do crime.
Tiveram prisão preventiva decretada pelo homicídio Rafael Telles da Silva, 36 anos, o Sapo, e Luis Felipe de Jesus Brum, 21 anos — ambos integram facção criminosa rival à de Nego Jackson, e estavam numa cela próxima a dele.
Sapo foi transferido na semana passada para o sistema penitenciário federal — essa medida, segundo o governo, já estava prevista antes de ocorrer o crime. Nego Jackson era considerado como uma das lideranças do outro grupo.
— O fundo da motivação são esses atritos entre essas duas facções criminosas. Ao menos parte disso está relacionada a essa situação. Cometer um ato dessa monta demanda algumas questões que um preso não executaria sozinho. Levando em consideração que era, inclusive, uma liderança da facção rival — afirma o delegado Mario Souza, titular do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).
Para a polícia, a autoria direta do crime — ou seja, quem foram os responsáveis por executar o preso — é considerada esclarecida. Tanto Sapo quanto Brum, optaram por permanecer em silêncio após o crime. No entanto, a investigação ainda deve se debruçar para entender outros pontos, entre eles, se houve participação de mais alguma pessoa no plano de executar Nego Jackson.
— A investigação segue avaliando quem mais possa ter feito parte, sejam outros presidiários ou mesmo pessoas externas, da rua, da facção, qualquer pessoa que tenha auxiliado de alguma forma. Existem materiais e provas coletadas sendo analisadas, que vão esclarecer a dinâmica de como se deu o homicídio, como o preso foi abordado e morto — diz Souza.
Outros pontos são investigados, mas ainda seguem sob sigilo, entre eles, como se deu a entrada da arma e da munição, e onde ficaram armazenadas. Uma das possibilidades é de que a arma tenha ingressado por drone, mas isso não está esclarecido — a polícia não descarta outro tipo de arremesso ou forma de entrega. A previsão é de que ainda sejam necessárias cerca de duas semanas para finalizar o inquérito.
Operação Queda Livre
Uma das medidas adotadas pelas forças de segurança na última sexta-feira (29) foi a realização da Operação Queda Livre. Sapo e o grupo do qual é considerado líder foi alvo da ofensiva, que prendeu 11 pessoas.
Segundo a polícia, a ação, realizada de forma conjunta entre Polícia Civil, Brigada Militar e Polícia Penal, é uma forma de resposta ao grupo criminoso pelo homicídio dentro da penitenciária.
— Nossos próximos passos são acompanhar os resultados da investigação e, se necessário, outras medidas serão tomadas — diz o diretor do DHPP.
Governo precisa esclarecer falhas
Há ainda segunda apuração em andamento, realizada pela Corregedoria-Geral do Sistema Penitenciário. Neste caso, segundo a Secretaria dos Sistemas Penal e Socioeducativo, cinco servidores afastados já foram ouvidos. Não foi detalhado o que eles relataram em depoimento, já que o processo segue em andamento.
O intuito é apurar todos os fatos que envolvem a ocorrência que resultou na morte do preso. O governo do Estado admitiu a existência de falhas que culminaram no crime.
O afastamento de cinco servidores da Pecan 3 — dois que estavam no turno, o chefe de segurança do complexo prisional, o responsável pela segurança da galeria e o diretor responsável pela Pecan 2, 3 e 4 — ocorreu na segunda-feira após a morte de Nego Jackson.
A medida, segundo o vice-governador Gabriel Souza, não denota uma culpabilização antecipada dos servidores, mas seria uma forma de garantir apurações isentas. Ainda foram determinadas três revistas diárias dentro da galeria onde houve o crime, na penitenciária.
— Temos investigação administrativa já aberta e temos investigação policial, porque se trata de homicídio, e essas investigações vão ter de explorar o assunto, circular no ambiente, os investigadores vão ter de fazer oitivas, buscar registros, para entender o que ocorreu. Para identificar o que ocasionou as falhas de segurança, que notadamente ocorreram. Não é segredo para ninguém que entrou uma pistola na Pecan, e isso é inadmissível — disse o então governador em exercício Gabriel Souza, em entrevista à Rádio Gaúcha na última semana.
Entre as questões que precisam ser explicadas, está como pistola de calibre 9 milímetros, apreendida após o crime, ingressou na penitenciária. Uma das possibilidades é de que ela tenha sido entregue na cela onde estavam os dois apenados da facção rival, com uso de um drone.
O próprio Nego Jackson chegou a escrever uma carta, um dia antes de ser morto, onde relatava que drones acessavam as janelas das celas com facilidade. Na madrugada anterior à execução, uma aeronave não tripulada foi avistada pelos policiais penais — e depois disso foram apreendidos radiocomunicadores e drogas.
Em relação a essas respostas, a secretaria afirmou que essas informações ainda estão sendo apuadas e que não é possível responder, neste momento, por exemplo, por qual motivo a pistola usada no crime não foi encontrada nas revistas regulares às celas e nem quanto tempo a arma permaneceu dentro da penitenciária.
Outras medidas
Desde a ocorrência no Complexo Prisional de Canoas, o Grupo de Ações Especiais (Gaes) está presente na unidade, intensificando os procedimentos de segurança, segundo o governo do Estado.
Além disso, revistas gerais foram realizadas em vários estabelecimentos prisionais do Rio Grande do Sul, como forma de tentar prevenir esse tipo de crime.
Ainda na semana passada, foram removidos da Pecan 3 as 17 lideranças do crime organizado que estavam sendo mantidas, com intuito de isolamento, na mesma galeria onde Nego Jackson foi morto.
Com a instalação e autorização do uso de bloqueadores de sinal de celulares na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), eles puderam ser levados para lá.
Outra ação adotada — que gerou reclamação por parte dos familiares dos presos — foi a desarticulação do comércio no entorno do Complexo Prisional de Canoas.