Dentro de uma lavagem de carros, em Viamão, na Região Metropolitana, criminosos escondiam quase duas toneladas de maconha. A descoberta foi feita pela Polícia Civil em maio do ano passado, num domingo, no Dia das Mães. No mesmo local, dois suspeitos de integrarem o esquema de tráfico foram presos. Aquele era o início de uma investigação que resulta nesta quinta-feira (27) na operação Leviatã, deflagrada no Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina. O alvo é a facção criminosa por trás do abastecimento de drogas em todo o Estado. Até as 7h15min, 54 pessoas haviam sido presas.
Na noite de 13 de maio de 2023, agentes da 4ª Divisão de Investigações do Narcotráfico do Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc) receberam informações de que o estabelecimento comercial estaria servindo como ponto de armazenamento de drogas. Não esperavam, no entanto, que a carga escondida ali dentro fosse tão elevada. Ao todo, foi apreendida 1,8 tonelada de maconha.
— Jamais a gente imaginou que seriam quase duas toneladas, dentro de uma lavagem automotiva. Eram pacotes, de grandes quantidades empilhadas, no fundo dessa lavagem, desse estabelecimento de fachada — recorda a delegada Ana Flávia Leite.
A ofensiva dessa quinta-feira é um desdobramento da investigação que se iniciou após essa apreensão. A polícia passou a analisar os celulares apreendidos com os presos e também as transações bancárias do grupo. Foi possível, por meio do caminho percorrido pelo dinheiro, movimentado pela facção, identificar a forma de agir dos criminosos.
— A partir disso, conseguimos ter dimensão desse grupo, que atua com braços em todo o Estado do RS, e extrapola, atingindo Santa Catarina e Paraná, e outros Estados também — explica a delegada.
Conforme o Denarc, a movimentação dos criminosos seguiu, mesmo no período da enchente que atingiu o RS. Em alguns casos, os bandidos buscaram, inclusive, esconder as cargas de drogas disfarçadas em meio aos donativos enviados ao Estado.
— Infelizmente, esses criminosos não descansam. O lucro que eles obtêm é muito grande, mas a Polícia Civil também ficou atenta de forma integral nesse período. Foi possível fazer a apreensão de grandes quantidades de drogas e armamentos. E também intensificamos as investigações complexas, como no caso da operação na data de hoje — afirma o diretor do Denarc, delegado Carlos Wendt.
Os mandados desta quinta-feira são cumpridos na Capital, Região Metropolitana, no Interior, e também em Santa Catarina e no Paraná. São cumpridas na manhã desta quinta-feira 85 prisões preventivas e 136 mandados de busca e apreensão. Além disso, houve sequestros de veículos e 37 bloqueios de contas bancárias, que somam R$ 5,7 milhões. Até 8h, 18 veículos tinham sido apreendidos, além de seis armas de fogo.
— Essa é uma organização criminosa que abastecia o Estado com toneladas de drogas, e de alta periculosidade. Tanto que hoje, durante as diligências, num local no interior do Estado, a equipe foi recebida a tiros — diz Wendt.
O caso aconteceu em Lajeado do Bugre, no norte do Estado, onde os policiais cumpriram mandados numa residência, quando foram alvejados por disparos. Um homem foi preso em flagrante com duas armas de fogo. Ninguém ficou ferido na ação. Outro fato que despertou a atenção dos policiais foi a localização de imagens de uma criança de menos de cinco anos, com uma pistola na mão. As fotos foram localizadas no celular de uma mulher, também alvo da operação.
— A companheira de um dos alvos principais da nossa investigação praticava o comércio de arma de fogo, e ela havia comprado uma pistola, por cerca de R$ 6 mil. Essa arma foi entregue a essa criança, filha do casal, e fotografado por ela para enviar ao companheiro e mostrar que a arma já estava em sua posse — afirma a delegada Ana Flávia Leite.
Números da operação
- Cumprimento de 281 medidas cautelares
- Bloqueio de cerca de R$ 6 milhões em contas bancárias
- 54 presos até o momento
- 18 veículos apreendidos
- 6 armas de fogo
- Cerca de R$ 34 mil em espécie
- Drogas
Facção se ramifica para outras regiões e outros Estados
A facção alvo da operação possui berço no Vale do Sinos, mas estendeu suas ramificações por todo o Estado. A investigação apurou a existência de um esquema complexo de compra, venda e distribuição de drogas, cobrindo praticamente todo o território do Rio Grande do Sul. O Denarc identificou a existência de vários líderes desse grupo, alvo desta ofensiva, espalhados pelo RS, que se articulavam para intermediar o fornecimento das drogas.
Segundo a polícia, os traficantes se unem para adquirir os entorpecentes em larga escala. A droga é transportada até o RS e repartida a fornecedores intermediários. O nome Leviatã, com o qual foi batizada a operação, representa um dragão dotado de muitas cabeças, em alusão ao grupo criminoso, que age, por meio de consórcio, no abastecimento de drogas de todo o Estado.
— Com a análise do conteúdo desses dois telefones, conseguimos identificar a movimentação, durante período de dois meses, de quase nove toneladas de maconha no Estado. Além de crack e cocaína. Em dois meses, conseguiram movimentar cerca de R$ 25 milhões no comércio de entorpecentes — afirma a delegada Ana Flávia.
As drogas – maconha, cocaína e crack – eram fornecidas à facção por indivíduos de Santa Catarina e Paraná, segundo a polícia.
— O tráfico de drogas movimenta vultuosa quantia de dinheiro e, embora não seja, por si só, um crime violento, suas ramificações causam danos colaterais e indiretos. Isso frequentemente resulta em conflitos entre facções, que disputam territórios de venda de drogas, no armamento de criminosos para manter o controle de suas áreas, na coação de residentes em regiões dominadas pelo tráfico, no recrutamento de crianças e adolescentes para atividades criminosas, e em outros crimes, todos originados no comércio ilegal de substâncias entorpecentes — diz a delegada.
Estratégias
Churrasco – Os policiais identificaram uma série de artimanhas usada pelo grupo para tentar dificultar a identificação das atividades criminosas. Uma das formas de comunicação, por exemplo, era por meio de analogias com um churrasco. Os criminosos, ao conversarem sobre carregamento de drogas, usavam expressões como “costela gorda”, “porco”, “peixe”, para identificar cada um dos tipos de entorpecentes.
Rastreio – Em diversas ocasiões, um dos líderes do grupo orienta os demais a usar um detector de rastreadores, nos veículos utilizados para o transporte de drogas. Os traficantes também costumavam trocar regularmente de carro, para dificultar a identificação.
Uso de laranjas – Os veículos utilizados para o transporte das drogas eram “limpos”, ou seja, não se tratavam de veículos clonados, e sim comprados com o uso de “laranjas”. Essa era outra estratégia que visava evitar algum tipo de abordagem policial.
Drogas escondidas – Uma forma de esconder as drogas era acondicionar os carregamentos dentro dos pneus. Numa das conversas interceptadas, a polícia identificou que 50 quilos de crack foram transportados dessa forma.
Nárke 2
A ação desta quinta-feira ocorre dentro Operação Nárke 2, coordenada pela Diretoria de Operações Integradas e de Inteligência da Senasp/MJSP. O intuito dessa ofensiva nacional é integrar as forças de segurança pública na prevenção e repressão qualificada ao tráfico de drogas.
As cidades onde são cumpridos mandados no RS
Porto Alegre
Alvorada
Viamão
Ijuí
Lajeado do Bugre
Passo Fundo
Parobé
Cidreira
Alegrete
Torres
São Leopoldo
Sapiranga
Caxias do Sul
Brochier
Salvador do Sul
Sapucaia do Sul
Taquara
Cachoeirinha
Santo Cristo
Montenegro
Charqueadas
Guaíba
Casca
Farroupilha
As cidades em Santa Catarina
Criciúma
Içara
Palhoça
Imbituba
Sombrio
As cidades no Paraná
São José dos Pinhais
Marechal Cândido Rondon